sábado, setembro 28, 2024
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Exoplanetas podem conter mais água do que se imaginava, diz estudo

Um estudo publicado recentemente na revista Nature Astronomy pode modificar a forma como cientistas pesquisam exoplanetas. Hoje, pesquisadores buscam esses mundos extrassolares exclusivamente com base no paradigma terrestre: planeta com um núcleo de ferro envolto por um manto de rochas silicáticas e a presença de água (oceanos) na superfície.

“Foi somente nos últimos anos que começamos a perceber que os planetas são mais complexos do que pensávamos”, diz Caroline Dorn, professora de exoplanetas na Escola Politécnica Federal (ETH) de Zurique na Suíça que, em colaboração com Haiyang Luo e Jie Deng da Universidade de Princeton, nos EUA, pesquisou a distribuição de água nos exoplanetas.

Rever a distribuição da água faz todo sentido porque o ciclo hidrológico, tanto na superfície quanto no interior, influencia essencialmente as propriedades dos planetas. Assim, é preciso levar em conta que, na maioria dos mundos externos ao nosso Sistema Solar, a dispersão hídrica segue coeficientes de partição que desconhecemos em condições extremas.

Diferentemente da Terra, a maioria dos exoplanetas conhecidos ainda não passou pelo resfriamento necessário para a formação de um manto sólido composto por silicatos. A grande proximidade com suas estrelas produz vastos oceanos de magma, nos quais a água apresenta uma alta solubilidade, enquanto compostos, como o dióxido de carbono, se separam da fase líquida e sobem para a atmosfera.

Viagem da água ao núcleo dos planetas

Impressão artística do planeta K2-18b, cohecido por hospedar água.
Representação artística do planeta K2-18b, cohecido por hospedar água. • ESA/Hubble, M. Kornmesser

Sabendo que o núcleo de ferro fica no centro dos planetas e que, acima dele, há uma camada de silicatos fundidos (o manto), a questão principal da pesquisa foi saber como a água é distribuída entre essas duas camadas. Uma vez que a observação direta desses mundos distantes é impossível, os autores usaram princípios físicos bem estabelecidos para criar simulações computacionais.

As modelagens foram feitas em duas etapas principais. Na primeira, usaram uma técnica chamada “dinâmica molecular ab initio” para simular como a água se comporta quando está em contato com metal e silicato sob pressões extremamente altas. O objetivo é calcular como o líquido se distribui entre essas duas camadas.

A partir desses resultados, a equipe realizou modelagens capazes de mostrar como a presença da água afeta três aspectos planetários: a densidade das camadas, a temperatura de fusão das rochas e, finalmente, a forma como a água se distribui.

As apurações sugerem que mundos maiores e mais massivos provavelmente retêm quantidades significativas de água em seus núcleos, diz um comunicado de imprensa.

Como a água é sequestrada para o interior dos planetas?

Na verdade, a água não é sequestrada durante a formação dos planetas, mas se combina com as gotículas de ferro que estão presentes na sopa de magma, antes que o núcleo seja formado. Segundo Dorn, “as gotículas de ferro se comportam como um elevador que é transportado para baixo pela água”.

Esse comportamento, que só era conhecido no caso de pressões moderadas, parecidas com as da Terra, foi mostrado no novo estudo em condições internas de pressões mais elevadas. “Quanto maior o planeta e maior sua massa, mais a água tende a ir com as gotículas de ferro e se integrar ao núcleo”. Em alguns casos, diz a professora, o ferro consegue absorver até 70 vezes mais água do que os silicatos.

Essa água, no entanto, pode existir em estados da matéria muito diferentes dos que estamos acostumados em nossa planeta. Submetida a pressões muito elevadas no núcleo, o líquido deixa de assumir a forma de moléculas de H2O, continuando a existir em seu elementos constituintes, porém em formas iônicas ou em algum estado exótico da matéria.

A ideia da existência de água em núcleos planetários foi inspirada em uma pesquisa, realizada em 2020, que avaliou o conteúdo de água na Terra. Além de concluir que os nossos oceanos atuais representam apenas uma pequena fração da água total do planeta, as simulações realizadas estimaram uma quantidade de água armazenada no interior do planeta equivalente a mais de 80 oceanos.

Quais as implicações práticas do estudo sobre a distribuição da água?

Exoplaneta TOI-270d coberto de oceanos em ebulição acima dos 100°C. • NASA

Como, segundo Dorn, “os planetas são muito mais abundantes em água do que se supunha anteriormente”, essa descoberta pode ter um impacto direto nas medições feitas por astrônomos, para verificar o peso e o tamanho de um exoplaneta. Se, ao fazer diagramas de massa-raio para inferir sua composição e estrutura interna, ignorarem a solubilidade e a distribuição da água, o volume real do líquido pode ser subestimado em até dez vezes, alerta a geofísica.

Outra implicação importante da distribuição de água é sobre o seu volume dissolvido no oceano do manto. Diferentemente da água que afunda para o núcleo, e lá permanece para sempre, essa água do manto pode desgaseificar e subir à superfície quando essa camada intermediária esfria. A informação, que tem sido pesquisada há dois anos pelo Telescópio Espacial James Webb, poderá agora ser relacionada com as profundezas internas dos planetas, diz Dorn.

Um dos primeiros objetivos de estudo dos autores da pesquisa atual será o exoplaneta conhecido como TOI-270d, identificado em março deste ano. Conforme Dorn, “foram coletadas evidências ali da existência real de tais interações entre o oceano de magma em seu interior e a atmosfera”.

Finalmente, na questão da habitabilidade, o estudo atual apresenta uma nova visão sobre a potencial existência de vida em Superterras abundantes em água. O entendimento atual é que, por formarem estruturas cristalinas de gelo exótico, sob alta pressão e temperatura, esses mundos não poderiam abrigar vida. O conceito muda agora com o novo estudo, já que a maior parte da água desses gigantes rochosos está teoricamente presa no núcleo.

Exoplanetas: o que são e como são descobertos?

Via CNN

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