O Cerrado corre perigo em várias frentes: ultrapassou a Amazônia como bioma mais devastado do Brasil e enfrenta seu pior momento em sete séculos, com secas devastadoras. As queimadas também acometem a vegetação, mas podem ter efeito positivo. É isso que mostrou um estudo publicado em maio no Plant Ecology.
É importante ressaltar que o Cerrado enfrenta queimadas espontâneas e que as queimadas por ação humana não são positivas. No entanto, a pesquisa se debruçou sobre o efeito da fumaça liberada por elas na germinação ou na inibição do desenvolvimento de plantas na região.
Pesquisa é o maior levantamento sobre os efeitos da fumaça das queimadas no Cerrado
Segundo a Agência FAPESP, as plantas do Cerrado evoluíram ao longo de milhares de anos diante da presença de queimadas espontâneas.
Estudos anteriores já haviam investigado o efeito da fumaça sobre algumas espécies do bioma. O levantamento atual analisou 44 espécies típicas do Cerrado, sendo o mais completo já realizado sobre a região.
De acordo com Rosana Marta Kolb, professora da Universidade Estadual Paulista (UNESP) que orientou o estudo, feito pelo doutorando Gabriel Schmidt Teixeira Motta, a pesquisa analisou espécies do estrato herbáceo-arbustivo do bioma, envolvendo gramíneas, outras ervas (não gramíneas), subarbustos e arbustos.
Queimadas no Cerrado podem ter efeito positivo
- A fumaça causada pelas queimadas espontâneas contém centenas de substâncias, algumas que favorecem e outras que prejudicam a germinação de sementes das espécies do Cerrado;
- As carriquinas são as mais conhecidas. Elas interagem com os hormônios das plantas para promover a germinação de certas sementes e inibir outras;
- Kolb explicou que a fumaça gasosa das queimadas envolve variantes difíceis de replicar e, por isso, o estudo utilizou “água de fumaça” disponibilizada comercialmente;
- Ela tem efeito equivalente ao da chuva depois da queimada e pode ser facilmente replicada;
- Eles usaram duas concentrações da fumaça nos testes: 2,5% e 5%.
Nem todas as sementes responderam ao estudo
A pesquisa estudou o efeito individual de cada concentração de fumaça em cada uma das 44 espécies, sem se preocupar com a definição de estratégias de manejo de cada uma. Eles estabeleceram que as sementes que reagiram bem à fumaça podem ser plantadas em áreas que passaram por queimadas. Já as que não reagiram bem, não.
Das 44 espécies, 14 (32%) apresentaram aumento na germinação diante da fumaça, com variações dependendo da concentração. Quatro espécies (9%) apresentaram redução na germinação (principalmente na concentração de 5% da fumaça).
Para a orientadora, esses resultados mostram que a fumaça das queimadas pode atuar como estímulo para algumas espécies do Cerrado, oferecendo vantagem competitiva no ambiente pós-fogo.