domingo, junho 1, 2025
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O preço da liberdade é a coragem de enfrentar os censores, e Trump fez isso

Dizia meu avô que “não precisamos gostar de um homem para reconhecer seus acertos”. Isso pede de nós uma sinceridade e desprendimento que, sei, 90% da humanidade contemporânea não está a fim de praticar. Mas é um fato puro, ao ponto de meu avô, um caipira paulista, poder enunciá-lo sem a mínima retórica.

Pessoalmente nunca gostei das maneiras públicas de Trump. A mim ele soa como afetado, grosseiro e sem nenhuma daquela prudência que Russell Kirk — o pensador conservador moderno mais lido nos EUA — afirmava ser a principal virtude de um conservador. Todavia, a perfumaria de meus gostos pessoais não deve tapar minha sensibilidade de reconhecer os acertos do presidente laranjão. E se há uma postura cultural louvável nele, um acerto político de Trump que merece reverência nesse primeiro instante de seu segundo governo, é a percepção de que não basta se dizer “contra a censura” e fazer discursos contundentes contra os tiranetes de nossos dias. É preciso combatê-los, expô-los e tirá-los de sua tranquilidade censora. Como disse Margaret Thatcher em abril de 1982, em uma entrevista ao canal ITN: “Quando você para um ditador, sempre há riscos. Mas há riscos maiores ainda em não parar um ditador.”

Na última quarta-feira, 29, Marco Rubio, secretário de Estado dos EUA, anunciou que o governo Trump aplicará a conhecida Lei Magnitsky contra aqueles que, segundo avaliação do governo norte-americano, tenham censurado e atentado deliberadamente contra os princípios fundamentais da dignidade humana. Desde 2016, a legislação protege não apenas cidadãos norte-americanos, mas também qualquer indivíduo ou grupo, em qualquer parte do mundo, que seja vítima de censores, déspotas e autoritarismos de diversas naturezas. Num primeiro momento, embora o anúncio não tenha revelado oficialmente os nomes dos punidos, é notório que, nos últimos dias, Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal, figurava, se não no topo, ao menos entre os cinco primeiros dessa lista da Magnitsky. Veículos da mídia — tanto conservadora quanto progressista —, assim como parlamentares de ambos os espectros ideológicos, já tratam como certa a iminente sanção ao ministro brasileiro, cujas ações vêm sendo alvo recorrente de críticas não só no Congresso dos Estados Unidos, mas também na Europa e em diversos países vizinhos ao Brasil.

O ministro Alexandre de Moraes durante julgamento | Foto: Foto: Rosinei Coutinho/STF
Alexandre de Moraes pode ser sancionado pelo governo de Donald Trump por impor censura a cidadãos norte-americanos | Foto: Foto: Rosinei Coutinho/STF

Mais do que corajosa, a atual aplicação da referida lei por Trump é um grito claro ao mundo de que ele pretende resgatar com toda diligência a posição norte-americana de vigilante da democracia liberal no Ocidente — principalmente nas Américas — e de que não será ele a ignorar a tradição liberal de seu país, de onde ditadores e tiranos costumam ser afugentados tanto pela máquina republicana, como pela própria cultura popular.

Se dermos uma breve olhada para trás, veremos que foi exatamente o que estadistas como Reagan, João Paulo II, Thatcher e Churchill fizeram em seus dias. Um governo eficiente e minimamente coerente não passa meramente por aplicações de medidas econômicas, discursos ideologicamente ajustados e sinalizações de virtudes sociais e ecológicas, mas antes por uma demonstração de clareza moral e definições claras de determinadas fronteiras éticas que serão observadas. Todos esses estadistas, e, no que concerne à liberdade de expressão, Trump delimitam com muita firmeza que no Ocidente não há lugar para ditadores, nem sequer sinalização para ideias ditatoriais.

Se você é, de fato, defensor da liberdade de expressão, não há dubiedade ou tibieza na conclusão de que devemos punir ditadores, pessoas que tentam se tornar ditadores ou sinalizam inclinações e ações ditatoriais. A vigilância moral sobre o nascimento de déspotas no século passado custou mais de uma centena de milhões de mortos diretamente pelas mãos de ditadores e de suas máquinas. Criar anticorpos e atacar quaisquer disposições ditatoriais ainda na placenta é o mínimo que se espera de nações que são decididamente democráticas, que prezam pela liberdade para além de uma retórica vagabunda e oportunista de instante.

Um Estado democrático de direito não deve se apoiar somente em instituições formais e pesos e contrapesos intelectivos, pois esse sistema não se sustenta por mera existência inerte, ele precisa ser mantido, reafirmado e constantemente defendido com paixão e inteligência. O processo complementar a uma constituição democrática e instituições funcionais são líderes políticos engajados em defender, acima de tudo, a robustez da liberdade política, jurídica e cultural de seu país, pois sem a garantia dessa liberdade a própria democracia real é inviabilizada em sua base. Ainda que ache Trump um chucro, ele está sendo um estadista liberal ativo, um homem de ação que não se escondeu em suas paredes, definindo com extrema contundência e clareza sua posição em defesa da liberdade ocidental.

Não é momento para apreciações cosméticas de Trump, é preciso enxergá-lo por meio de suas ações efetivas, e ainda que sua postura seja estúpida em certas ocasiões, vá por mim, é preferível um líder mal-educado do que um que leva o povo para o gulag mais próximo ao som de Imagine de John Lennon. Essa clareza moral de Trump não é um bem necessário somente a presidentes e representantes nacionais, mas a todo homem. Uma criança entende o que são valores quando seus pais claramente delimitam o que pode ou não pode, o que é certo e errado, o que é bom e mal. Gosto muito de uma frase de Walt Whitman: “Não há semana, dia ou hora em que a tirania não possa entrar neste país, se o povo perder a confiança suprema em si mesmo — se perder sua rudeza e seu espírito de resistência.”

Nem o mais completo e virtuoso líder pode guiar uma nação de indivíduos decididamente fracos de espírito e confusos de valores. Hoje é Trump quem mostra clareza moral o suficiente para punir tiranos, enquanto a esquerda — a sempre bondosa e virtuosíssima esquerda — busca em seu saco de argumentos bisonhos retóricas inclusivas para justificar as ações desses mesmos tiranos. Quando o homem perde essa tal clareza numa infinitude de “interpretações”, “relativismos” e “releituras”, ele se torna confuso, informe, e aquilo que deveria ser um caminho definido se torna um solo mole, arenoso, mortal; num mundo em que a verdade e a bondade se tornaram relativas, a covardia logo se torna o padrão de virtude sob o nome de “maleabilidade moral” ou “diplomacia”.

Na encíclica Centesimus Annus, São João Paulo II afirmou: “Uma democracia sem valores facilmente se transforma em um totalitarismo aberto ou disfarçado.” Essa é uma verdade cada vez mais evidente na contemporaneidade. Pois nesse solo fofo de relativismo e neoautoritarismo, a “democracia” deve ser defendida por meio de ações totalitárias, em nome de um disforme “bem social indispensável”; opositores e redes sociais devem ser calados em nome da “liberdade”; ministros devem ser eles próprios e suas ideias o código penal e processual de toda a nação. A contradição se torna ortodoxia, enquanto a coerência se torna subversão. Quando falta clareza moral e valores sólidos, todo absurdo passa a ser possível. E, nesse terreno, defender a liberdade e se opor à tirania passa a ser tarefa de todos, assim como punir os tiranos, tarefa dos líderes.

Todo ditador nasce do vácuo moral deixado pela covardia de um povo e/ou de seus líderes. Como gostaria que essa verdade fosse gravada na alma do brasileiro, isso nos tornaria mais afrontosos ante ditadores, menos trouxas ante os corruptos, menos covardes ante nossas obrigações.

Via Revista Oeste

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