O setor público brasileiro enfrenta grandes distorções salariais, com diferenças de 800% entre os salários iniciais e finais de cargos semelhantes. É o que diz o Anuário de Gestão de Pessoas no Serviço Público, lançado em 2024 pelo Instituto República.org.
O estudo mostra que os Estados brasileiros enfrentam problemas graves de gestão de pessoas no serviço público, com supersalários acima do teto de gastos, disparidades entre os vencimentos de funcionários públicos e privilégios para algumas carreiras. O documento mapeou as cinco principais distorções e apresentou sugestões para reestruturar o sistema.
De acordo com o Anuário, uma das maiores falhas é a ausência de padronização salarial para funções semelhantes no setor público estadual. Enquanto um analista administrativo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) inicia com vencimentos abaixo de R$ 6 mil, um analista de agência reguladora começa com cerca de R$ 10 mil.
Outro problema identificado é a falta de relação entre a complexidade das funções e a remuneração. Coordenadores-gerais, que ocupam cargos de alta direção, recebem até R$ 12,7 mil, o equivalente a apenas 64% do salário de um analista de ciência e tecnologia e a 38% dos vencimentos de um auditor fiscal do Trabalho.
Amplitude salarial desproporcional desmotiva servidores
A disparidade nos salários no setor público também varia amplamente entre Estados e categorias. No Tocantins, um analista de gestão governamental começa com R$ 4,5 mil e pode alcançar R$ 41,2 mil ao longo da carreira — um aumento de 808%. Já em Santa Catarina, a mesma função varia de R$ 1,2 mil a R$ 1,9 mil, um crescimento de 47%.
Em Mato Grosso do Sul, o salário de um auditor fiscal pode chegar aos R$ 49 mil. O valor é superior ao teto constitucional, atualmente em R$ 44 mil.
A falta de uma política uniforme de reajuste é outro desafio. Carreiras como auditores fiscais tiveram aumentos reais superiores a 50%, enquanto cargos de alta direção enfrentaram cortes de até 37,3%. Essa inconsistência gera incerteza e privilegia categorias com maior poder de articulação política.
A concentração de privilégios em carreiras específicas também amplia as desigualdades. Advogados da União e auditores fiscais recebem remunerações próximas ao teto constitucional, além de benefícios extras, como honorários de sucumbência.
Para Paula Frias, coordenadora de Dados da República.org, essas distorções afetam a motivação e o engajamento dos servidores. “O sistema desestruturado torna o serviço público menos eficaz e gera insatisfação generalizada”, afirma.
A entidade propõe simplificar as carreiras, vinculando-as às competências necessárias para cada função, além de reduzir privilégios e criar critérios mais claros para progressão salarial.