A segunda turma do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou uma ação em que a Bayer contestava uma decisão da Justiça de Mato Grosso que determinou à empresa o depósito em juízo de parte do valor cobrado como royalties por uma patente de soja que teria expirado em 2018.
Em sessão na terça-feira (12), por 4 a 1, os ministros rejeitaram o pedido da empresa, por entender que a decisão da Justiça estadual não contrariou a posição do Supremo sobre o período de vigência de patentes.
A Bayer queria a derrubada da decisão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) que determinou o pagamento em juízo.
À época da decisão, em 2022, o valor era de R$ 1,3 bilhão.
A maioria da turma acompanhou o voto do relator, Nunes Marques. Ficou vencido o ministro Gilmar Mendes.
A controvérsia envolve a multinacional Monsanto, que foi comprada pela Bayer, e produtores de soja representados pela Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT).
A disputa se dá em torno de uma patente de invenção usada na tecnologia Intacta RR2 PRO®️ — um tipo de soja desenvolvida para o mercado brasileiro resistente às principais lagartas da cultura da soja e tolerante ao glifosato, um dos agrotóxicos mais usados no Brasil.
A patente garantia à Monsanto a possibilidade de cobrar royalties dos produtores que usavam a tecnologia.
Conforme a Aprosoja-MT, a patente expirou em 2018.
O caso se desenrola na Justiça de Mato Grosso. Em decisão liminar (provisória) dada em 2022, o TJ-MT determinou o depósito do valor referente a 1/3 dos royalties supostamente cobrados de forma irregular, para garantir eventual pagamento futuro aos produtores, em caso de vitória na Justiça.
A quantia deve ser usada para beneficiar produtores do Mato Grosso e de outros estados que passaram a integrar o processo, caso a disputa judicial termine favorável à Aprosoja.
A Monsanto então acionou diretamente o STF, por meio de uma reclamação, argumentando que a Justiça do estado havia contrariado decisão do próprio Supremo sobre a vigência de patentes.
Segundo a Aprosoja-MT, os valores somam hoje R$ 10 bilhões e envolvem outras patentes vencidas.
Já a Bayer afirma que a decisão da turma do STF “ratifica a obrigação” da empresa em continuar apresentando uma garantia dos valores à Justiça, sem necessariamente ter que desembolsar a quantia por ora.
Leia os posicionamentos, dos envolvidos mais abaixo.
A maioria dos ministros da turma concordou com Nunes Marques, para quem o entendimento do TJ-MT “está em harmonia” com o decidido pelo STF em 2021, quando a Corte analisou trechos da Lei de Patentes.
Na ocasião, o Supremo fixou que a patente pode vigorar, no máximo, por até 20 anos.
Os ministros decidiram adotar a chamada “modulação de efeitos”, para que esse entendimento tivesse validade dali em diante.
Foram feitas duas ressalvas à modulação, fazendo com que a vigência das patentes já seguisse o teto de 20 anos nas seguintes situações:
No caso das patentes de saúde, ficou decidido que eventuais pagamentos feitos para além da vigência de 20 anos não gerariam possibilidade de indenização ou contestação judicial sobre valores pagos indevidamente.
Para Nunes Marques, o caso em análise não se enquadra nas possibilidades de extensão do período da patente fixadas pelo STF.
“Primeiro, porque obedecido o critério temporal, ou seja, a demanda originária foi formalizada antes de 7 de abril de 2021. Segundo, porque, uma vez envolvidas patentes relacionadas ao agronegócio, não cabe observar, como já exposto, a ressalva específica a patentes da área de saúde”, afirmou.
Seguiram esse entendimento os ministros André Mendonça, Edson Fachin e Dias Toffoli.
Gilmar Mendes divergiu. Para ele, deveriam ser respeitados os “efeitos concretos já produzidos” pelo período em que a patente em questão vigorou por mais tempo do que o limite.
O ministro citou pontos como o respeito à segurança jurídica e a importância de análise caso a caso das demandas.
Em nota publicada em seu site, a Aprosoja-MT disse que a segunda turma do STF decidiu que a Bayer “devolva mais de R$ 10 bilhões aos produtores rurais de Mato Grosso, como ressarcimento dos royalties pagos desde 2018 referente à tecnologia Intacta RR2 PRO”.
“Desse modo, a multinacional deve ressarcir os royalties pagos desde 2018 pelos produtores para o uso da tecnologia, além de garantir o direito dos agricultores de pedir abstenção da cobrança de royalties da tecnologia a partir da expiração do prazo de vigência das patentes relacionadas na ação”.
Na mesma nota, o presidente da entidade, Lucas Costa Beber, disse que a decisão do Supremo “é muito importante para todos os associados da Aprosoja-MT” e representa “uma grande vitória dos produtores”.
“Os valores de royalties envolvidos na demanda, segundo estimativas, ultrapassam a casa de 10 bilhões de reais e a Monsanto terá agora que arcar com pagamento a todos os produtores que foram cobrados e pagaram indevidamente pela tecnologia, objeto de patentes vencidas. Isso reforça a higidez e o cumprimento da decisão do STF tomada na ADI 5529”, afirmou o advogado Sidney Pereira de Souza Junior, que representou a Aprosoja-MT no caso.
A Bayer disse que a decisão da turma do STF “não tem relação com o mérito da questão” e que a discussão sobre a data de expiração de patentes da empresa está em “fases iniciais”.
“Desde 2022, a Bayer vem discutindo no STF um pedido de liminar que resultou na obrigação de garantir o juízo, assegurando, desta forma, eventual pagamento futuro, caso a ação inicialmente promovida pela Aprosoja-MT seja bem-sucedida”, afirmou a empresa.
“O efeito da decisão atual apenas ratifica a obrigação da Bayer de continuar a apresentar uma garantia processual na ação judicial. A decisão do Supremo Tribunal Federal, desta semana, não tem relação com o mérito da questão – eventual discussão, ainda em fases iniciais, sobre a data de expiração de algumas patentes que protegem a tecnologia Intacta RR2 PRO®️ e os respectivos royalties”.
A Bayer também disse que “reitera seu profundo respeito às decisões judiciais, ao mesmo tempo que reforça a importância da segurança jurídica e o respeito aos direitos de propriedade intelectual como forma de assegurar investimentos em novas tecnologias”.
“Ao longo das últimas décadas, a inovação tem contribuído significativamente para o ganho de produtividade do sojicultor brasileiro, permitindo inclusive que o setor conquiste espaço no mercado internacional”.
Compartilhe: