O presidente da República se aproveitou de um evento das centrais sindicais no Dia Primeiro de Maio para pedir voto em Guilherme Boulos para a Prefeitura de São Paulo. Tendo-se empregado a máquina pública e os cofres da Petrobras para a promoção de mais um comício, como de praxe no Brasil lulopetista, deitando raízes nas antigas mazelas do sindicalismo e do corporativismo varguistas, Lula fez o que qualquer consciência honesta julgaria uma campanha eleitoral antecipada.
Felizmente, em decisão judicial liminar, determinou-se, ao menos, a retirada do vídeo do ar. As práticas abusivas, porém, já estavam consumadas. O mandatário principal do Poder Executivo brasileiro capitaneou um desequilíbrio desavergonhado no processo eleitoral da maior cidade do país — e recursos do pagador de impostos foram direcionados para isso. Para completar, o principal adversário de Boulos é Ricardo Nunes, do MDB, partido que tem ministros no governo Lula e integra a base aliada.
O Partido Novo está se movimentando juridicamente para questionar mais esse absurdo e deixo registrado todo o meu apoio a que as medidas cabíveis sejam tomadas. Chama-me a atenção, porém, uma abordagem que acompanhei sendo desenvolvida em diferentes veículos jornalísticos acerca do assunto. Dizem eles que Lula e Guilherme Boulos, segundo fontes ligadas à campanha de Boulos em São Paulo, já haviam “calculado” os efeitos do gesto e decidiram que os custos legais a serem porventura pagos seriam baixos o suficiente para que a prática ilegal compensasse.
Sim, é literalmente isso que está escrito em mais de um veículo jornalístico. Dito em outros termos: os integrantes da campanha psolista entendem que a declaração de apoio explícito do petista, sinalizando a seus simpatizantes que sua chancela política é para Boulos, é tão importante para catapultar a candidatura do notório membro da Coordenação Nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto que, perto disso, uma eventual condenação ao pagamento de multa de R$ 25 mil não significaria nada.
Para PT e Psol, descumprir a lei é a regra
Para Lula e Guilherme Boulos, o respeito ou não à lei eleitoral, o respeito ou não a princípios estabelecidos para resguardar a isonomia no processo de escolha democrática, seria resultado de um cálculo utilitário. Para os políticos de PT e Psol, se lhes for conveniente, às favas com a lei, e que se dane a obviedade do ilícito. Essa é a lógica.
Em tempos em que supostas “importunações a baleias”, comentários infelizes, dúvidas sobre o sistema eleitoral e críticas a autoridades brasileiras por parte de cidadãos comuns ou parlamentares detentores de imunidade são vistos como crimes ou extremíssimos atentados às instituições, que dirão os augustos defensores de nossa democracia diante de tamanho desprestígio de que ela é vítima? Os defensores de Lula e Boulos estão dizendo que os princípios e valores democráticos são importantes, mas, quando é conveniente para que seus candidatos triunfem, podem ser desprezados.
O Brasil do Supremo
Pensando bem, essa é a filosofia dominante entre os apoiadores do governo atual e da juristocracia instalada no país pelo Supremo Tribunal Federal e suas atitudes autoritárias travestidas de providências moderadoras. Eles são extremamente democráticos, mas quando isso beneficia suas preferências. Quando é para garantir que elas prevaleçam, o caminho é replicar as práticas mais tirânicas. “É só um pouco”, “é só por enquanto”, “com todos os cuidados”, “medidas excepcionais de emergência” — e assim vamos caminhando. Se o presidente da República e um candidato à Prefeitura de São Paulo violam a lei, não há necessidade de tomar qualquer providência nem razão para qualquer escândalo, porque, nesse caso, suas ações são “para o bem”.
Também não poderíamos esperar nada muito diferente de uma pessoa que se livrou de condenações por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e recebimento de vantagens indevidas — por atos cometidos na época em que comandava o Brasil durante os maiores escândalos de corrupção da era republicana — em virtude de tecnicalidades jurídicas, saindo da prisão para a Presidência da República em três anos, e outra que dedicou a vida a militar pela invasão de propriedades privadas. Aqueles que os aplaudem, assim como aplaudem os juristocratas do STF, estão louvando a consagração do Brasil como terra sem lei.