A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) questionou a ferramenta e o método usados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) para recuperar um vídeo publicado e depois apagado por ele com questionamentos às urnas eletrônicas e mentiras sobre as eleições.
Segundo o advogado de Bolsonaro, Paulo Amador da Cunha Bueno, a intenção é pedir a exclusão do vídeo do inquérito dos atos de 8 de janeiro.
A PGR informou na última sexta-feira (15) ter conseguido recuperar o material, considerado fundamental para uma eventual denúncia contra o ex-chefe do Executivo por incitação ao crime em decorrência dos atos de 8 de janeiro.
Em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (19), a defesa de Bolsonaro afirmou que a postagem foi feita de forma “acidental” e apagada “poucas horas depois”, o que mostraria que o ex-presidente “não pretendeu insuflar qualquer forma de subversão”.
O documento foi enviado pelos advogados ao ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.
O vídeo em questão foi postado no perfil de Bolsonaro no Facebook em 10 de janeiro, dois dias depois dos ataques às sedes dos Três Poderes.
No material, o procurador Felipe Gimenez, de Mato Grosso do Sul, defende que a eleição de Lula foi fraudada e que o voto eletrônico não é confiável. O recorte mostra a legenda “Lula não foi eleito pelo povo, ele foi escolhido e eleito pelo STF e TSE”.
Para os advogados de Bolsonaro, “é preciso cautela” ao se analisar o vídeo recuperado pela PGR como prova, dado que ele não foi obtido diretamente dos servidores da Meta, empresa responsável pelo Facebook.
A Meta afirmou ao STF que o conteúdo não estava disponível por não ter sido intimada a tempo para preservar o material.
A área técnica do Ministério Público Federal (MPF) então conseguiu obter uma cópia do vídeo a partir de outras fontes, como a plataforma Metamemo, que faz uma espécie de registro das publicações na plataforma.
A defesa de Bolsonaro entende que a “mera associação entre um vídeo apagado e um supostamente salvo não pode ser tomada como uma correspondência definitiva”.
“Afinal, estamos lidando com contextos e provedores diferentes. A noção de que o vídeo recuperado reflete fielmente o conteúdo do vídeo deletado é uma conjectura sensível, porém, longe de ser uma afirmação incontestável”, afirmaram os advogados Paulo Cunha Bueno, Daniel Tesser e Fábio Wajngarten, que assinam a manifestação.
“Portanto, sustentar com absoluta certeza que o vídeo hospedado na plataforma Metamemo é o mesmo que aquele que foi deletado exige uma fundamentação técnica, meticulosa e detalhada, indo além da simples associação entre plataformas diferentes”, declararam.
“Dentro desse cenário, é essencial ressaltar que sequer o Peticionário [Jair Bolsonaro], conforme suas declarações anteriores, poderia atestar a fidedignidade do conteúdo do vídeo em comento, uma vez que não o assistiu, mas apenas o compartilhou — vale recordar: por engano — enquanto tentava enviá-lo para si mesmo pelo WhatsApp, com a intenção de assisti-lo posteriormente. Isso se confirma pela ausência de qualquer comentário associado ao compartilhamento feito pelo Peticionário, algo que usualmente acompanha suas postagens”, prosseguem.
Para os advogados, não há “fatores mínimos” para sustentar a investigação contra Bolsonaro. Eles também afirmaram que a indisponibilidade do vídeo postado pode levar a uma “ausência de materialidade delitiva” no caso.
Eles pediram a Moraes uma série de esclarecimentos sobre o trabalho de recuperação do vídeo pela PGR e sobre a plataforma Metamemo.
A PGR havia solicitado por três vezes a preservação do vídeo postado. O último pedido levou Moraes a determinar à Meta, no começo do mês, o envio do material em 48 horas, sob pena de multa diária de R$ 100 mil.
O ex-presidente foi incluído no inquérito por ordem de Moraes a pedido da PGR. Bolsonaro passou a figurar na investigação por causa de uma publicação feita em seu perfil no Facebook em 10 de janeiro.
Na ocasião, ele postou um vídeo com desinformação sobre as eleições e que contestava o resultado eleitoral, dizendo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não teria sido eleito pelo povo. Ele apagou a postagem horas depois.
O pedido para incluir Bolsonaro na investigação partiu de representação assinada por integrantes do Ministério Público Federal (MPF). O documento sugeriu que, ao fazer a publicação questionando a regularidade das eleições, Bolsonaro teria feito incitação pública à prática de crime.
A PGR argumentou na ocasião que a conduta do ex-presidente deveria ser investigada, mesmo tendo sido feita depois do 8 de janeiro.
Pelo caso, Bolsonaro prestou depoimento à Polícia Federal (PF) em 26 de abril. Aos investigadores, ele disse que fez a postagem por erro e que não tinha interesse em publicar o material.
Também afirmou que queria enviar o vídeo para si mesmo para assistir depois, e que a eleição é página virada em sua vida.
A defesa do ex-presidente afirmou que ele estava sob efeito de morfina quando fez a publicação do vídeo. Bolsonaro estava internado em um hospital nos Estados Unidos para tratar de uma obstrução intestinal.
O subprocurador Carlos Frederico Santos, que era o responsável pela investigação dos atos de 8 de janeiro, sustentava que militantes bolsonaristas que invadiram e depredaram as sedes dos Poderes em Brasília foram influenciados por teorias conspiratórias que questionavam a vitória de Lula.
Santos entregou o cargo na segunda-feira (18). O novo procurador-geral da República, Paulo Gustavo Gonet Branco, avalia assumir ele próprio o inquérito.
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