Uma pesquisa recente, noticiada pelo Olhar Digital, está mudando a forma como entendemos as placas tectônicas que compõem o fundo do oceano da Terra. Diferentemente da visão tradicional de que essas placas seriam rígidas e uniformes, os pesquisadores descobriram grandes falhas na placa do Pacífico, revelando um cenário mais dinâmico e complexo do que se imaginava.
Essas falhas, encontradas a vários milhares de metros de profundidade e com centenas de quilômetros de extensão, surgem devido a forças internas enormes que puxam a placa para o oeste. Um sismólogo da Universidade de São Paulo (USP), entrevistado pelo programa Olhar Digital News (assista aqui), revela se isso pode aumentar o número de terremotos na região.
Vamos relembrar a pesquisa:
- Os resultados do estudo, detalhados em um artigo na revista Geophysical Research Letters, são fruto do trabalho de uma equipe internacional de cientistas, incluindo Erkan Gün, bolsista de pós-doutorado, e o professor Russell Pysklywec, da Universidade de Toronto, no Canadá;
- Essas falhas submarinas estão localizadas em extensos platôs subaquáticos formados há milhões de anos, onde a rocha derretida do manto emergiu para criar o fundo do oceano;
- Contrariando a expectativa de que esses platôs mais espessos deveriam ser mais fortes, os modelos e dados sísmicos indicam que eles são, na verdade, mais frágeis.
Segundo Bruno Collaço, sismólogo do Centro de Sismologia da USP, em entrevista ao programa Olhar Digital News, a teoria das placas tectônicas é muito recente, surgida em 1915, por isso o campo ainda é tão pouco explorado.
“Nós conhecemos muito mais sobre os outros planetas do que sobre a própria Terra”, afirma Collaço. “O furo mais profundo que já fizeram na Terra chegou a 13 km, sendo que o raio do planeta é de 3.400. Então, a gente tem uma dificuldade muito grande de conhecer o interior da Terra”.
Especialista explica dinâmica das placas tectônicas
Collaço explica que temos dois tipos de crostas: a oceânica e a continental. “A continental é a mais grossa, chegando perto de 40 km de espessura. E a oceânica tem por volta de 8 km. Esses dois tipos de crosta compõem a superfície das chamadas placas tectônicas, cujo nome técnico é placas litosféricas, porque elas compreendem toda a litosfera da Terra, com parte da crosta e do manto terrestre superior”.
O especialista continua, explicando que essas placas estão em constante movimento. “Já é de conhecimento que nas zonas de subducção, como a placa de Nazca que entra por baixo da placa sul-americana, no Chile, formando os Andes, as placas se deformam durante o contato. Isso já era de conhecimento, essas deformações nas bordas das placas, principalmente nas zonas de subducção”.
Segundo Collaço, o que o estudo recente traz de novidade é que as deformações também ocorrem nas áreas mais internas das placas, não só nas bordas.
“Nós achávamos que a placa oceânica era totalmente rígida e vinha a se deformar nas bordas, e esse estudo traz que ela também tem deformações no interior. Então, algumas cadeias montanhosas que estão sob as águas, zonas mais fracas da placa oceânica, são as áreas que mais sofrem deformação ou estiramento, como acontece quando puxamos um elástico com os dedos e o meio vai se afinando”.
Puxando uma toalha de mesa
Collaço comparou com esticar uma toalha de mesa. “A gente começa a puxar as bordas dessa toalha, e essas bordas se deformam. Mas, conforme revela o novo estudo, o meio do tecido também sofre deformações nesse processo. Ou seja, existe fragilidade da crosta oceânica não só nas bordas, e é isso que essa pesquisa diz”.
Segundo ele, isso não vai mudar o conhecimento da sismicidade, ou seja, o número de terremotos que aconteceram até então vai continuar acontecendo. “O que muda é o nosso entendimento sobre isso. Então, embora esse estudo ainda esteja sendo debatido, ele pode explicar muita coisa, como, por exemplo, os tremores que ocorrem no interior das placas, chamados tremores intraplacas. São eventos muito difíceis de explicar. Os mais fáceis de explicar acontecem nas bordas. E essa nova descoberta poderia ajudar a entender”.
A pesquisa de Gün e Pysklywec focou em quatro platôs no Oceano Pacífico Ocidental, usando modelos de supercomputadores e dados coletados nas décadas de 1970 e 80. Os cientistas esperam que a atenção gerada por suas descobertas leve a mais pesquisas e coleta de dados para entender melhor esses fenômenos.
Ao desafiar a teoria tradicional das placas tectônicas, essa nova compreensão mostra que há mais mistérios sobre a dinâmica da Terra do que se pensava.