O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a abertura de inquérito para investigar acusações de supostas irregularidades e crimes cometidos pelo então juiz Sergio Moro e procuradores do Ministério Público Federal (MPF) no Paraná em operações como a Lava Jato.
“Mostra-se necessária a instauração de inquérito neste Supremo Tribunal Federal para investigação sobre os fatos narrados, nos exatos termos em que pleiteados, na medida em que demonstrada a plausibilidade da investigação de condutas, em tese, tipificadas como crime”, disse Toffoli.
O ministro seguiu manifestações favoráveis da Polícia Federal (PF) e da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Em nota, Moro disse desconhecer a decisão e que “não houve qualquer irregularidade no processo de quase vinte anos atrás”.
A decisão a qual a CNN teve acesso foi tomada em 19 de dezembro, e está sob sigilo. A determinação foi revelada pelo G1 e confirmada pela CNN.
O caso chegou ao STF a partir de acusações feitas pelo empresário paranaense Antônio Celso Garcia, conhecido como Tony Garcia. Ele exerceu mandato de deputado estadual entre 1998 e 2002.
Garcia acusa o hoje senador Sergio Moro (União-PR) de não ter atuado com imparcialidade em processos contra ele no Paraná e de ter determinado que grampeasse autoridades em busca de provas para casos que não tinha relação com o seu.
As acusações se referiam inicialmente a supostas condutas de Moro durante as investigações de fraudes relacionadas ao Consórcio Nacional Garibaldi, no começo dos anos 2000.
O mesmo modo de operar teria ocorrido na Lava Jato, segundo as declarações de Garcia.
O empresário pediu ao STF em setembro a anulação de todos os atos praticados pelo então juiz Sergio Moro nos casos em que foi investigado.
Em junho, Toffoli suspendeu todos os processos contra Garcia na 13ª Vara Federal de Curitiba e no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
Sobre as acusações contra Moro, Garcia foi ouvido no STF por três vezes, entre agosto e setembro de 2023.
Nos relatos, ele sustentou que teria atuado como um “colaborador infiltrado”, no meio político e empresarial, para o então juiz Sergio Moro e Procuradores da República.
Os policiais que colheram seu depoimento disseram que a narrativa apresentada pelo empresário foi “longa, detalhista e por vezes confusa”, e que ele falou “sobre diversos aspectos potencialmente criminosos envolvendo agentes públicos e privados que atuaram direta e indiretamente na Operação Lava-lato”.
Segundo parecer da PGR, a partir dos relatos de Tony Garcia a PF “entendeu que possam existir diversas situações de chantagens, coações, ameaças e constrangimentos até os dias atuais”.
A PF pediu para investigar supostos crimes de concussão, fraude processual, organização criminosa e lavagem de capitais.
A corporação defendeu a necessidade de oitiva de Moro, de sua esposa e atual deputada Rosângela Moro, da juíza Gabriela Hardt, do ex-deputado e ex-procurador Deltan Dailagnol e de “membros remanescentes do sistema de justiça criminal paranaense que compuseram a Força-Tarefa da Lava Jato ou nela ou com ela atuaram”.
Para a PGR, caso os relatos de Tony Garcia sejam “eventualmente comprovados”, eles apontariam “para um desvirtuamento das decisões tomadas no âmbito da Operação Lava Jato”.
Entre as supostas práticas irregulares da operação, citadas por Garcia, há determinação para realização de escutas ambientais e a exigência de entrega de gravações clandestinas, suposta cooptação de colaboradores pré-selecionados e eventual existência de chantagens, coações e ameaças.
Tony Garcia foi investigado pelo caso do Consórcio Nacional Garibaldi no Paraná. Em 2004, ele fechou acordo de colaboração premiada com o MPF que foi homologado por Moro.
Conforme Garcia, o ajuste estabeleceu trinta tarefas para ele cumprir, incluindo busca de informações sobre desembargadores, juízes, conselheiros do Tribunal de Contas do Paraná, deputados federais, ministros e secretários.
Nas oitivas ao STF, em 2023, Garcia disse que essas tarefas abrangiam investigados da Operação Lava Jato sob “o mesmo algoritmo criminoso, em que o declarante era obrigado a investigar pessoas com o uso de escutas ambientais, fornecimento de números de telefones para fins de interceptação, bem como demais informações privilegiadas (agente infiltrado clandestino)”, conforme a PGR.
A defesa de Garcia disse ao STF, em setembro, que o empresário foi “o laboratório do abusador contumaz Sérgio Fernando Moro; foi a partir do seu caso que o então Magistrado testou e desenvolveu as táticas ilegais que foram reproduzidas, anos depois, na Operação Lava Jato”.
Segundo o documento, o acordo de colaboração premiada “demonstra que Tony Garcia foi, de fato, agente infiltrado do então Juiz Sérgio Fernando Moro!”.
Conforme Garcia, Moro teria pedido que ele se “reunisse com alvos determinados” para que fizesse grampos com escuta ambiental a fim de “esclarecer fatos pertinentes à investigação”.
Uma das tarefas envolvia levantar provas sobre susposta cobrança para receber um recurso no Tribunal de Justiça do Paraná.
Outra refere-se à apuração sobre suposta influência na escolha de um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio do ex-advogado de Garcia, Roberto Bertholdo.
Uma das últimas tarefas, segundo as informações apresentadas por Garcia, envolvia trazer provas sobre um fato criminoso que o próprio Moro teria sido vítima: uma interceptação da linha telefônica do então juiz por Bertholdo.
Compartilhe: