O Departamento de Sanidade Vegetal do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) reconheceu recentemente o Laboratório de Fitopatologia da Embrapa Mandioca e Fruticultura, da Bahia, como qualificado para emitir laudos para a verrugose dos citros.
A verrugose dos citros, uma doença fúngica, impede a exportação de limão tahiti para a União Europeia (UE) devido à restrição fitossanitária para Elsinoë spp., uma praga quarentenária naquele continente. Embora a Bahia e outras regiões brasileiras não tenham registros da doença, a ausência de um laudo de sanidade dificulta as exportações para a UE.
Desde abril, cerca de 200 amostras de produtores da Bahia, Sergipe e Minas Gerais foram beneficiadas pela proximidade do laboratório, que emite laudos de verrugose dos citros em até 10 dias, dependendo da demanda e dos sintomas nos frutos.
A Bahia é o quarto maior Estado produtor de limão no Brasil, ficando atrás somente de São Paulo, Minas Gerais e Pará, com exportações que totalizaram $ 34 milhões em 2023.
A verrugose, causada pelo fungo Elsinoë, afeta folhas, frutos e brotações em áreas produtoras de citros no mundo todo. A doença tem grande impacto econômico, pois as lesões na casca reduzem a comercialização dos frutos, especialmente para exportação.
Os sintomas da verrugose dos citros podem ser confundidos com os do cancro cítrico, uma doença bacteriana, também ausente na UE, mas presente em alguns estados brasileiros. A Bahia é livre do cancro cítrico desde 2017.
O pesquisador e fitopatologista Francisco Laranjeira, chefe-geral da Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA), explica que as semelhanças entre verrugose e cancro cítrico são apenas visuais.
“Verrugose é um fungo, já o cancro é causado por bactéria”, explicou Francisco. “O cancro ‘passa’ de um fruto para outro, pois a bactéria pode ficar na caixa e até mesmo na mão de quem pega o fruto. Já um fruto infectado com a verrugose não infecta o sadio, ainda que estejam na mesma caixa. Ele pode até passar esporos, mas não vai ter infecção porque a verrugose só infecta tecidos imaturos.”
Importância do laudo de verrugose dos citros para exportação de frutos cítricos
Com o reconhecimento para a produção do laudo de verrugose dos citros, o comércio com a União Europeia pode aumentar. Em 2023, o Brasil recebeu $ 139,3 milhões com a exportação de frutos de lima ácida, de acordo com o Observatório da Agricultura Brasileira.
Limões e limas são a quarta fruta mais exportada pelo país, atrás de mangas, melões e uvas, segundo a Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas).
O auditor fiscal agropecuário Caio César Simão, chefe da Divisão de Programas Especiais de Exportação do Mapa, confirma que a principal preocupação com as exportações de lima para a UE sempre foi o cancro cítrico.
“Mas, de 2021 para cá, eles começaram a interceptar muitos envios brasileiros com verrugose, que é uma praga quarentenária, ou seja, ausente lá”, afirmou. “Nós, pesquisadores, fiscais e produtores brasileiros, sempre tivemos muita dificuldade em encontrar esses sintomas de verrugose porque não é um problema na lima ácida. Então, começamos a realizar um monitoramento dos campos, um controle nosso maior, com apoio da Embrapa, com o objetivo de facilitar e manter a exportação.”
Intercepções e medidas adotadas
Entre janeiro e maio de 2024, 60 contêineres de lima ácida do Brasil foram devolvidos pelas alfândegas da UE. “Isso pode não ser tão prejudicial para o produtor individualmente, mas é muito ruim para o Brasil.
Em outras oportunidades, os mercados de cítricos da Argentina e da África do Sul já foram fechados. Por um problema parecido, a pinta preta, a nossa exportação de frutos de laranja para a Europa também acabou. Hoje só exportamos suco”, recordou Simão.
Na Bahia, os rechaços de cargas pelo Elsinoë spp. aumentaram de três em 2022 para sete em 2023, e 10 até junho de 2024, segundo o Mapa. “O aumento de interceptações não significa um aumento do problema na Bahia, mas um maior rigor da Europa em relação à detecção da praga”, sinalizou o pesquisador.
O laudo para verrugose passou a ser obrigatório. “É uma medida que o Mapa adotou para garantir a conformidade dos envios e não foi uma exigência da União Europeia”, esclareceu.
“A Europa não tem verrugose e não quer ter. Então, precisamos realizar um monitoramento para que o produtor possa aprimorar as práticas, a seleção e a amostragem”, acrescentou o representante do ministério.
Normas e estratégias de controle
Desde 2005, a Agência Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia (Adab) estabeleceu normas para evitar a introdução de pragas como cancro cítrico, verrugose, morte súbita dos citros, mancha preta e huanglongbing.
A fiscal estadual agropecuária Suely Xavier de Brito Silva, coordenadora do Projeto Fitossanitário de Citros da Adab, destaca que a portaria estadual proíbe o beneficiamento de frutos não produzidos na Bahia, como medida de segurança.
Sobre a verrugose em lima ácida, ela afirma que sua equipe nunca observou lesões em frutos: “Nunca foi nenhum problema porque não temos registro de dano econômico dessa praga para a citricultura no mundo, e não apenas no Brasil. Quando temos uma praga que não traz danos econômicos, podemos ter estratégias de controle, de convivência.”
Benefícios das análises da Embrapa
As análises realizadas pelo laboratório da Embrapa foram uma indicação da Adab ao Mapa. “Pensamos na quantidade de agricultores familiares que seriam beneficiados nesse processo, principalmente da Bahia”, declarou Suely Silva.
O laudo laboratorial emitido em nome da unidade de produção (UP) é válido por 30 dias e deve ser apresentado pelo produtor à Vigilância Agropecuária Internacional (Vigiagro) do Mapa, no porto, para certificação de exportação.
Segundo o Mapa, cada amostra deve conter, no mínimo, 20 frutos. Devem ser amostradas dois por cento das árvores de cada UP, coletando-se, no mínimo, um fruto com lesões de casca por árvore amostrada.
O laudo deve declarar explicitamente o número da UP da qual a amostra foi retirada. A coleta e o transporte das amostras ao laboratório são responsabilidade do produtor, como explica o engenheiro-agrônomo Leandro de Souza Rocha, supervisor do Setor de Gestão de Laboratórios da Embrapa Mandioca e Fruticultura e responsável pelo Laboratório de Fitopatologia.
“Depois de receber a amostra, fazemos o cadastro e iniciamos a avaliação. Todos os frutos são avaliados em lupa para verificar a presença de sintomas da verrugose”, relatou.
Leandro disse que, “se forem identificados os sintomas típicos, fazemos lâminas dessa parte afetada no fruto e analisamos em microscópio ótico para verificar se encontramos os sinais do fungo, que são os esporos conídios hialinos e de formato alongado”.
”Se identificadas as estruturas do fungo e validadas com base nas características morfológicas, a amostra é dada como positiva”, acrescentou o engenheiro-agrônomo.
Custos e medidas preventivas
Para o engenheiro-agrônomo e consultor em citros Gabriel Pedreira da Paixão, as análises da Embrapa ajudaram muito a cadeia produtiva da lima ácida tahiti da região. Ele destacou que custo do procedimento também é uma vantagem.
“O custo é cerca de quatro vezes menor que outros laboratórios devido ao método de análise morfológica realizado na Embrapa ser mais rápido, utilizar menos recursos e ser tão eficiente quanto o método PCR [técnica da biologia molecular que amplia uma região específica de DNA]”, salientou.
Francisco Laranjeira alertou que algumas atitudes tomadas ainda no campo podem afastar a contaminação de frutos pela verrugose:
- A pulverização, no momento certo, com produtos adequados e registrados no Mapa
- Monitoramento da área para retirada de material com sintomas e correto descarte
- Orientação à equipe de colheita para separação de frutos suspeitos.
Ainda segundo Gabriel Pedreira, o packing house, o maior cuidado deve ser com a pré-seleção dos frutos. “Em todas essas etapas, os produtores podem contar com a transferência de tecnologias da Embrapa, como os tratos culturais, o sistema de produção e, inclusive, a capacitação dos auxiliares e técnicos do campo, como os pragueiros”.
“Não existe variedade resistente à verrugose, mas todas essas tecnologias são úteis para se ter uma boa produção com menor risco de ocorrência da doença”, acrescentou o especialista.