O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) apresentou, no sábado 22, um projeto de lei que propõe reduzir as penas de condenados pelo 8 de janeiro de 2023, desde que não tenham envolvimento direto no planejamento ou financiamento dos supostos crimes.
O texto altera o Código Penal para diferenciar os participantes do tumulto daqueles que tiveram papel de liderança na ocasião. A proposta argumenta que as atuais punições aplicadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) são desproporcionais e não individualizam a conduta dos réus, o que caracteriza um possível abuso de poder.
Segundo Vieira, “muitas pessoas acabam sendo estimuladas a agir da maneira descrita pelos artigos já mencionados porque estão vendo centenas de outras pessoas fazerem o mesmo, sendo influenciadas por um verdadeiro tumulto”.
O projeto cria uma modalidade privilegiada dos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado e prevê penas menores para quem apenas participou dos atos sem exercer liderança.
O novo texto propõe que, nesses casos, a pena seja de dois a seis anos de reclusão para o crime de abolição do Estado Democrático de Direito; e dois a oito anos de reclusão para tentativa de golpe de Estado.
Além disso, o projeto determina que as decisões judiciais deverão, sob pena de nulidade, descrever individualmente a conduta de cada réu e estabelecer um nexo de causalidade entre seus atos e o resultado ilícito.
Senador propõe individualizar a pena dos atos de 8 de janeiro
O objetivo é evitar a chamada “responsabilização multitudinária ou coletiva”, em que todos os envolvidos são punidos da mesma maneira, sem distinção entre os níveis de participação de cada um deles.
Vieira defende que “não se pode apenar do mesmo modo, apenas pelo fato de integrarem uma mesma multidão, pessoas que praticaram atos de naturezas distintas”. Ele argumenta que, atualmente, há “grandes obstáculos ao exercício legítimo dos direitos à ampla defesa e ao contraditório”, garantidos pela Constituição.
Outro ponto central da proposta é a aplicação do princípio da consunção (ou absorção penal), que impede a soma automática das penas para os crimes de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito quando forem praticados no mesmo contexto. Segundo Vieira, essa medida evita penas excessivas e garante maior proporcionalidade nas condenações.
Atualmente, se um réu for condenado pelos dois crimes, a pena mínima somada é de 8 anos de prisão, com máximo de 20. Se a nova proposta for aprovada, a punição seria reduzida para um intervalo entre quatro e 12 anos, a depender da gravidade da conduta.
Para ilustrar a disparidade nas condenações atuais, Vieira cita um exemplo: “se uma senhora viesse a pintar com batom uma estátua da Justiça, sem qualquer participação na organização ou no financiamento, sob a influência de multidão em tumulto, sua pena seria de dois a seis anos; já o responsável pelo financiamento dos atos poderia receber uma pena de quatro a 12 anos”.
O congressista se refere ao caso da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que escreveu “perdeu, mané” na estátua “A Justiça” – em referência a uma frase dita por Roberto Barroso, presidente da Corte, em 2022 — e pode ser condenada a 14 anos de prisão.
Vieira critica atuação do STF
O projeto reflete uma insatisfação crescente de setores políticos com a forma como o STF tem conduzido os julgamentos dos envolvidos no 8 de janeiro. Vieira sugere que o tribunal tem aplicado punições sem a devida distinção entre manifestantes e organizadores, o que resulta em condenações generalizadas.
O senador questiona o uso do conceito de “crime multitudinário”, que, segundo ele, tem sido usado para justificar sentenças sem individualizar as condutas dos réus. Ele argumenta que a responsabilização coletiva fere direitos fundamentais, como a ampla defesa e o contraditório.
A proposta também menciona que a legislação penal já reconhece a necessidade de distinguir entre autores intelectuais de crimes e aqueles que atuam apenas como executores secundários dos mesmos.

Vieira sugere que a mesma lógica deve ser aplicada ao caso do 8 de janeiro para evitar que pessoas que agiram sem planejamento prévio ou sem intenção de golpe sejam tratadas como líderes da invasão.
Vieira defende que “ninguém pode ser responsabilizado senão na exata medida de sua conduta”, e que a diferenciação entre os tipos de participação nos eventos de 8 de janeiro é essencial para garantir a justiça no tratamento dos casos.
A proposta ainda precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado antes de ir ao plenário. Se aprovada, poderá impactar diretamente os julgamentos em andamento e até reduzir penas já aplicadas, caso haja mudança na legislação antes do trânsito em julgado das sentenças.