quinta-feira, setembro 19, 2024
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O caminho da prosperidade de Taiwan

* Márcio Coimbra

Na Ásia, do alto do Taipei 101, a paisagem respira economia. Não somente nos andares que suportam o arranha-céu, onde estão instaladas empresas e um enorme shopping center, além da presença constante de uma avalanche de turistas que visitam o prédio todos os dias. Do alto do 92º andar é possível enxergar a dimensão de uma renda média per capita de US$ 35 mil, o equivalente a mais de três vezes a média mundial. Isso tudo se torna ainda mais surpreendente quando falamos de um país que sete décadas atrás vivia sob uma base agrária e se transformou em potência tecnológica de ponta, essencial para a economia mundial com a produção de semicondutores.

Taiwan fica localizada na ilha de Formosa (assim batizada pelos portugueses em 1542), ao sul do Japão e ao norte das Filipinas. O governo existente no país é sucessor oficial daquele estabelecido com o fim da dinastia Qing, última da história imperial chinesa. O modelo democrático de nação, chamado oficialmente desde sua fundação como República da China, elegeu neste ano Lai Ching-te, também conhecido como Wiliam Lai, como seu presidente para um mandato de quatro anos.

terremoto Taiwan
Por estar situada na Ásia, em uma região permeada por países autoritários, Taiwan é uma exceção à regra | Foto: Reprodução

Hoje, o país é conhecido como “escudo de silício”, diante de sua seminal posição geopolítica estratégica na economia mundial. Ao contrário dos escudos reais, como aqueles utilizados por Israel, a terminologia se refere à importância da ilha na fabricação de chips semicondutores, que usam o silício como matéria-prima. Preservar este ativo, essencial para a nova economia, se tornou uma prioridade para diversas nações que dependem diretamente de suas aplicações.

A estratégia está na essência do desenvolvimento do país e isso começou décadas atrás. Taiwan entendeu que o título de propriedade sobre terras poderia ser um ativo valioso para a economia. Assim, realizou uma reforma agrária profunda ainda na década de 1950. O incentivo de possuir terras próprias levou os novos proprietários a investirem em sistemas de irrigação, equipamentos mecanizados e fertilizantes. Uma década depois, o valor da produção agrícola duplicou, tornando a ilha importante exportador de arroz, açúcar, banana e chá. Na sequência vieram a industrialização, investimento estrangeiro e as zonas de processamento de exportação.

O próximo ponto a ser atacado foi a educação, direcionada para os rumos tomados pela economia, com foco especial em áreas científicas e técnicas com o objetivo de promover o desenvolvimento agrário e industrial. Isso deu origem a novas gerações de cientistas e engenheiros que ajudaram em um salto industrial e tecnológico, permitindo ao país subir na cadeia de valor da indústria transformadora global. Atualmente são 146 universidades e 97% das pessoas têm formação superior.

Assim, a tecnologia passou a assumir cada vez mais importância na economia. O surgimento, na década de 1970, do Instituto de Pesquisa de Tecnologia Industrial funcionou como uma incubadora que atraiu cientistas e engenheiros talentosos para o país, levando à criação do Hsinchu Science Park, o Vale do Silício taiwanês. Uma atmosfera que produziu a maior fabricante de chips do mundo: a TSMC.

Atualmente 66% da produção mundial de semicondutores está em Taiwan, com 56% destes microchips saindo da lavra da TSMC. O impacto no mercado de capitais é avassalador: a proporção de tech na bolsa é de quase 60%, batendo com facilidade o Brasil, com apenas 1%, Europa, com tímidos 7%, e até os EUA com 37%. Isto é o resultado de educação, inovação e tecnologia. A tecnologia taiwanesa está presente em nossos smartphones, televisores, videogames e computadores, o que significa que todos carregamos um pouco de Taiwan todos os dias.

O resultado está expresso em números. Nos últimos 30 anos, o PIB per capita em dólares cresceu 220% (4% ao ano), comparado a 2,5% ao ano da Europa. Em valores absolutos, a produtividade é quase três vezes maior que a da China continental e aproxima-se de patamares europeus. Destaca-se no ranking de competitividade do World Economic Forum, no índice de Liberdade Econômica da Heritage Foundation, no ranking de investimentos do Business Environment Risk Intelligence e do Banco Mundial, além de ser um dos ambientes empresariais mais seguros do mundo, segundo a The Economist.

Por estar situada na Ásia, em uma região permeada por países autoritários, Taiwan é uma exceção à regra, uma vez que produz desenvolvimento econômico aliado a um modelo de liberdade pleno. É a nação mais democrática de toda Ásia e aquela com a maior liberdade de imprensa no continente, com a segunda melhor qualidade de vida do mundo. A democracia surgiu como um pilar natural de uma nação desenvolvida e com alto grau de educação.

A manutenção da soberania da ilha, constantemente ameaçada pelo governo de Pequim em tempos recentes, é essencial para a estabilidade econômica internacional. Além do mais, o país asiático segue sendo o farol de uma sociedade virtuosa, aberta e moderna para Ásia, cada vez mais necessária e essencial em momentos delicados como este vivemos, com a ascensão de inúmeras autocracias ao redor do mundo.

Assim como preconizou Sun Tzu, “as oportunidades multiplicam-se à medida que são agarradas”. O caminho percorrido por Taiwan é o melhor exemplo desta máxima. O país agarrou todas as oportunidades que estavam diante de si, ensinando que para vencer qualquer guerra, antes é preciso dominar a arte da estratégia. Não há dúvida de que o “escudo de silício” da Ásia aplicou com sabedoria estes ensinamentos. Algo que explica de forma definitiva a visão de prosperidade que enxergamos do topo do Taipei 101.

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Taipei 101, edifício que representa a riqueza e o progresso tecnológico de Taiwan | Foto: Reprodução/Wikimedia Commons

* Márcio Coimbra é presidente do Instituto Monitor da Democracia e conselheiro da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig). Cientista Político, mestre em ação política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil e do Senado Federal

Via Revista Oeste

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