A série “The Last of Us”, exibida na HBO e Max, é baseada em uma bem sucedida franquia de videogames que retrata um futuro distópico onde uma espécie de fungo passou a infectar humanos e transformá-los em zumbis. A obra de ficção possui uma inspiração na nossa realidade, já que, no mundo dos invertebrados, fungos capazes de transformar seres comuns em zumbis são uma realidade.
Um exemplo disso é um fungo recém descoberto por pesquisadores em cavernas da Irlanda do Norte. O organismo é capaz de parasitar aranhas das espécies Metellina merianae e Meta menardi, e fazer com que elas mudem seu comportamento, buscando locais com exposição à luz e ao vento, e fixando-se neles antes de morrer. Esse comportamento, incomum em aranhas não infectadas, favorece a dispersão dos esporos do fungo.
O parasita foi batizado de Gibellula attenboroughii, homenageando o renomado naturalista britânico David Attenborough.
O biólogo brasileiro João Araújo, micologista do Museu de História Natural da Dinamarca, professor assistente da Universidade de Copenhague e envolvido na descoberta do novo fungo, afirma que já se sabe bastante sobre os fungos que parasitam formigas, vespas e alguns outros invertebrados. Mas esses fazem parte de uma outra família, então trata-se de uma outra origem de manipulação de comportamento. “É algo realmente interessante que não é muito comum no mundo dos parasitas.”
A origem da descoberta
Em 2021, uma equipe de filmagem encontrou uma aranha infectada pelo fungo enquanto gravava um programa de televisão em um depósito de pólvora abandonado a sudeste de Belfast, na Irlanda do Norte. Isso despertou o interesse dos cientistas, que posteriormente encontraram mais aranhas com as mesmas características em outras cavernas da Irlanda e da Irlanda do Norte.
A mudança de comportamento desses animais após a infecção fúngica impressionou os cientistas, já que essas aranhas, quando saudáveis, não saem de suas teias. Ainda não se sabe exatamente como ocorre funcionamento interno do fungo. Mas os pesquisadores acreditam que o parasita conduz as aranhas para fora de suas teias, onde ficam expostas a correntes de ar circulantes, o que ajuda a espalhar seus esporos, que então infectam outras aranhas.
João Araújo também enfatiza a importância desses organismos no ecossistema. Já foi documentado, inclusive, fungos semelhantes a esse atuando no controle biológico de formigas na natureza.
Segundo Matthew Nelsen, um biólogo evolutivo e pesquisador do Museu de História Natural de Field, em Chicago, que não fez parte do estudo sobre o fungo, as pessoas não devem se preocupar com a possibilidade de que esses fungos possam infectar humanos.
“Embora existam alguns fungos que habitam cavernas e são problemáticos para os seres humanos, este faz parte de um grupo de fungos que infecta apenas aranhas. Para infectar os seres humanos, seria necessário que ele evoluísse a tolerância à nossa temperatura corporal quente e conseguisse contornar o nosso sistema imunológico, ambos os quais funcionam como defesas fortes contra a maioria dos fungos.”
Pesquisas futuras
A equipe de João Araújo pretende continuar estudando fungos do gênero Gibellula. Um entendimento mais aprofundado sobre esses fungos poderia, eventualmente, resultar na criação de novas formulações para serem usadas na agricultura ou até mesmo em novos tratamentos na medicina humana.
João ainda afirma que compreender como o fungo age quimicamente no metabolismo da aranha pode resultar em descobertas importantes a serem aplicadas no tratamento do Alzheimer e de outras doenças degenerativas cérebro humano.
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