Ex-chanceler, Aloysio Nunes disse que “foi um erro” o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter enviado o assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Celso Amorim, para acompanhar a eleição na Venezuela. Na segunda-feira 29, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) declarou oficialmente o ditador Nicolás Maduro reeleito com pouco mais de 5 milhões de votos. Ele está no poder desde 2013.
“Foi um erro”, afirmou Nunes, na terça-feira 30, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo. “Estava na cara que o jogo ali estava ruim há meses.” Conforme o ex-chanceler, os observadores internacionais não têm muito o que fazer na Venezuela.
“Observar o quê?”, questionou Nunes, que foi nomeado por Lula, em fevereiro, para comandar a divisão de Assuntos Estratégicos da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos em Bruxelas. “O Brasil não é certificador da lisura de outros países. A lisura daquela eleição não se verificou no domingo, mas em todo processo de cerceamento do processo.”
Conforme os opositores do regime chavista, o principal candidato contra Maduro, Edmundo González, venceu, com 70% dos votos. A comunidade internacional também não aceitou o resultado do pleito em virtude da falta de transparência. A diplomacia brasileira também cobrou transparência.
Depois da reação negativa de sete países latino-americanos, Maduro expulsou o corpo diplomático da Argentina, do Chile, da Costa Rica, do Panamá, do Peru, da República Dominicana e do Uruguai.
Na semana passada, Amorim foi enviado à Venezuela para fornecer informações a Lula sobre o pleito, marcado por suspeitas de fraude. Amorim retornou ao Brasil na terça-feira 30 depois de conversar com Maduro e com González. Amorim conhece Maduro desde quando era chanceler durante o governo do ditador Hugo Chávez.
Na conversa com Maduro, o assessor especial cobrou a disponibilização das atas eleitorais como condição para que o Brasil reconheça a reeleição do ditador. Mas não é possível ter certeza de que as atas serão divulgadas. Após o pleito, uma onda de protestos contra o regime chavista tomou conta da Venezuela, deixando ao menos quatro pessoas mortas.
Em nota divulgada na manhã da segunda-feira, depois do resultado do CNE, o Brasil informou que “saúda o caráter pacífico da jornada eleitoral de ontem na Venezuela e acompanha com atenção o processo de apuração”.
“Há meses que Maduro vem barbarizando e o presidente Lula manifestou preocupação com essa situação”, continuou Nunes. “Foi um processo viciado. Mais do que isso, vamos fazer o quê? Não podemos romper com a Venezuela. O Brasil tem relações até com a Coreia do Norte.”
Segundo o ex-chanceler, a fronteira entre a Venezuela e o Brasil é “delicada”, principalmente, pela presença do narcotráfico na região. Conforme Nunes, não é papel do Brasil reconhecer, ou não, o resultado eleitoral de outros países.
No entanto, ele destacou que partidos de esquerda deveriam repudiar o que ocorre na Venezuela. “É difícil conceber que um partido de esquerda aplauda um governo nitidamente autoritário como o de Maduro”, constatou.
Partido a qual Lula da Silva é filiado, o PT reconheceu publicamente a reeleição de Maduro, classificando o processo eleitoral como “uma jornada pacífica, democrática e soberana”.
Lula diz que processo eleitoral na Venezuela é ‘normal’ e ‘tranquilo’
Ontem, o chefe do Executivo comentou, pela primeira vez, o pleito venezuelano. Lula disse que o processo é “normal”, “tranquilo” e que a “briga” só será resolvida quando as atas forem divulgadas.
“Como vai resolver essa briga? Apresenta a ata”, disse o presidente em entrevista à TV Centro América, afiliada da TV Globo em Mato Grosso. “Se a ata tiver dúvida entre a oposição e a situação, a oposição entra com recurso. E vai esperar na Justiça tomar o processo e vai ter uma decisão que a gente tem que acatar. Estou convencido de que é um processo normal, tranquilo. O que precisa é que as pessoas que não concordem tenham o direito de se expressar, tenham o direito de provar que não concordam, e o governo tenha o direito de provar que está certo.”
Na entrevista, o presidente condiciou a apresentação das atas para reconhecer a legitimidade do pleito. “Na hora que tiver apresentado as atas, e for consagrado que a ata é verdadeira, todos nós temos a obrigação de reconhecer o resultado eleitoral da Venezuela”, declarou.
As atas são boletins que registram os votos de cada urna. No processo eleitoral de domingo, as atas não foram devidamente apresentadas pelas autoridades e o governo venezuelano fala de falhas no sistema. Segundo o jornal O Estado de São Paulo, Maduro disse que apresentaria as atas em alguns dias. Lula é um aliado histórico do ditador, tendo o recebido no Palácio do Planalto no ano passado.
Ao falar sobre a nota do PT, o presidente disse que o texto reconhece e elogia o povo venezuelano pelas “eleições pacíficas”. “Não tem nada de grave, não tem nada de assustador”, continuou. “Vejo a imprensa brasileira tratando como se fosse a Terceira Guerra Mundial. Não tem nada a de anormal. Teve uma eleição, teve uma pessoa que disse que teve 51%, teve uma pessoa que disse que teve 40 e pouco por cento. Um concorda, o outro não. Entra na Justiça e Justiça faz.”