sexta-feira, janeiro 24, 2025
InícioDestaqueRombo no fundo de pensão da Eletrobras chega a R$ 1 bilhão

Rombo no fundo de pensão da Eletrobras chega a R$ 1 bilhão

Cerca de 630 aposentados da Eletros, o fundo de pensão da antiga estatal Eletrobras, vão começar a receber, nesta semana, contracheques com descontos que comprometem quase a totalidade do benefício. 

Essas pessoas, com idade média de 80 anos, estavam protegidas por uma liminar que, desde 2020, suspendeu a cobrança de parcelas extraordinárias para cobrir déficits do plano de benefício definido da fundação em 2011, 2013, 2015, 2020 e 2021. Essa decisão, porém, foi cassada em 2024. 

Agora, todo o valor que deixou de ser pago no período, equivalente a R$ 170 milhões, será descontado em parcelas proporcionais à expectativa de vida de cada beneficiário.

A situação do plano é crítica. De acordo com o balancete de 26 de dezembro, a somatória dos déficits atinge R$ 1,04 bilhão, o equivalente a 63% do patrimônio do fundo, que é de R$ 1,66 bilhão. Em 2023, o saldo acumulado ficou negativo em R$ 78 milhões e, até novembro, o déficit era de R$ 234 milhões.

Cristina Almeida, da Associação dos Assistidos dos Planos Previdenciários da Eletros (AABD), diz que a rentabilidade do plano de benefício definido em 2024 foi de apenas 0,2%, muito abaixo da taxa atuarial prevista para o ano, de 10,2%. Isso indica que um novo plano de equacionamento terá que ser feito em breve, caso não haja mudanças nas regras. 

“A gestão não é eficiente”, disse Cristina ao jornal Valor Econômico. “É um plano que está entrando em colapso e precisa de ajustes estruturais e financeiros.”

Greve de funcionários da Eletrobras
Greve de funcionários da Eletrobras | Foto: Reprodução/CNU-FNU

A AABD reúne 142 participantes do plano de benefício definido, com idade média de 76 anos, que optaram por não recorrer à Justiça e, desde 2020, estão arcando com as parcelas extraordinárias. 

Esses descontos representam hoje 30,35% dos proventos brutos. Somados às contribuições regulares — que garantem pensão depois da morte do beneficiário —, o total de descontos ultrapassa 40%, sem contar o Imposto de Renda e, quando aplicáveis, plano de saúde ou pensão alimentícia.

A Associação dos Aposentados Participantes da Eletros (Apel) obteve a liminar que suspendeu os descontos em 2021. A entidade agora aguarda a decisão do recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que pode sair até abril. O presidente da Apel, Paulo Roberto Silveira, contou ao Valor que mais de cem participantes morreram durante esse período. 

Atualmente, a associação tem 635 membros, sendo 570 assistidos e 65 pensionistas.

A origem do problema na pensão da Eletrobras

Os aposentados são a parte visível de um problema que se arrasta desde 2005, quando Eletros e Eletrobras decidiram criar um plano de contribuição definida. Os funcionários ativos poderiam optar por migrar para esse novo plano, mas os aposentados foram impedidos. A migração causou o esvaziamento do patrimônio do plano, que, em 2005, contava com 1,5 mil aposentados e 1,2 mil ativos. Dos que ainda trabalhavam, ainda há cerca de 400.

O déficit era uma questão de tempo. No entanto, durante a migração, foi incluído um artigo no estatuto do plano de benefício definido que garantia que eventuais déficits seriam cobertos integralmente pela Eletrobras para os já aposentados, apelidados pela Eletros de “blindados”. 

O primeiro rombo da história da Eletros surgiu em 2008, depois de um superávit de R$ 302,7 milhões em 2007. “Quando novos entrantes são bloqueados, a possibilidade de desequilíbrio é grande”, diz Silveira.

Embora a Eletrobras tenha coberto os primeiros déficits, os descontos começaram a atingir os “não blindados” — isto é, quem não era aposentado quando o plano foi fechado, em abril de 2006. 

No entanto, em 2016, a Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Sest) e a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) questionaram a constitucionalidade do artigo que exigia a cobertura total pela Eletrobras e, em 2018, as cobranças foram suspensas. 

Em 2019, novos cálculos foram refeitos e os aposentados “blindados” foram incluídos no equacionamento dos déficits. A participação da Eletrobras foi reduzida à proporção contributiva, ou seja, deixou de ser solidária. O atraso no início da cobrança gerou um impacto de cerca de R$ 400 milhões ao plano, pois os déficits foram corrigidos pela meta atuarial. 

No mesmo ano, a Eletros assinou um termo de ajustamento de conduta (TAC) e, em 2020, excluiu o artigo do estatuto. “A mudança foi aprovada no conselho deliberativo, e fui o único voto contra, me recusei a assinar o TAC”, diz Jack Steiner, ex-presidente da Apel e atualmente no conselho deliberativo da entidade.

Em fevereiro de 2020, a Apel recorreu à Justiça e, em julho de 2021, obteve a liminar de suspensão dos descontos, que exigia a devolução dos valores pagos. Porém, em abril passado, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região julgou favoravelmente à Eletrobras, Eletros e Previc.  

“Houve quebra de segurança jurídica”, diz Silveira. “Pessoas que tinham confiança num documento que a própria Eletrobras assinou estão sendo tratadas com crueldade.”

Usina Santo Antônio Eletrobras
Usina Santo Antônio | Foto: Reprodução/Eletrobras Furnas

Diante da situação, a Eletros tentou oferecer aos aposentados a opção de migração para o plano de contribuição definida, mas apenas 17% aderiram. Cristina Almeida argumenta que o desempenho desse plano é ainda pior, e que, ao migrar, os participantes têm que pagar os déficits à vista. Ela alerta que, a cada migração, o plano de benefício definido enfraquece, pois apenas os mais jovens optam por essa mudança.

Jany Mosso, de 77 anos, faz parte do grupo que não quis migrar e está na Justiça contra a Eletros. Ela relata um pesadelo com os descontos, que agora serão ainda maiores, devido aos valores atrasados. “Estou vivendo das poucas economias que tenho e  que terminarão em breve”, diz ela, que é aposentada há 30 anos, depois de 23 anos de serviço na Eletrobras. 

Ela calcula que ainda terá 13 anos de descontos. “Tenho colegas que não tinham reserva e estão sem a mínima condição de viver.”

Já o grupo que decidiu não ir à Justiça e continuar pagando as contribuições extraordinárias, representado pela AABD, fundada em 2015, busca melhorias e tem dialogado com a Eletrobras, Eletros e Previc. Cristina explica que a Eletrobras só entra no equacionamento do déficit se ele aconteceu enquanto os funcionários estavam na ativa. 

Como a maioria dos assistidos está aposentada, a proporção contributiva atual é de 5% para a empresa e 95% para os aposentados e pensionistas.

A AABD solicita que a Eletrobras contribua com metade das contribuições extraordinárias e das contribuições regulares, conforme prática de outros fundos de estatais, como Petros, Previ e Postalis. Além disso, exige a imunização da carteira de investimentos, que atualmente tem 19% em renda variável. “Não há motivo para esse perfil agressivo de investimentos”, diz Cristina.

Via Revista Oeste

MAIS DO AUTOR

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui