sábado, novembro 23, 2024
InícioPolítica'O calamitoso debate entre candidatos à Prefeitura de São Paulo'

‘O calamitoso debate entre candidatos à Prefeitura de São Paulo’

(J. R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 18 de janeiro de 2024)

O calamitoso debate que acaba de se ver entre os candidatos à prefeitura da maior, mais rica e mais moderna cidade do Brasil deixou as classes culturais indignadas com as cenas de sarjeta ali exibidas, e com os responsáveis por elas. Condena-se severamente o candidato que deu cadeiradas ao vivo no adversário — ou então defende-se o seu “direito de legítima defesa da honra”, como alegavam antigamente os advogados de defesa dos maridos traídos. Condena-se o candidato que recebeu as cadeiradas, pelos insultos que fez ao opositor. Condena-se os partidos que lançaram um e outro na disputa pela Prefeitura de São Paulo.

Tudo isso é muito razoável, mas deixa de lado o que provavelmente está no coração do problema: como e por que a eleição para escolher o prefeito da cidade tida como a mais civilizada do Brasil foi acabar desse jeito. É isso que São Paulo tem de oferecer aos eleitores — não haveria, entre os 9 milhões de pessoas aptas a votar e receber votos no município, nada um pouco melhor? Tem de haver, pela lei das probabilidades e pela lógica elementar. Mas o que se está vendo na vida real é a exaustão absoluta do eleitor com a política “normal”. O que aparece, então, é a política anormal.

Zero por zero, porque não mais um zero — e que não enche a paciência do eleitor com “programas de governo”, “políticas públicas”, “planejamento” e outras mentiras contadas com boa educação? O fato indiscutível é que os candidatos descritos como absurdos só existem porque um número cada vez maior de eleitores não respeita, não se interessa e não acredita nos candidatos “aceitáveis” — os oriundos das estruturas políticas que estão aí. Para resumir a opera: dá para alguém levar a sério uma atividade em que o senador Rodrigo Pacheco, por exemplo, é tido como “importante”?

A Prefeitura de São Paulo é como o restante do Brasil

Nem se fale do resto. Há o chefe de governo que promete combater as queimadas do Brasil em Nova York — denunciando a “crise do clima” como culpada pela incompetência terminal de seu governo no trabalho mínimo de prevenção aos incêndios. Há a clara percepção que o país é governado, nos mais diversos níveis, por fugitivos de uma colônia penal. Há o STF, que proíbe 20 milhões de brasileiros de se expressarem no X — e que devolve aos corruptos confessos os bilhões de reais que pagaram em multas para não serem presos. Há o ministro que assediava mulheres. Há os ministros que usam dinheiro público para construir estradas em suas fazendas.

Por que qualquer dessas coisas, e todas as outras iguais a elas, seria melhor do que as cadeiradas? Por que as mentiras ditas pelos candidatos a prefeito de São Paulo seriam piores que as mentiras ditas pelo presidente da República? Por que tantos eleitores não têm mais nenhuma paciência com os candidatos tidos como “sérios”? O Brasil bem pensante põe a culpa nas deficiências do eleitorado. Só está interessado no seu bem-estar pessoal. Não pensa num “projeto de país”. Fica vendo coisa na internet, em vez de ler e ouvir os analistas políticos. Pode ser. Se for, vai ser preciso importar de fora um outro eleitorado.

Via Revista Oeste

MAIS DO AUTOR

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui