sábado, novembro 23, 2024
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Plano de Elon Musk de colonizar Marte é um fracasso, diz livro

A promessa de começar uma nova vida em Marte pode parecer atraente, até mesmo viável, à medida que a crise climática se intensifica e a tecnologia espacial e de foguetes avança.

Mas a realidade seria terrível, segundo um livro que argumenta que a intenção de Elon Musk de colonizar o Planeta Vermelho nos próximos 30 anos está fadada ao fracasso.

Escrito por Kelly e Zach Weinersmith, “A City on Mars: Can We Settle Space, Should We Settle Space, and Have We Really Thought This Through?” (Uma Cidade em Marte: Podemos Colonizar o Espaço, Devemos Colonizar o Espaço e Realmente Refletimos Sobre Isso?, em português) venceu o Prêmio Royal Society Trivedi Science Book 2024 e foi publicado em novembro de 2023.

Os autores, marido e mulher, investigaram como seria realmente a vida no ambiente implacável do Planeta Vermelho e esclarecem quaisquer equívocos sobre o que isso poderia envolver.

Kelly Weinersmith, bióloga e professora assistente adjunta na Universidade Rice em Houston, e Zach Weinersmith, cartunista, mergulham em todo tipo de questões que os humanos enfrentariam se nos tornássemos uma espécie multiplanetária.

 

Como construiríamos fazendas espaciais para alimentar todos? E quanto a dar à luz bebês e criar filhos? A colonização de Marte desencadearia uma nova corrida espacial?

Inicialmente entusiasmados com a perspectiva de humanos vivendo em Marte, os autores disseram que sua pesquisa os transformou em céticos quanto à colonização espacial. “Deixar uma Terra dois [graus Celsius] mais quente por Marte seria como deixar um quarto bagunçado para viver em um depósito de lixo tóxico”, escreveram na introdução do livro.

(Esta entrevista foi editada por questões de extensão e clareza)

Kelly Weinersmith (KW): Somos nerds. Estávamos muito empolgados com a colonização espacial. Tínhamos escrito um livro chamado ‘Soonish: Ten Emerging Technologies That Will Improve and/or Ruin Everything’ (Em breve: Dez tecnologias emergentes que melhorarão e/ou arruinarão tudo, em português), e duas das tecnologias emergentes que abordamos naquele livro eram o acesso mais barato ao espaço e a mineração de asteroides.

Entre essas duas tecnologias, pensamos que poderíamos enviar todos os equipamentos necessários para manter os humanos vivos no espaço, ou usar recursos espaciais para construir assentamentos espaciais.

Então, mesmo que as pessoas estivessem dizendo há décadas que isso estava chegando em breve, pensamos que talvez agora finalmente estivesse chegando.

CNN: Mas não foi isso que você concluiu depois de pesquisar e escrever o livro?

KW: Quanto mais nos aprofundávamos — no segundo ano dos quatro anos do processo de pesquisa, percebemos que há muitas coisas que não sabemos e ainda precisamos descobrir. E se fizermos isso em breve, pode ser uma catástrofe ética.

Em “A City on Mars” (Uma cidade em Marte), os autores Kelly e Zach Weinersmith argumentam que são necessárias muito mais pesquisas antes que os seres humanos possam povoar Marte com segurança
Em “A City on Mars” (Uma cidade em Marte), os autores Kelly e Zach Weinersmith argumentam que são necessárias muito mais pesquisas antes que os seres humanos possam povoar Marte com segurança • Particular Books via CNN Newsource

CNN: Os humanos podem colonizar Marte à curto prazo?

KW: Musk está dizendo que nos próximos 30 anos, teremos um milhão de pessoas em Marte. Não há como aumentar para um milhão de seres humanos em Marte sem que algo catastrófico aconteça, seja em termos de descobrir que não podemos ter bebês lá, e mães e bebês estão morrendo ou desenvolvendo câncer.

Se você quer fazer isso, tem que ser um trabalho lento de gerações para chegar a um ponto onde poderíamos ser autossustentáveis no Planeta Vermelho. É um ambiente tão hostil que requer equipamentos complexos para mantê-lo vivo, e eu simplesmente não vejo isso acontecendo em Marte no curto prazo.

CNN: O que é possível alcançar em nosso tempo de vida atual?

KW: Muita pesquisa, e isso é empolgante, eu acho. Adoraria ver, por exemplo, uma estação de pesquisa na Lua onde temos colônias de roedores, e vemos como eles se saem ao passar por algumas gerações.

Talvez em nossa vida, veremos pessoas pousarem em Marte, fazerem algumas explorações e voltarem para casa, isso pode acontecer, mas não acho que teremos bebês lá.

CNN: Você destaca a reprodução como um dos maiores desafios. Por quê?

KW: Um dos lugares por onde começamos foi a biologia e as questões médicas. Esse foi nosso primeiro momento de revelação.

Acho que presumimos que os 50 anos de pesquisa que obtivemos com astronautas nas estações espaciais orbitando a Terra tinham nos dito tudo o que precisávamos saber sobre como os humanos respondem em regimes de gravidade diferentes da Terra e como respondem à radiação espacial.

Registro do rover Perseverance da Nasa na superfície marciana em 19 de novembro
Registro do rover Perseverance da Nasa na superfície marciana em 19 de novembro • Nasa/JPL-Caltech via CNN Newsource

Mas acontece que os astronautas (lá) são protegidos pela magnetosfera (uma bolha protetora que envolve a atmosfera da Terra), e sabemos que estar em queda livre, que é essencialmente como experimentar gravidade zero, é previsivelmente ruim para os ossos, para os músculos.

Essa microgravidade explica por que a visão tende a se degradar ao longo do tempo, e estar no espaço pode resultar em declínios cognitivos a longo prazo.

A permanência mais longa no espaço foi de menos de um ano e meio, e os astronautas geralmente experimentam cerca de 1% de perda óssea nos quadris a cada mês. Mesmo que isso diminua para apenas 0,1% por mês em Marte (onde a gravidade é 38% da gravidade da superfície terrestre), pode-se imaginar que isso seria realmente prejudicial, por exemplo, durante o trabalho de parto, quando seria necessário esperar que os quadris estejam fortes o suficiente para suportá-lo.

Ficamos surpresos com quantos problemas pensávamos ter sob controle. Mas acontece que temos pouquíssimos dados relevantes sobre como os adultos se sairão, muito menos sobre como seria ter bebês.

Zach Weinersmith: É necessário pesquisar muito mais sobre reprodução, simplesmente porque é uma grande questão em aberto. Pode ser completamente benigno, pelo que sabemos — ficaríamos surpresos com isso.

À primeira vista, a suposição deve ser que [os bebês] terão uma taxa maior que o normal de anormalidades que precisam ser tratadas sem nenhum tipo de cuidado [médico] que consideramos garantido na Terra.

CNN: Por que o ambiente em Marte é tão hostil?

ZW: A questão fundamental é entender que os humanos evoluíram na Terra, e Marte simplesmente carece de muitas coisas que temos na Terra.

Tem cerca de 40% de gravidade e sabemos que humanos em microgravidade têm todos os tipos de problemas importantes, e o que acontece a 40% simplesmente não sabemos.

O solo está carregado de perclorato, conhecido por causar distúrbios hormonais. Na verdade, não temos muitos dados sobre exposição prolongada a altos níveis dessa substância, porque por que teríamos? Mas presumivelmente não é bom para humanos em desenvolvimento.

Você tem uma atmosfera extremamente fina. Essencialmente, isso significa que não é possível sair sem uma roupa pressurizada. A atmosfera é, no entanto, poderosa o suficiente para provocar tempestades de poeira em todo o planeta e também grandes tempestades localizadas.

Há também o regolito, que tem pedras e vidros pontiagudos, tudo isso está se movendo, o que é ruim para equipamentos e humanos.

Além disso, se você pretende usar energia solar, é melhor ter um sistema de backup muito bom, e vai ter que gastar muito tempo mantendo-o.

Marte normalmente tem grandes tempestades de poeira e ventos fortes; rover Curiosity da Nasa registrou uma rajada de vento em Marte em 10 de junho
Marte normalmente tem grandes tempestades de poeira e ventos fortes; rover Curiosity da Nasa registrou uma rajada de vento em Marte em 10 de junho • Nasa/JPL-Caltech via CNN Newsource

Também, se você estiver em qualquer lugar perto da superfície, estará exposto a altos níveis de radiação, porque a atmosfera marciana é muito fina, e porque Marte é apenas muito fracamente magnético, não tem uma magnetosfera poderosa como a Terra tem.

KW: Marte, em média, está a 225 milhões de quilômetros de distância, o que significa que sempre haverá um atraso na comunicação: [de pelo menos] três minutos, e às vezes até 22 a 24 minutos. Então, se houver uma emergência, você nunca poderá fazer uma chamada ao vivo para médicos na Terra.

CNN: E quanto à governança espacial?

KW: Há muitas incógnitas ali. Em 1967, conseguimos o Tratado do Espaço Exterior através das Nações Unidas, e esse é o principal documento que governa o espaço. Tem apenas cerca de 2.000 palavras.

É um documento muito curto, e foi especificamente feito para ser vago, porque as pessoas que o escreveram sabiam que não é possível realmente prever como o futuro vai se desenrolar.

Agora estamos no ponto em que as coisas estão começando a esquentar no espaço, mas não temos diretrizes claras sobre o que é permitido. Definitivamente não é permitido reivindicar soberania.

Além disso, qualquer pessoa que vai ao espaço é responsabilidade de alguma nação, então Musk seria quase certamente responsabilidade dos Estados Unidos.

Algumas perguntas são menos claras, como o que você tem permissão para fazer com recursos no espaço. Você tem essa falta de clareza sobre quem tem permissão para ir aonde, quanto tempo eles têm permissão para ficar lá, o que eles têm permissão para fazer com esses recursos, você pode imaginar a corrida espacial parte dois entre os Estados Unidos e a China.

Desta vez, em vez de apenas ir e voltar, o que não impede ninguém de fazer o mesmo, você pousa e cria uma estação de pesquisa na melhor parte [de Marte ou da Lua], o que significa que ninguém mais pode usar aquele local.

Assim, podemos imaginar que haverá interesses muito maiores desta vez, o que é um pouco preocupante, dado o atual contexto geopolítico entre China e Estados Unidos.

CNN: Como nos alimentaríamos em Marte?

ZW: Outro aspecto que necessita de uma enorme quantidade de pesquisa é a ecologia de ciclo fechado. Isto é, como ter uma bolha subterrânea selada que seja uma espécie de área agrícola intensiva que produza oxigênio e outros consumíveis? Nós realmente não sabemos como fazer isso.

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Via CNN

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