O ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, compareceu pela primeira vez à Justiça Federal para um interrogatório presencial no âmbito da Operação Lava Jato. Ele é acusado de repassar propina ao ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB), já absolvido no caso.
Cabral chegou nesta segunda-feira, 20, numa cadeira de rodas devido a três hérnias de disco. Depois de ter sua sentença anulada, o processo voltou à primeira instância para novo julgamento.
O ex-governador solicitou um novo interrogatório para negar suas declarações anteriores, feitas em fevereiro de 2020, quando havia fechado a delação com a Polícia Federal. Na ocasião, ele confirmou a denúncia de repasses mensais de R$ 150 mil ao ex-governador do Rio Luiz Fernando Pezão.
Cabral alega ‘circunstâncias constrangedoras’
Nesta segunda, Cabral afirmou que confessou sob “circunstâncias muito constrangedoras”. “É muito constrangimento, uma tortura psicológica, física”, justificou. “Fui levado a oito presídios. Prenderam a minha mulher. Entraram na casa da minha ex-mulher. Foram na casa do meu irmão. Tudo isso está em análise no Conselho Nacional de Justiça [CNJ]”, disse Cabral.
A juíza Caroline Figueiredo conduziu o interrogatório. “Foi uma avalanche contra minha família, contra mim”, afirmou o ex-governador. “A pressão era grande para uma postura que não queria ter. Induzido por um ex-advogado, pela Polícia Federal, fui levado a circunstâncias que não vão entrar na minha biografia.
O político lembrou de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2021, de anular a delação premiada assinada com a Polícia Federal, no fim de 2019.
“Tenho muito a agradecer ao Supremo”, disse Cabral.
Após afirmar que mentiu em seu interrogatório anterior, Cabral decidiu não responder a perguntas e ficar em silêncio. Neste processo, o juiz Marcelo Bretas condenou Cabral a 32 anos, 9 meses e 5 dias de prisão.
A sentença foi anulada porque outro réu apontou que o ex-governador já havia assinado a delação com a PF, motivo pelo qual deveria ter sido ouvido antes. Pezão foi sentenciado a 98 anos e 11 meses de detenção. O Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), porém, decidiu absolvê-lo.
Comparação de experiências em interrogatórios
Este é o trigésimo interrogatório do ex-governador à Justiça Federal. Os anteriores foram realizados durante sua prisão. Cabral era levado em veículo da Secretaria de Administração Penitenciária (Seap), entrava pelos fundos da Justiça Federal e aguardava numa sala a hora de falar.
O último interrogatório foi prestado por videoconferência, durante a pandemia. “É completamento diferente [vir em liberdade]. É uma outra situação. Só que agora com dor na coluna”, disse ele, à Folha.
No primeiro interrogatório, o ex-governador negava as acusações. Dois anos após a prisão, Cabral decidiu confessar seus crimes. Após deixar a cadeia, em dezembro de 2022, voltou a negá-los. Cabral ficou seis anos preso preventivamente enquanto respondia a trinta e sete ações penais, trinta e cinco relacionadas aos desdobramentos da Operação Lava Jato.
Ele está em liberdade desde dezembro de 2022, obteve vitórias para anular sentenças, mas permanece com um passivo de trinta e quatro processos criminais (32 da Lava Jato). Ele é acusado de ter cobrado 5% de propina sobre os grandes contratos de sua gestão (2007-2014).
As investigações descobriram contas com cerca de R$ 300 milhões no exterior em nome de “laranjas”, além de joias e pedras preciosas usadas, segundo o Ministério Público Federal, para lavagem de dinheiro.