A menos de um ano das eleições municipais, o governo federal promulgou uma lei que permite retomar mais de 11 mil obras paradas em saúde e educação em diversos municípios de Norte a Sul do país. Os valores para retomada de construção e reformas de escolas, hospitais e Unidades de Pronto-Atendimento, entre outros, serão destinados dos orçamentos do Fundo Nacional da Educação Básica (FNDE) e do Sistema Único de Saúde (Sus).
A lei 14.719/23, que institui o Pacto Nacional pela Retomada de Obras e de Serviços de Engenharia Destinados à Educação Básica e Profissionalizante e à Saúde, é um mecanismo fora do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e permite que o governo possa injetar recursos extras nos municípios em ano eleitoral.
Segundo o FNDE, ficarão à disposição dos prefeitos aproximadamente R$ 6 bilhões até 2026. A saúde não informou qual o montante destinado a esses empreendimentos. São 5,6 mil obras na área da educação e 5,5 mil na de saúde.
No entanto, os valores só serão repassados quando as pastas editarem normas específicas para que os gestores municipais possam pedir os recursos. Fontes ouvidas pela reportagem afirmam que os textos sairão ainda este ano para que os prefeitos possam pedir já no começo do ano que vem.
O debate sobre a manutenção de obras de infraestrutura está relacionado com a meta de déficit fiscal zero em 2024 e a pressão sobre a liberação de recursos para obras em ano eleitoral, quando serão eleitos prefeitos e vereadores nos municípios brasileiros.
A equipe econômica defendia a meta que busca um equilíbrio entre receitas e despesas. Para cumprir esse compromisso, pode ser preciso desacelerar investimentos, o que pode comprometer o andamento de obras.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no entanto, defende que a meta “não precisa ser zero”, mirando os executivos municipais.
Nessa linha, no começo do mês, em reunião ministerial, o presidente determinou aos subordinados que “sejam os melhores gastadores de dinheiro em obras para o povo brasileiro”.
O mestre em ciência política e especialista em relações institucionais e governamentais na agência Inteligov Gabriel Barreto, aponta que, em 2020, o PT teve seu pior desempenho em eleições municipais desde 1996 e não elegeu gestor em nenhuma capital. Segundo o especialista, com a eleição de Lula, aumentar a capilaridade do partido se tornou prioridade para 2024.
“Dois fatores contribuem para concretizar este objetivo: um é a atração dos prefeitos pelo partido do presidente – aliados podem se beneficiar do direcionamento de dinheiro federal, que é especialmente estratégico em anos eleitorais, como o próximo. O outro é a atuação do Governo para intensificar essa tendência, aumentando a disponibilidade de recursos para os prefeitos.
Essa aproximação com os municípios se dá por meio de iniciativas como a Caravana Federativa, que promove integração entre gestores locais e nacionais. O flanco foi fortalecido ainda mais com a sanção da que visa retomar obras paradas na saúde e educação”, disse.
O especialista ainda lembra que a eleição de prefeitos desemboca nas eleições federais de 2026, para deputados e senadores. “Porque eles são as pessoas que estão ali em contato direto com o eleitor, que conhecem os problemas, que têm mais influência política no direcionamento do voto”, destacou.
Segundo o analista Matheus Albuquerque, sócio da Dharma Politics , em termos políticos, a normativa atende a dois propósitos principais: aprimorar a relação entre a esfera federal e municipal e dar maior impacto às ações do governo e de seus aliados visando as eleições municipais de outubro de 2024.
Ele pondera, no entanto, sobre a preocupação da equipe econômica com o equilíbrio das contas públicas. “A equipe econômica de Lula deve manter atenção à agenda fiscal, especialmente considerando o desejo de [Fernando] Haddad de zerar o déficit em 2024. Estima-se que a retomada demandará um investimento de R$ 6,2 bilhões até 2026, sendo R$ 4 bilhões destinados a obras municipais. Nesse contexto, observa-se que o ímpeto desenvolvimentista de Lula supera a busca de Haddad pelo controle das contas públicas”, frisou.
A proposta também permite um novo aporte de recursos mesmo se o valor original tiver sido todo repassado, mesmo se a obra possua indícios de irregularidades. No caso de obras que não tenham recebido todos os valores, será feita uma repactuação, corrigido pelo Índice Nacional do Custo da Construção (INCC), e o montante a ser enviado poderá chegar a mais de 200%, dependendo do ano de início da obra.
Os empreendimentos terão 24 meses para serem concluídos, podendo ser prorrogada por igual período, e há previsão de orçamento suplementar caso os valores sejam insuficientes para atender a demanda regional.
Para priorizar as obras, serão observados critérios como percentual de execução, ano de contratação, se a instituição atende comunidades rurais, indígenas ou quilombolas, se o Município sofreu desastres naturais nos últimos dez anos e outros critérios.
O doutor em direito público e sócio do escritório Fenelon Barretto Rost Ricardo Barretto, aponta que os novos recursos serão transferidos após assinatura de um novo termo de compromisso e abrangem a correção dos valores correspondentes à parte não executada.
Ele explica que o projeto também poderá conter modificações, podendo corrigir falhas ou adaptar às novas necessidades das áreas de saúde e educação.
Na priorização de obras, serão observados critérios como percentual de execução, ano de contratação ou se o município sofreu desastres naturais nos últimos anos.
Obras que possuam irregularidades também poderão ser retomadas, desde que não haja prejuízo à apuração futura da responsabilidade por quem tenha causado anteriormente dano ao erário.
“Quando uma obra paralisada ou inacabada está sob auditoria da CGU ou do TCU, a tendência é que os gestores públicos se retraiam e abandonem quaisquer iniciativas para a conclusão dos serviços. Portanto, a regra é positiva porque dá segurança jurídica para a retomada das obras que estejam sob fiscalização”, destaca.
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