Na última quinta-feira, 4, o Brasil se absteve de votar a resolução do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU) para prorrogar a investigação sobre abusos do Irã contra os protestos depois do assassinato da jovem Mahsa Amini, em 2022, devido ao uso incorreto do véu islâmico.
Em editorial publicado nesta segunda-feira, 8, a Folha de S.Paulo classificou a postura do governo Lula neste caso de mais um “vexame diplomático”.
Apontando para o fato de o Itamaraty não parecer se esforçar o suficiente para superar os embaraços na área, desencadeados principalmente pelas declarações do presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva sobre Venezuela, guerra Israel-Hamas e Ucrânia, o texto ressalta que tais falas representam “a faceta personalista do problema”.
Conforme a Folha, o Ministério das Relações Exteriores não tem tratado com a devida gravidade as violações aos direitos humanos perpetradas pelo Irã e pela Rússia.
A justificativa do Itamaraty para a “vergonhosa” abstenção do voto na ONU foi a de que o Irã estaria intensificando “esforços para melhorar a situação de direitos humanos no país”.
Entretanto, desde a criação da missão da ONU para investigar os abusos cometidos pelas forças iranianas, em novembro de 2022, ela foi rejeitada pelo regime teocrático do Irã, indicando que as violações dos direitos humanos no país estão longe de acabar.
Em sua crítica ao governo Lula e sua postura de neutralidade sobre um tema grave, o editorial destaca que um ano após a morte de Amini, o Parlamento iraniano endureceu a lei contra as mulheres que não usam o véu, resultando em 500 mortes, incluindo 70 menores, centenas de feridos e prisões durante os protestos.
Governo Lula: na contramão do discurso pelas minorias
O jornal também critica a postura do Brasil em relação à extensão do prazo da comissão que investiga crimes de guerra praticados pela Rússia na Ucrânia. O editorial chama a atenção para o fato de que, na prática, o governo petista de Lula vai na contramão das bandeiras humanitárias e em defesa das mulheres que levanta.
“Assim, o Itamaraty não apenas contraria o discurso petista de defesa das minorias como se opõe a princípios humanistas e civilizatórios que deveriam nortear a posição do Brasil no âmbito global”, conclui a Folha.
Relembre a morte de Mahsa Amini
Em 16 de setembro de 2022, Mahsa Amini, de 22 anos, morreu em Teerã, capital do Irã, depois de três dias presa pela Patrulha de Orientação, uma polícia de moralidade, por não usar um véu corretamente.
Esse esquadrão, do Comando de Aplicação da Lei da República Islâmica do Irã, supervisiona a implementação pública dos regulamentos do hijab, que obriga mulheres e meninas a cobrirem seus cabelos e corpos.
Amini era de Sanghez, uma pequena cidade em uma província curda no noroeste do Irã, sob custódia dessa polícia de moral do país.
Relatos de testemunhas afirmaram que ela foi espancada durante sua prisão, enquanto seu pai disse que a jovem sofreu hematomas nas pernas e responsabilizou a polícia por sua morte.
Os protestos
A morte de Amini desencadeou protestos que duraram meses em todo o país sobre o tratamento das mulheres e as péssimas condições de vida no Irã.
Mulheres e meninas retiraram seus lenços em desafio e exigiram o fim do governo da República Islâmica. Os líderes clericais assumiram o poder em 1979.
A revolta recebeu o nome de “movimento Mahsa”. De acordo com grupos de direitos humanos, as forças de segurança iranianas responderam como uma repressão violenta, matando pelo menos 500 manifestantes, incluindo crianças e adolescentes. Até mesmo os parentes dos que estiveram nos protestos tornaram-se alvos.
É com relação a prorrogação das investigações da ONU com relação a esses abusos que o governo Lula preferiu lavar as mãos ao se abster de votar.