O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva liberou neste ano R$ 7,7 bilhões em “emendas Pix”, com metade do valor (R$ 4,25 bilhões) sendo paga antes das eleições municipais, que irão ocorrer em outubro. A falta de transparência sobre o uso desses recursos dribla a legislação eleitoral e decisões do Tribunal de Contas da União (TCU).
As emendas Pix surgiram para transferir recursos federais a Estados e municípios a pedido de senadores e deputados federais. Esses repasses se dão sem destinação específica antes de qualquer projeto, dificultando a fiscalização e uso correto dos fundos.
Nesta quarta-feira, 26, o governo federal se comprometeu a repassar R$ 4,25 bilhões até 5 de julho, informa o jornal O Estado de S. Paulo. Esse valor pode aumentar, pois algumas emendas ainda não foram empenhadas. Já foram R$ 232,5 milhões a cidades em calamidade pública, como algumas no Rio Grande do Sul.
A legislação eleitoral proíbe emendas três meses antes das eleições, exceto para obras em andamento. As emendas Pix, no entanto, contornam essa regra, permitindo gastos durante a campanha, o que não ocorre com outros recursos.
Indefinição do uso das “emendas Pix”
Os parlamentares preenchem o Orçamento da União sem especificar o uso dos recursos, deixando prefeitos e governadores livres para decidir. A lei exige que 70% seja para investimentos, mas isso nem sempre ocorre, especialmente em ano eleitoral.
Em janeiro, o TCU exigiu maior transparência no processo. A Corte determinou que municípios informem para onde irá se destinar o dinheiro em uma plataforma pública em até 60 dias. O governo federal regulamentou os repasses, mas deixou de fora as recomendações do TCU e da Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Nos bastidores do poder, autoridades afirmam que é impossível cumprir todas as exigências da lei. A plataforma para processar os documentos ainda não oferece a transparência necessária. Até agora, liberou-se o valor de R$ 21 bilhões em cinco anos.
Desigualdade na distribuição
Desde janeiro, 906 emendas foram indicadas por 523 parlamentares, cobrindo 88% do Congresso Nacional. No entanto, metade do valor concentra-se em apenas 10% dos municípios brasileiros, beneficiando 554 cidades.
As emendas Pix cresceram depois de o Supremo Tribunal Federal declarar o orçamento secreto inconstitucional. Dos mais de 900 repasses, apenas cinco contêm alguma informação sobre o uso do dinheiro, que não é acessível publicamente.
Os recursos foram usados para financiar shows sertanejos, compras caras de asfalto e até brinquedos em cidades com grandes repasses. A falta de exigência de aplicação em investimentos públicos facilita esse uso irregular.
“As emendas Pix são piores que o orçamento secreto”, afirma a diretora-executiva da organização não governamental Transparência Brasil, Juliana Sakai. “Vamos ver uma série de orçamentos direcionados para alguns municípios para usarem como bem quiserem justamente em um momento de eleição, o que torna ainda mais grave a falta de transparência e piora a qualidade do gasto público.”
Preenchimento genérico
Neste ano, os parlamentares precisaram indicar áreas de uso dos recursos na plataforma do governo, como urbanismo, saúde e educação, mas não há obrigação de seguirem essa indicação. A informação é genérica e não especifica obras ou projetos.
“Nos últimos anos, no Brasil, as emendas tomaram uma dimensão desproporcional”, avalia a secretária do Planejamento, Virgínia de Ângelis. Ela quer vincular as emendas ao Plano Plurianual, mas a emenda Pix escapa dessa vinculação. “E, por vezes, até com mecanismos que inviabilizam a transparência e a prestação de contas, como no caso das chamadas emendas Pix.”