segunda-feira, março 17, 2025
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Mulher troca EUA pela Espanha após tragédia familiar: “Ajudou a curar“

Maria Robertson-Justiniano levava o que descrevia como uma vida de “conto de fadas” com o marido e o filho em Chicago, nos Estados Unidos, com o futuro aparentemente traçado. Mas tudo mudou em 2018, quando seu marido, Alex, morreu de forma inesperada.

“Foi um choque absoluto”, conta Maria ao CNN Travel, explicando como a tragédia transformou completamente sua trajetória e levou ela e o filho a deixarem os EUA. “Não via como uma opção viável continuar lá”, acrescenta.

Perda devastadora

Quatro anos depois da morte de Alex, Maria se mudou para a Espanha com o filho Lucas, que na época tinha 14 anos.

Há três anos, mãe e filho vivem felizes em Valência, cidade natal da mãe de Maria. “Valência nos ajudou a curar [do luto]”, diz ela.

Maria, que nasceu no Reino Unido e cresceu no Canadá, sempre teve uma ligação com a cidade espanhola. Já havia passado longos períodos lá e até chegou a morar brevemente em sua juventude, mas nunca havia cogitado seriamente uma mudança definitiva.


Alex, marido de Maria, fotografado na praia com o filho
Alex, marido de Maria, fotografado na praia com o filho no sul da Espanha, faleceu em 2018 • Maria Robertson-Justiniano via CNN Newsource

Mesmo assim, sempre a considerou sua “segunda casa”. “Não importava onde eu morasse no mundo, Valência sempre vinha comigo”, acrescenta.

Em 1998, Maria deixou o Canadá para estudar na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, onde conheceu Alex.

O casal se casou em 2001, mudou-se para Washington, D.C., e teve o filho Lucas antes de seguir para Chicago, onde ambos investiram em suas carreiras.

“A vida em Chicago era tudo para nós”, relembra. “Nossos trabalhos iam muito bem, e tudo indicava que ficaríamos lá para sempre.”

“Você segue em frente e pensa: ‘Nossa, eu amo minha vida. Estamos vivendo algo tão bonito’”, diz ela.

“E, de repente, é como se uma bomba explodisse… E você fica ali, sem chão.”

Ao recordar aquele período “horrível”, Maria compara a sensação a um tsunami.

“Está tudo calmo, lindo”, descreve. “A maré recua. E então, do nada, uma onda gigante te arrasta. E você se pergunta: ‘E agora?’”

Nos dias e semanas após a morte de Alex, a comunidade de Evanston, em Illinois, onde viviam, se uniu para apoiar Maria e Lucas.

“O grupo de pais da escola do meu filho organizou um esquema para nos ajudar com refeições”, lembra. “Eles nos alimentaram por três meses.”

“Deixavam as refeições na minha porta com cartas, flores, bilhetes. Foi um apoio incrível.”

Maria admite que foi muito difícil deixar os amigos para trás, assim como seu trabalho como professora. Mas sentia que estava tentando seguir em frente com uma vida que, na verdade, não existia mais.

“Tudo me puxava de volta”, diz. “O Alex estava em todo lugar.”

Recomeço


valencia
Maria, que já havia passado muito tempo em Valência, diz que se mudar para a cidade espanhola foi como “voltar para casa” • Maria Robertson-Justiniano

Inicialmente, Maria planejava esperar até Lucas terminar o ensino médio. Mas, durante uma viagem à Espanha, em 2021, foi o próprio filho quem sugeriu que se mudassem de vez.

De volta aos Estados Unidos, Maria começou a planejar tudo. “Vendi minha casa”, conta. “Vendi meus móveis, pedi demissão e iniciei o processo de mudança e imigração para a Espanha.”

Mas a transição não foi simples. “Não foi um caminho linear”, explica. “Tiveram obstáculos… Mas eu pensava: ‘Foque no objetivo’.”

Ela acredita que existe uma visão muito romantizada sobre a mudança para a Espanha, como se “tudo fosse sol e mar”, mas a realidade é que o processo não é fácil.

A primeira casa que tentou comprar em Valência não deu certo. Além disso, não conseguiu obter o visto “golden visa”, um programa que permite que cidadãos de fora da União Europeia morem e trabalhem na Espanha por três anos – e que será encerrado em breve.

Felizmente, Maria já havia iniciado o processo para obter a cidadania espanhola enquanto ainda morava em Chicago.

“Foi um pesadelo”, diz Maria, acrescentando que ficou muito grata por já ser fluente em espanhol durante o processo, pois acredita que teria enfrentado muitas dificuldades se não fosse o caso. A cidadania saiu ainda naquele mesmo ano.

Quando ela e Lucas finalmente chegaram a Valência para começar a nova vida, Maria sentiu um alívio imenso.

“Foi como chegar à terra prometida…”, descreve. “A sensação foi incrível, como se eu tivesse terminado uma maratona.”

Nos últimos três anos, Maria e Lucas mergulharam na vida da cidade espanhola, e ela diz que estar em um ambiente diferente fez muito bem para ambos.

“Sinto que sou uma pessoa mais tranquila”, afirma Maria, destacando que tem feito muita terapia e trabalho pessoal nesses últimos anos.

“Quando Alex faleceu, eu estava treinando para o Ironman (uma prova de resistência)… Eu estava fora de mim. Só queria não pensar no que tinha acontecido.”

Ela acredita que estar longe do “epicentro da tragédia” permitiu que ela finalmente apertasse o botão de pausa.

“Acho que essa foi a maior mudança”, reflete. “Não viver mais nesse estado constante de luta ou fuga, o que pode ser útil se um leão estiver te perseguindo.”

“Mas não é sustentável. E acontece quando se passa por um trauma.”

Caminho de cura


Maria em Valência
Maria em Valência com seu cachorro Peanut • Maria Robertson-Justiniano via CNN Newsource

Embora tanto ela quanto Lucas sintam falta dos amigos nos Estados Unidos, Maria diz que os dois estão muito mais felizes em Valência.

“Ele abraçou a vida aqui, e isso faz toda a diferença”, conta. “Teria sido muito difícil se eu tivesse tomado essa decisão sozinha e ele não quisesse vir.”

Maria também acredita que Lucas está mais seguro na Espanha do que estaria nos EUA.

“Não preciso me preocupar com ele indo para a escola, e isso é uma grande preocupação para pais de crianças em idade escolar por lá”, diz.

“Aqui, as pessoas não andam armadas. E isso foi um grande incentivo.”

Ela reconhece que coisas ruins podem acontecer em qualquer lugar e cita que sua casa em Valência foi assaltada pouco depois da mudança.

Mas destaca que, nos Estados Unidos, “sentia a presença das armas” em certas situações e nunca conseguiu se sentir confortável com isso.

“Aqui, posso sair para correr às dez da noite no verão e não sentir que é tarde demais para estar na rua”, comenta.

Embora considere Valência acessível “dentro dos padrões americanos”, Maria ressalta que comparar preços quando se ganha um salário dos EUA não é justo.

Ela percebeu mudanças significativas na cidade nos últimos anos, principalmente no custo de vida, apontando que os preços dos imóveis dobraram e muitas coisas ficaram mais caras.

“As pessoas trabalham duro aqui, e os jovens muitas vezes precisam morar com os pais porque não conseguem se sustentar sozinhos”, diz Maria, enfatizando que a alta nos preços tem tornado a vida difícil para os moradores locais.

“Muita gente está lutando para se manter, especialmente no que diz respeito à moradia.”

Grandes mudanças


Valência
Desde então, ela fundou uma empresa de retiros de bem-estar e está também criando uma empresa de realocação para ajudar outras pessoas no processo de mudança para Valência • Arquivo pessoal/Maria Robertson-Justiniano

Maria também notou um grande aumento no número de estrangeiros em Valência. Ela lembra que, há 20 anos, era raro ouvir sotaques americanos nas ruas.

“Talvez houvesse turistas americanos”, comenta. “Mas agora é impressionante. Conheci tantos expatriados dos EUA. Há uma comunidade enorme. E tem café especial em cada esquina.”

Embora planeje continuar morando em Valência com Lucas, que estuda em uma escola americana, e o labrador da família, Peanut, Maria diz que, depois da perda de Alex, aprendeu a “não fazer mais planos.”

“Imagino minha vida aqui”, diz.

Apesar de às vezes sentir nostalgia da vida que deixou para trás, ela continua em contato com os amigos de Chicago e tem “uma longa lista de pessoas” querendo visitá-la.

“Acho que quando você muda de ambiente e está aberto a novas experiências, começa a enxergar as coisas de outra forma, com uma nova perspectiva”, acrescenta.

“Estar com minha família e ter esse suporte aqui foi incrivelmente curador. Além disso, conheci tantas pessoas que nunca teria conhecido se continuasse onde estava.”

Mesmo tendo vivido nos EUA e no Canadá por mais de duas décadas, Maria sempre se sentiu um pouco deslocada e nunca se identificou completamente com nenhum dos lugares.

“É difícil quando você vive em vários países”, reflete, admitindo que se sente mais conectada a Valência do que a qualquer outro lugar.

Há dois anos, Maria e uma amiga fundaram a By the Sea Retreats, uma empresa de retiros de bem-estar que organiza experiências em Valência e Sagunto.

“Passei a olhar mais para a saúde mental e o bem-estar”, diz. “Tenho muitos amigos nessa área e queria criar algo que realmente ajudasse as pessoas.”

Ela também está montando uma empresa de realocação, a Valencia Vibes Relocation, junto com uma equipe.

“Queremos tornar todo o processo de mudança para Valência mais simples e tranquilo para quem deseja vir para cá”, explica, acrescentando que adoraria ter tido esse tipo de suporte quando fez sua própria mudança.

De volta para casa


Maria
Maria fotografada na praia na cidade espanhola aos cinco anos de idade. “Voltar para cá me faz sentir como se eu tivesse reencontrado aquela garotinha na praia, que era tão feliz por estar na Espanha”, diz ela • Arquivo pessoal/Maria Robertson-Justiniano

Para quem está pensando em se mudar para a Espanha, Maria recomenda um bom planejamento e um entendimento realista sobre as diferenças entre as regiões do país.

“Nem toda parte da Espanha é ensolarada e quente”, alerta. “Se você for para o norte, por exemplo, vai pegar frio e muita chuva.”

“Então, se você busca sol e quer fugir do clima de Chicago, por exemplo, não vá para o norte da Espanha.”

Ela ressalta que uma mudança desse porte envolve riscos e pode trazer frustrações.

“É uma decisão enorme”, enfatiza. “Você está deixando uma vida para trás e mudando tudo… Então se prepare. E se prepare financeiramente.”

Apesar de não ter sido um caminho fácil, Maria acredita que a mudança abriu muitas portas e considera essa “a melhor decisão” que já tomou.

“Mudar de país é algo empolgante”, diz. “Por ter perdido meu marido, fui meio que empurrada para isso…”

E completa: “Mas algumas pessoas fazem essa escolha por outros motivos. E acho isso incrível, porque é uma oportunidade de aprender muito sobre si mesmo.”

Ela também diz que, ao passar a vida inteira no mesmo lugar, você é uma única versão de si mesmo. “Mas quando se muda para outro país e aprende um novo idioma, pode se tornar uma pessoa diferente”, afirma.

Fora do país, segundo Maria, é possível experimentar uma nova vida: “E isso é emocionante, porque suas possibilidades se expandem.”

Embora sua trajetória tenha tomado um rumo inesperado, Maria está animada com o futuro e sente que finalmente encontrou seu lugar.

“Sou imigrante”, diz. “Mas também tenho laços com este lugar. Então vejo isso como um retorno. Finalmente, estou em casa.”

Uma das fotos favoritas de sua infância foi tirada em uma praia de Valência, quando tinha cerca de cinco anos.

Ao olhar para essa imagem hoje, Maria sente que aquele foi o último momento em que sorriu genuinamente, de forma espontânea.

“Eu estava tão feliz naquela foto”, lembra. “E voltar para cá me fez reencontrar aquela garotinha na praia, que adorava estar na Espanha.”

“Todos os dias eu acordo e penso: ‘Como sou sortuda.’ E sou mesmo. Me sinto muito privilegiada por estar aqui.”

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Via CNN

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