A 16ª edição da Campus Party Brasil (CPBR16) recebe o primeiro Fórum do Marco Regulatório de Inteligência Artificial nesta semana, com o intuito de debater os desafios e as oportunidades do uso de inteligência artificial (IA) e promover a discussão do assunto na sociedade civil.
Em entrevista à CNN, o presidente de honra do Instituto Campus Party, Francesco Farruggia, destacou a importância de tratar o assunto no evento ao mesmo tempo em que a regulamentação da IA é discutida no Congresso Nacional: “É fundamental trazer a sociedade civil para dentro desse debate, senão se torna uma discussão apenas entre parlamentares, governo, indústria e big techs. E a sociedade civil fica de fora.”
Segundo ele, o Fórum do Marco Regulatório de Inteligência Artificial acontece nos mesmos moldes das discussões sobre o Marco Regulatório dos Direitos Civis da Internet, que também tiveram como palco a Campus Party entre os anos de 2010 e 2014.
“Como consequência disso, o Brasil foi o primeiro país no mundo a ter um Marco Civil da Internet, e, humildemente, a Campus Party contribuiu muito para que isso acontecesse rapidamente”, disse Farruggia, destacando que o objetivo é colocar o país novamente na vanguarda da discussão envolvendo IA.
Qual é a IA que nós queremos?
A programação do Fórum na Campus Party conta com palestras, mesas redondas, uma consulta pública aberta e a “Sala do Futuro da IA” — um ambiente onde as pessoas podem se juntar e debater sobre as oportunidades e os desafios trazidos pela IA.
Segundo Farruggia, todas essas atividades têm como objetivo responder a uma pergunta: qual é a inteligência artificial que nós, sociedade civil, queremos?
Para isso, ele também destaca a participação de especialistas, entidades e políticos internacionais. O Brasil precisa estar alinhado aos outros países nesta discussão, já que a tecnologia não tem fronteiras, defende.
“Como todas as big techs são internacionais, se o Brasil não estiver alinhado com a discussão global, ou você ilha o país ou tem que aceitar o que vem de fora”, acrescentou o especialista.
Encontrar meio-termo
A regulamentação do uso da inteligência artificial enfrenta diversos desafios.
Alguns deles esbarram em políticas públicas como: educação (para que as pessoas entendam o que é a IA, como usá-la e quais são seus direitos); trabalho (a criação de novos postos de trabalho e o desaparecimento de outros); investimento em tecnologia (para que exista a possibilidade do Brasil ter iniciativas nacionais de IA).
Outros têm a ver com o que as empresas podem ou não fazer usando IA, como a privacidade dos dados, o respeito à propriedade intelectual dos conteúdos que são usados para treinar o algoritmo e a qualidade e veracidade das informações geradas.
Além, é claro, da decisão sobre quem vai fiscalizar e punir o comportamento das empresas após essas regras terem sido definidas.
Para Farruggia, a regulamentação é necessária, mas é preciso encontrar o meio-termo: “Tem que ter ética, tem que ter uma finalidade democrática, mas, ao mesmo tempo, tem que existir liberdade criativa.”
“A IA é como tudo. Se você tem uma faca, você pode usá-la para cortar comida e comer ou para matar alguém. Tudo depende de existir uma lei que diga que se [você] matar alguém, [você] vai preso. Mas não dá para proibir a existência de facas”, argumentou.
A IA movimenta um mercado bilionário, repleto de interesses pessoais e empresariais, como lembrou o especialista: “Tem seres humanos por trás que programam o algoritmo, vivem disso, ganham grana com isso, tem poder e influência por causa disso. Não estamos falando de máquinas, estamos falando de gente de carne e osso e empresas que lucram com tudo isso.”
“Isso é uma discussão, como todas as regulamentações: política. Há lados que defendem a liberação total e a regulação total. O que, sim, é fundamental e inegociável é a participação da sociedade civil nessa discussão”, acrescentou.
Diálogo com o poder público
Ao final do primeiro Fórum do Marco Regulatório de Inteligência Artificial nesta edição da Campus Party Brasil, no sábado (13), um manifesto será redigido e divulgado com as conclusões do encontro.
Mais dez encontros serão realizados nos próximos três anos, em dez estados diferentes do Brasil. Cada um terá como resultado seu próprio manifesto. Ao final desse período, um documento final será redigido e entregue aos Três Poderes, como forma de reforçar a participação e a fiscalização da sociedade civil sobre o trabalho do poder público, que é quem define como a regulamentação da IA acontece na lei.
“É uma forma de dizer [ao poder público e às empresas]: nós estamos vendo e entendendo o que vocês estão fazendo. Vocês não podem fazer o que quiserem, não é só uma briga entre vocês, a sociedade civil também está aqui”, acrescentou Farruggia.