Entre 2015 e 2023, o Tribunal de Justiça de São Paulo emitiu, em média, 187,5 mil penas de multa por ano. Apesar do alto volume, apenas cerca de 7,3 mil delas foram efetivamente pagas anualmente — o que representa menos de 4% de adimplência.
A maioria dessas multas é de pequeno valor. Dados do período analisado mostram que a maior parte das penas pecuniárias gira em torno de R$ 500. Até alguns anos atrás, esse tipo de sanção tinha pouca repercussão prática e não gerava entraves relevantes nos trâmites judiciais.
A cobrança, então sob responsabilidade da Procuradoria-Geral do Estado (PGR), ocorria por meio da Fazenda Pública e, em muitos casos, acabava sendo extinta, especialmente quando os valores não alcançavam 1,2 mil unidades fiscais — montante mínimo exigido para a execução fiscal, o que em 2025 equivale a R$ 44.424.
Mudanças no sistema de cobrança da Justiça

Mudanças ocorreram a partir de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2018 e 2019, acompanhadas pela aprovação do chamado pacote anticrime. A partir disso, a execução da pena de multa passou a ser atribuição primária do Ministério Público.
Assim, os processos passaram a permanecer abertos até a quitação do pagamento, o que acarreta a suspensão de direitos civis e políticos dos condenados. Contudo, o perfil socioeconômico dos atingidos pode ter relação com a baixa taxa de pagamento.
Relatório baseado em 241 casos acompanhados por instituições da sociedade civil mostrou que 80,7% das pessoas multadas se identificavam como negras, 72% não haviam concluído o ensino médio, 61,4% estavam desempregadas e 19% viviam em situação de rua. O dado reforça a percepção de que a aplicação da pena pecuniária atinge, em sua maioria, pessoas em maior condição de vulnerabilidade.
O Ministério Público de São Paulo discute internamente a possibilidade de deixar de executar multas de valor irrisório. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de 2023, estabeleceu que a alegação de hipossuficiência financeira, quando amparada por indícios ou falta de bens, pode levar à extinção da pena, salvo se houver prova concreta de capacidade de pagamento.
A avaliação de integrantes do sistema de Justiça, segundo o jornal Folha de S.Paulo, é de que, além do impacto social das cobranças, o custo processual envolvido na execução de valores baixos tende a ultrapassar o montante efetivamente recuperado.
Com isso, cresce a percepção de que, na prática, a pena de multa tem funcionado como uma sanção adicional. Isso porque ela prolonga os efeitos da condenação e dificulta a reintegração social dos atingidos.