Uma parte dos técnicos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) está preocupada com a possibilidade de interpretação distorcida dos dados do instituto, apurou a CNN.
O receio surgiu após uma palestra proferida pelo presidente do órgão, Marcio Pochmann.
A CNN obteve acesso à gravação da conferência, que vem provocando polêmica desde que sua existência foi revelada pelo jornal O Globo.
No vídeo, Pochmann diz que a estrutura “verticalizada, hierárquica, muitas vezes autoritária, ficou para trás” e sugere o fim das coletivas de imprensa para “falar direto com a dona Maria”.
O receio dos técnicos é que, ao deixarem de explicar os dados para os jornalistas, passem a surgir interpretações equivocadas da presidência do órgão, que favoreçam o governo.
Também preocupou os estatísticos que Pochmann tenha citado a China como exemplo a ser seguido, já que o país comunista é opaco nas informações.
Pochmann tem um histórico de acusações de censura de pesquisadores quando foi presidente do Ipea.
Procurado pela CNN, Pochmann não respondeu. A CNN também entrou em contato com o IBGE e aguarda retorno.
O Sindicato Nacional dos Trabalhadores do IBGE afirmou, em nota, que “a repercussão gerada em veículos de comunicação, a partir de uma frase isolada, que não chegou a constituir um anúncio de mudança concreta, nos parece precipitada”. Confira abaixo, na íntegra, a nota:
“Nos últimos dias, diversos veículos de mídia apresentaram matérias a respeito de uma suposta “preocupação” com possíveis mudanças na política de divulgações do IBGE. A ASSIBGE acredita que a política de comunicação do IBGE deve contemplar tanto o atendimento ao jornalismo profissional como a comunicação direta com a população. O Instituto dispõe de técnicas e procedimentos para tanto, que podem e devem ser aprimoradas contínua e cautelosamente pelos servidores envolvidos nessas tarefas. Uma comunicação transparente e isonômica é um componente necessário para um IBGE autônomo – como sempre defendido pelo sindicato.
Por hora, a repercussão gerada em veículos de comunicação, a partir de uma frase isolada, que não chegou a constituir um anúncio de mudança concreta, nos parece precipitada. As notas repercutidas exprimem opiniões e avaliações de setores que tentam influenciar os rumos do IBGE criando tensionamentos entre a imagem do Órgão, o corpo técnico e a sociedade. Os mesmos grupos que apoiaram ativamente a intervenção política do governo Bolsonaro no IBGE e os cortes orçamentário e temático do Censo Demográfico. As matérias veiculadas não encontram lastro no estado de espírito atual da ampla maioria dos técnicos da instituição.
A ASSIBGE avalia como preocupante que, novamente, uma polêmica sem materialidade ocupe tanto espaço, ao mesmo tempo que problemas estruturais do Instituto são invisibilizados. Atualmente, a maior parte da força de trabalho do IBGE, contratada em regime precário, recebe pouco mais do que um salário-mínimo para coletar nas ruas as informações que se transformam nos números do PIB, inflação etc. O órgão perdeu 45% dos seus servidores efetivos em relação à 2010 e tem orçamento declinante em termos reais para realizar um plano de trabalho mais amplo. Esses riscos à qualidade e continuidade da produção de informações parecem não causar preocupação nos neo-defensores da autonomia.
No momento, o IBGE vive o primeiro encontro do processo “Diálogos: IBGE 90 anos”, atividade que pode ser um importante momento de debates entre os servidores sobre o futuro do órgão. Esperamos que seja o início de um processo de diálogos sobre questões que de fato afligem os trabalhadores do Instituto. A iniciativa tem como objetivo promover discussões horizontais sobre pontos a serem aperfeiçoados no IBGE e potenciais a serem desenvolvidos, tendo como objetivo final democratizar a gestão e avançar no papel do IBGE como Coordenador Nacional do Sistema Geoestatístico.
O sindicato reafirma seu compromisso histórico em defesa da autonomia técnica e de independência política e reforça sua pauta pela reestruturação do IBGE:
• Concurso público para reposição dos cargos vagos, especialmente dos técnicos de nível intermediário;
• Reajuste salarial para os trabalhadores temporários;
• Reestruturação de Carreira;
• Orçamento estável e adequado para seus projetos e pesquisas;
• Processo de avaliação profunda e democrática da operação censitária de 2022;
• Democratização do IBGE: eleições diretas para presidente e superintendes.
Executiva Nacional da ASSIBGE-SN”
Compartilhe: