Uma rápida pesquisa no Google ou no YouTube revela que há um hotel seis estrelas em Doha, no Catar, e até um sete estrelas em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. O Brasil não fica imune: o Rosewood São Paulo e o Palácio Tangará, ambos na capital paulista, são descritos por parte da imprensa como hotéis seis estrelas por conta de seu luxo e pompa.
Porém, hotéis acima de cinco estrelas realmente existem? Oficialmente, a resposta é não. Como então funciona a classificação dos hotéis? Para esta pergunta, a resposta é: depende.
Isso porque, em linhas gerais, não há uma padronização universal para a classificação de propriedades hoteleiras, ou seja, cada país adota ou não algum tipo de classificação. O sistema de estrelas é o mais conhecido e adotado para ajudar a definir um empreendimento.
Historicamente, tal sistema rotula hotéis de uma a cinco estrelas. Quanto maior o número de estrelas, mais infraestrutura, o que muitas pessoas podem chamar de luxo.
Classificação de hotéis no Brasil
Implementado em 2012, o Sistema Brasileiro de Classificação de Meios de Hospedagem (SBClass) foi suspenso em 2016. Em parceria com o Inmetro, ele era usado pelo Ministério do Turismo para dar estrelas a sete tipos de empreendimentos: hotel, hotel fazenda, cama e café, resort, hotel histórico, pousada e flat/apart-hotel.
Os negócios que desejassem ter a distinção deveriam atender certos requisitos, em que eram analisadas condições de infraestrutura, equipamentos, serviços e práticas de sustentabilidade.
Um resort, por exemplo, era avaliado em quatro ou cinco estrelas. Para se ter uma ideia, o de cinco estrelas deveria ter três piscinas, três bares e três restaurantes, um deles com cozinha regional ou típica, assim como um mínimo de seis serviços acessórios (como locação de carros, salão de beleza, serviço de babá disponível, etc) e uma série de outros requisitos.
Ao CNN Viagem & Gastronomia, a Assessoria de Comunicação Social do Ministério do Turismo informou que, atualmente, a pasta tem trabalhado para aperfeiçoar a metodologia de classificação de hotéis em conjunto com o Conselho Nacional de Turismo (CNT). Por enquanto, o consumidor é informado se um empreendimento é apenas um hotel, pousada ou albergue. Na visão do ministério, eles são descritos como:
- Hotel: estabelecimento com serviço de recepção, alojamento temporário, com ou sem alimentação, ofertados em unidades individuais e de uso exclusivo dos hóspedes, mediante cobrança de diária;
- Pousada: empreendimento de característica horizontal, composto de no máximo 30 unidades habitacionais e 90 leitos, com serviços de recepção, alimentação e alojamento temporário, podendo ser em um prédio único com até três pavimentos, ou contar com chalés ou bangalôs.
Já os albergues passarão a ser reconhecidos como meio de hospedagem com a nova Lei Geral do Turismo, sancionada em setembro. “As discussões para o reconhecimento de novos prestadores de serviços turísticos, a exemplo dos albergues, serão iniciadas ainda neste ano no âmbito do Comitê Consultivo do Cadastur (Cadastro Nacional de Prestadores de Serviços Turísticos)”, diz o Ministério do Turismo.
Clientela dá a palavra final
“A rigor, quem te classifica é seu hóspede”, afirma Celso Valle, diretor geral do Palácio Tangará. Um índice de satisfação dos hóspedes é utilizado pelo hotel para avaliar estrutura e serviços, sendo referência para qualidade e melhorias.
“Após o check-out, todo hóspede recebe um questionário de 10 perguntas para que avalie a experiência. Essa é a nossa grande classificação, com perguntas sobre os quartos, os restaurantes e a música, por exemplo. É bem objetivo para que mais pessoas respondam”, diz Celso.
Para o diretor, o custo-benefício também é levado em conta. “A pior situação é quando você cobra caro e o cliente sai insatisfeito, ou seja, a relação custo-benefício não vale a pena”, categoriza.
Desde que foi aberto em 2017, o Palácio Tangará nunca se autointitulou como seis estrelas. “Tal classificação não atrapalha, mas coloca um ponto de interrogação na cabeça dos clientes. Não sabemos definir essa avaliação porque ela não existe. Se eu colocar torneiras de ouro aqui, vamos ter sete estrelas? O que eu preciso para ter oito estrelas? Vai caindo na subjetividade”, defende o diretor.
Seis estrelas virou um superlativo para dizer que você é diferenciado. Dentre os de luxo, você é mais luxuoso ainda. Isso não atrapalha, isso aumenta a expectativa do cliente e aumenta nossa responsabilidade de superá-la
Celso Valle, diretor geral do Palácio Tangará
Além do questionário direcionado aos hóspedes, o hotel paulistano contrata uma inspeção privada para garantir uma “opinião isenta”, como explica o diretor. Ela é feita pela Leading Quality Assurance (LQA), consultoria internacional que dá pontuações e que segue critérios objetivos.
“Temos duas inspeções por ano, com relatório de 80 páginas. É bem denso e você tem em mãos indícios do que fazer e como fazer. É avaliado, por exemplo, o tempo aceitável entre um pedido e um prato do restaurante, assim como o atendimento pessoal e até a parte técnica”, diz Celso. Redes como Belmond, Cheval Blanc e Four Seasons também são clientes da LQA.
Classificações ao redor do mundo
Em resumo, a classificação de empreendimentos turísticos de um país visa padronizar a qualidade dos serviços e tende a ajudar os viajantes na escolha da hospedagem.
Na Europa, desde 2009 há o Hotelstars Union, vinculado à Associação de Hotéis, Restaurantes e Cafés da Europa. A classificação avalia mais de 22 mil hotéis de uma a cinco estrelas e tem 21 países como membros, incluindo Alemanha, Grécia, Suécia e Suíça.
Os critérios são divididos em categorias e cada uma delas tem um valor específico, em que a soma dos pontos determina a classificação final do hotel. Uma revisão dos critérios ocorre a cada cinco ou seis anos. Hotéis que excedem os requisitos de cinco estrelas são classificados como “Superior”. Detalhes dos critérios podem ser vistos aqui.
Portugal tem um sistema de classificação próprio, também avaliando locais de uma a cinco estrelas, assim como a França. “Os clientes são cada vez mais exigentes e as estrelas continuam a ser uma referência importante e universal”, sinaliza a Atout France, a Agência de Desenvolvimento do Turismo da França, responsável por avaliar os locais.
Mas o país europeu tem uma classificação a mais. São os “Palácios”, que apontam para empreendimentos com características “excepcionais”. Além de ser um hotel cinco estrelas e dispor de quartos com no mínimo 26 m², há 12 critérios de avaliação, que incluem localização e arquitetura “incomparáveis”, sua personalidade e a excelência na gastronomia. Atualmente são 31 palácios franceses, incluindo o Hôtel Plaza Athénée, em Paris, e o Cheval Blanc Courchevel, nos Alpes.
No Oriente Médio, o emirado de Dubai e o Catar também têm sistemas próprios de avaliação e classificação de hotéis que vão de uma a cinco estrelas.
Outro país que utiliza estrelas é a África do Sul. O responsável pela avaliação é o Tourism Grading Council of South Africa (TGCSA), órgão independente que possui critérios específicos. Hotéis são avaliados de uma a cinco estrelas, sendo que há a classificação de cinco estrelas “premium”, que indica produtos ultraluxuosos, que segue entendimentos próprios do órgão. A cartilha com os requerimentos pode ser conferida aqui.
Ao contrário dos países acima, o órgão de turismo oficial do Japão, por exemplo, avisa aos viajantes que não existe um sistema oficial de classificação de hotéis no país. Quando as propriedades se autodenominam quatro ou cinco estrelas, o órgão explica que, geralmente, elas aderem a padrões de outros países.
Outra forma de classificar os hotéis é por meio de iniciativas independentes e privadas, como as chaves introduzidas pelo Guia Michelin e as estrelas do Forbes Travel Guide, que possuem seus próprios critérios de avaliação. Já prêmios como The World’s 50 Best Hotels podem funcionar como um termômetro da hotelaria mundial.
Hotéis cinco estrelas são sinônimo de luxo?
Enquanto as estrelas avaliam a infraestrutura, o conceito de luxo é mais amplo. “O conceito de luxo foi mudando. Antigamente o luxo tinha que ter opulência, hoje ele é mais clean, mais leve”, defende Celso Valle, diretor do Palácio Tangará.
Entra na conta não só a estrutura, mas também a experiência. “O Tangará é cercado pelo verde do Parque Burle Marx, o que é um luxo para hotéis em grandes cidades”, exemplifica Celso.
Procurados para falar sobre a classificação de hotéis, o Rosewood São Paulo, o Fasano e a Associação Brasileira da Indústrias de Hotéis (ABIH) preferiram se abster. No Rosewood São Paulo, fatores como serviço de mordomia, check-in no quarto, serviço de quarto 24h e até uma coleção de mais de 450 obras de artistas e artesãos brasileiros podem ser vistos como um distintivo e levam algumas pessoas a categorizá-lo como ultraluxuoso.
Mas a palavra é subjetiva. Uma pousada pé na areia na Bahia pode ser sinônimo de luxo para aqueles que buscam desconexão e descanso.
No Brasil, a Associação Roteiros de Charme utiliza um termo subjetivo para mapear propriedades nacionais. São refúgios ecológicos, fazendas, pousadas e hotéis que, na avaliação da associação, carregam charme, um “conceito subjetivo que significa genericamente uma união entre bom gosto, atenção aos detalhes, paixão de servir, conforto compatível com expectativas dos hóspedes, localização privilegiada, construção adequada ao meio ambiente e à região”, como diz a descrição no site.
Ou seja, é um conjunto de fatores que dão personalidade única ao local e ao hotel, mas que devem respeitar pré-requisitos e que devem passar por um julgamento da diretoria da associação.
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