O fogo correu solto pelo Estado de São Paulo na última semana de agosto de 2024. De repente, sexta-feira 23, parte da capital é tomada por uma névoa seca que mesmo muito tênue, trazia o odor de capim queimado, com as tradicionais fuligens em forma de tiras pretas espiraladas. A vegetação lateral às rodovias que chegam à cidade ardia em chamas. O calor chegou a prejudicar a circulação em alguns pontos, mas as nuvens de fumaça, especialmente da mata rasteira seca, restringiram totalmente a visibilidade, tornando pontos intransitáveis.
Esta é aquela época na qual, em boa parte do Brasil, o ano hidrológico apresenta a sua fase de estiagem. Normalmente as regiões Sudeste, Norte e Centro-Oeste são as mais prejudicadas, pois as chuvas vão diminuindo até a sua extinção entre maio e junho, só retornando em meados de setembro. Ocasionalmente, na Região Sudeste, temos o retorno das chuvas tardias, como em 1993 e 2017, por exemplo, quando sua chegada só ocorreu em novembro.
Em alguns lugares, como em sítios na região amazônica, pratica-se o processo de queimada, que tem data e hora para começar e acabar, com objetivo de limpar campos agrícolas já estabelecidos e não de mata nativa. Em geral são pequenos agricultores de baixa renda que o fazem. Dependendo das condições atmosféricas do período, alguns focos de incêndio podem acontecer derivados desse procedimento, mas normalmente isso ocorre em matas secundárias ou de baixa estatura. A perda de controle de algumas queimadas pode resultar em incêndios de maior proporção, quadros muito mais raros por se tratar de floresta úmida.
Quanto ao Centro-oeste e especialmente à área do Pantanal, o período de estiagem também causa a secura das plantas, mas como a vegetação é diferente, comportando várias espécies mais arbustivas e rasteiras, há maior facilidade de ocorrerem pequenos incêndios que consomem rapidamente o material biológico. Para os satélites, o calor deste fogo já é suficiente para sensibilizar os sensores, marcando um ponto de ocorrência. Contudo, deve-se lembrar de que são casos diferentes e a recuperação desse material biológico ocorre rapidamente com o retorno do período de chuvas. Basta lembrar-se do biênio de 2019-2020.
O caso de São Paulo
Mas o caso de São Paulo é bem diferente. Primeiro porque são muito raras as ocorrências de queimadas, principalmente pelo acordo feito anos atrás com a CETESB e o setor do agronegócio, em especial da área de cana-de-açúcar, que praticamente extinguiu o uso da técnica. Em segundo lugar, em geral, pequenos incêndios são vistos sempre muito próximos de rodovias, e tendem a se alastrar para dentro das propriedades ou margeiam a periferia da estrada onde começaram. A quantidade de material combustível é pequena e seu tempo de vida, curto. São raros os que se propagam para áreas de reserva ou preservação, especialmente em sentido às lavouras do Estado. Finalmente, é preciso considerar o momento das ocorrências. Dificilmente os focos se iniciam ao mesmo tempo em lugares tão específicos para o quadro meteorológico em questão que se apresentava naquele final de semana.
Assim, podemos começar a traçar as nossas hipóteses que precisam fazer parte das investigações. Não se trata apenas da condição climática de estiagem, que já é favorável para fogo tendo em vista que o material biológico, para continuar vivo, acaba secando parte da sua estrutura vegetal. Precisamos observar um detalhe do quadro meteorológico que se desenhava exatamente na data. Estávamos numa condição de chegada de uma clássica frente fria, posicionada a noroeste-sudeste, que apresentava uma massa fria muito intensa em sua retaguarda. O centro de baixa pressão não estava muito longe da costa brasileira e, embora a formação de um ciclone extratropical ainda estivesse bastante insipiente, ventos fortes tomavam a região da vanguarda do sistema frontal.
Nesta ocasião, o sentido dos ventos é de noroeste, percorrendo desde Mato Grosso, passando por Mato Grosso do Sul, Paraná e São Paulo. Curiosamente, vários “focos iniciais” surgiram no noroeste do Estado de SP e diferentemente dos incêndios comuns (que se iniciam em beira de estradas, como relatamos), muitos ocorreram dentro de matas, dentro de áreas agrícolas, como também próximos de ruas de áreas urbanas que fazem contato com pequenas áreas de preservação, portanto, mato perto das cidades.
Uma vez que surgiram esses focos, os ventos fortes fizeram o resto do trabalho, de modo que até as 16h da mesma sexta-feira, cinzas já chegavam à capital do Estado; em diversas cidades do interior, ou a situação já era parecida com a da capital, ou muito pior, com nuvens de fumaça tomando diversos bairros e escurecendo o céu. Em outros municípios, a tragédia desse cenário ocorreu somente no sábado, enquanto o fogo se propagava pelo vento de noroeste.
Diversos vídeos circularam na Internet e a imprensa noticiou que homens foram presos por atear fogo no mato, especialmente em áreas de preservação perto de residências, estradas ou campos agrícolas. Assim, voltamos para a nossa hipótese e perguntamos se não haveria um planejamento mais elaborado por trás deste quadro, tendo em vista a particularidade meteorológica do caso e os locais escolhidos. Seria coincidência? Certamente, o INPE e a NASA que tanto se vangloriam em informar os focos de incêndios e queimadas no Brasil poderiam ajudar nas investigações, determinando locais e horários com exatidão, de forma a se esclarecer o caso.
Discurso falacioso
Enquanto isso, vimos a ministra do Meio Ambiente proferindo o discurso falacioso comum dos políticos. Primeiramente, voltou a atribuir às “mudanças climáticas” o elevado número de focos de fogo observados pelo INPE. Pergunta-se: como ela chegou a essa conclusão? Quais são as provas? Nenhuma, claro! Se fosse assim, os números seriam uma crescente — desde os primeiros períodos de governo do PT e jamais oscilariam para cima e para baixo.
Em seguida, depois da bobagem dita e vendo a possibilidade dos incêndios serem de origem criminosa planejada, a ministra reformulou suas falas à imprensa. É a típica atitude de quem não tem nada de concreto para dizer, senão o discurso pronto alarmista tradicional, enquanto encena um choro de crocodilo pelo pesar das “matas incendiadas”, mas nunca pela falta de saneamento e água potável para a população deste país. Prioridades? Nenhuma!
De fato, vale lembrar alguns pontos sobre todo esse discurso de querer “transformar o país em uma selva”. No próximo bloco, abordaremos temas importantes que envolvem as restrições legais quanto à formação de “bancos” de água, as questões sobre áreas de amortecimento e do crescimento vegetal generalizado que temos acompanhado por todo o planeta. Também será importante analisar alguns cenários geopolíticos que envolvem o tema, especialmente quando o entreguismo do Brasil está em alta cotação. A discussão será bem interessante, afinal, quanto custa preservar mato?