Uma mulher condenada por forjar a morte do marido para receber pensão militar continua a ser beneficiada com o pagamento do benefício. O caso, revelado pelo portal Metrópoles, escancara brechas legais e práticas que custam milhões de reais ao orçamento público.
Em 2015, Dilcineth Guerreiro de Braga, então com 49 anos, apresentou ao Exército uma certidão de óbito do marido, o terceiro-sargento Gilmar Santos de Braga. O documento indicava que o homem havia morrido atropelado em Borba, interior do Amazonas.
O documento era verdadeiro, pois havia sido lavrado em cartório. O óbito, porém, era falso. O ex-militar permanece vivo até hoje.
Dilcineth recebeu um auxílio-funeral e passou a ganhar a pensão militar. O prejuízo inicial às forças armadas foi de R$ 60 mil, segundo o portal.
Um dos filhos do casal denunciou o golpe ao Exército. O pagamento foi bloqueado em julho de 2017.
Exército continua a pagar a pensão militar
Quatro anos depois, Gilmar Santos de Braga foi expulso do Exército e condenado pelo Superior Tribunal Militar por causa da fraude.
Depois da condenação, a mulher dele passou a receber pensão mensal de R$ 5,6 mil. O motivo: há uma legislação que equipara as cônjuges de militares excluídos ou condenados às viúvas.
A “morte ficta” permite que os familiares requisitem pensão do Estado, independentemente de qual crime os ex-militares tenham praticado para serem expulsos. Há pensões pagas às famílias de militares condenados por crimes como estupro e tráfico de drogas. O custo total desses benefícios chega a R$ 43 milhões por ano.
Crítica do TCU e brechas legais
O Tribunal de Contas da União (TCU) critica o pagamento de pensões por “morte ficta”. Uma auditoria concluiu que esse modelo resulta de interpretações legais ultrapassadas e contrárias à Constituição.
A área técnica do órgão afirma que o benefício pode estimular má conduta entre militares que não possuem requisitos para aposentadoria remunerada.
A situação de Dilcineth e Gilmar ilustra essas contradições. Desde 2021, o casal já recebeu R$ 240,1 mil em pensão. A análise do TCU reforça que esse benefício prejudica o equilíbrio do sistema previdenciário militar.
Segundo o processo, Gilmar planejou a fraude para enfrentar problemas financeiros e obter o seguro de vida, estimado em R$ 300 mil. Dilcineth conseguiu o falso atestado de óbito com a ajuda de terceiros.
Dilcineth confirmou ao Metrópoles que Gilmar está vivo, mas afirmou que ambos estão separados. Ela não comentou a condenação, e o ex-militar não se manifestou.
O que diz o Exército
Em nota, o Exército justificou o pagamento da pensão com base no Artigo 20 da Lei nº 3.765/1960, que concede o benefício a esposas de militares excluídos com mais de 10 anos de serviço.
A instituição afirmou que o TCU realiza auditorias internamente e destacou que a perda do direito à pensão ocorre apenas em casos específicos, como crimes que resultem na morte do instituidor.