O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, realiza neste domingo, 3, um plebiscito sobre a anexação do Essequibo, um território que representa 70% da Guiana. A votação ampliou a tensão entre os dois vizinhos e os temores de um conflito militar na região.
O plebiscito, convocado depois da definição da chapa opositora que desafiará Maduro no ano que vem, mostra que o ditador tenta com a votação avaliar o grau de mobilização de sua base e a adesão popular ao chavismo.
“Conheça a Guiana, país que atingiu PIB de US$ 15 bilhões e se tornou alvo da Venezuela”
Depois de anos de recessão econômica e êxodo em massa, o interesse venezuelano na Guiana é também econômico e tem crescido nos últimos anos, em razão da descoberta de petróleo na costa do país.
O plebiscito tem cinco perguntas. A principal prevê a inclusão do Essequibo como o 25º Estado venezuelano. A isso, se seguiria um plano acelerado para atender a sua população, incluindo a concessão de cidadania venezuelana e carteiras de identidade. Cerca de 125 mil pessoas vivem na região, 12% da população da Guiana.
O que Maduro quer com o plebiscito sobre a Guiana, segundo especialistas
Para o analista Jesús Castellanos Vásquez, a votação vai permitir ao governo monitorar diversas métricas que são importantes para a eleição de 2024. “A votação serve como termômetro para medir a capacidade de apoio ao regime e de controle”, disse Vásquez, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, referindo-se à mobilização da máquina chavista.
A consultora Eglée González-Lobato concorda. “Tendo em conta as pesquisas, que deixam em evidência o baixíssimo apoio da população, o plebiscito permite o diagnóstico da mobilização dos eleitores e mede a lealdade de governadores e prefeitos”, disse
Segundo a especialista, a oposição mostrou uma alta mobilização nas primárias de outubro, o que preocupa os chavistas. “A oposição demonstrou uma forma de votar em bloco, concentrado, articulado”, afirmou. “É uma combinação ganhadora, frente a um oficialismo monolítico. Por isso, Maduro busca atrair, com uma visão nacionalista, patriótica, o entusiasmo de um eleitorado que se afasta dele.”
A disputa sobre o Essequibo ganhou contornos geopolíticos. No mês passado, militares chavistas fizeram treinamentos na fronteira, o que chamou a atenção do Brasil e dos Estados Unidos. Os norte-americanos enviaram à Guiana chefes militares para contribuir nos planos de defesa.
Brasil acende sinal de alerta
O Ministério da Defesa do Brasil intensificou a presença militar na fronteira em Roraima e afirmou que monitora a crise. O Itamaraty, por sua vez, expressou preocupação com a disputa, mas não deve se pronunciar sobre a votação. “Do ponto de vista do Brasil, o referendo é um assunto interno da Venezuela”, disse a secretária do Ministério de Relações Exteriores para América Latina e Caribe, Gisela Padovan.
Usar ameaças externas para mobilizar sua base política não é novidade para o chavismo. Desde 1999, tanto Maduro quanto seu antecessor, Hugo Chávez, denunciaram planos da Colômbia e dos EUA para derrubá-los. Agora, com a normalização das relações com Bogotá, governada pelo esquerdista Gustavo Petro, a Guiana é a bola da vez.
Maduro usa a retórica do nacionalismo
Para isso, Maduro abusa da retórica nacionalista e recorre a métodos pouco convencionais. Com músicas de reggaeton pró-governo, vídeos nas redes sociais, distribuição de mapas revisados e aulas sobre geografia transmitidas pela TV estatal, o chavismo utiliza a história para tocar o público, transformando escolas em palcos de fervor patriótico.
“O governo venezuelano está usando a cartilha nacionalista para fortalecer seu apoio, que é cada vez menor, e procurando evitar qualquer questionamento dentro das Forças Armadas”, disse Kenneth Ramírez, presidente do Conselho Venezuelano de Relações Internacionais. “A ideia é tentar dividir a oposição entre os mais pragmáticos, que consideram importante participar no referendo, e aqueles que questionam a relevância do plebiscito.”
Já o cientista político venezuelano José Castillo Molleda acredita que o atual cenário é parecido com aquele que envolve a Argentina e as Malvinas. “Aquilo causou desconforto no Reino Unido, mas não mudou a situação além do simbolismo da medida”, disse.
No ano passado, a Rússia usou uma estratégia similar quando tentou anexar Províncias de etnia russa do leste da Ucrânia em meio à guerra: plebiscitos e uma campanha em massa para formalizar a cidadania russa dos habitantes dessas regiões.
Revista Oeste, com informações da Agência Estado