Um estudo recém-publicado na revista Nature Astronomy sugere que uma era do gelo, ocorrida na Terra há cerca de dois milhões de anos, pode ter sido desencadeada por um “inverno interestelar”. Assim como o nosso planeta passa por variações climáticas ao longo de seu ciclo anual ao redor do Sol, essa pesquisa propõe que o clima terrestre também pode ser influenciado pela posição do Sistema Solar em sua órbita ao redor do centro da Via Láctea.
A Terra é protegida dos perigos da radiação pelo campo magnético, e o Sol, por sua vez, protege o planeta – e os outros mundos do Sistema Solar – contra os raios cósmicos interestelares. Essa proteção solar é oferecida pela heliosfera, uma bolha de vento solar que se estende até 130 Unidades Astronômicas (UA) do astro – para comparação, a Terra está a 1 UA de distância da estrela, enquanto Plutão está a quase 40 UA.
O novo estudo revela que, há alguns milhões de anos, a heliosfera teria encolhido significativamente, chegando a apenas 0,22 UA (cerca de metade da distância até Mercúrio). Durante esse período, a Terra ficou exposta ao meio interestelar, possivelmente mergulhando em um congelamento profundo.
Nuvens frias no meio interestelar comprimiram a heliosfera
Cientistas da Universidade de Harvard e da Universidade de Boston, responsáveis pelo estudo, sugerem que essa drástica redução na heliosfera pode ter sido causada por nuvens frias de gás na galáxia, que são pelo menos 10 mil vezes mais densas que o meio interestelar usual. Se o Sistema Solar tivesse passado por uma dessas nuvens, a pressão poderia ter comprimido a heliosfera.
O Sistema Solar leva cerca de 230 milhões de anos para completar uma órbita ao redor do buraco negro supermassivo central da Via Láctea. Ao traçar o caminho do Sol nos últimos milhões de anos, os pesquisadores descobriram que poderíamos ter atravessado uma estrutura conhecida como Fita Local de Nuvens Frias (LRCC) entre dois a três milhões de anos atrás. Em especial, a Nuvem Fria da Constelação do Lince, no final dessa fita, pode ter colidido com o Sistema Solar.
Simulações indicam que essa nuvem poderia ter bloqueado a heliosfera por períodos que variam de alguns séculos a um milhão de anos, deixando a Terra exposta a partículas interestelares durante esse tempo.
Eventos galácticos poderiam influenciar no clima da Terra
Evidências geológicas apoiam essa teoria, mostrando aumento nos níveis dos isótopos ferro-60 e plutônio-244 em amostras oceânicas, neve antártica, núcleos de gelo e até mesmo na Lua. Esses registros coincidem com o início da era glacial do Quaternário, há cerca de 2,5 milhões de anos.
Famoso por suas teorias sobre objetos alienígenas, o astrônomo Avi Loeb, coautor do estudo, afirmou em um comunicado: “É emocionante descobrir que nossa passagem por nuvens densas há alguns milhões de anos poderia ter exposto a Terra a um fluxo muito maior de raios cósmicos e átomos de hidrogênio. Nossos resultados abrem uma nova janela para a relação entre a evolução da vida na Terra e nossa vizinhança cósmica”.
Além deste estudo, outros também sugerem que eventos galácticos podem influenciar ciclos terrestres. Um deles indica que os continentes se formam mais rapidamente quando o Sistema Solar entra ou sai dos braços espirais da Via Láctea.
Embora não seja possível afirmar com certeza que uma nuvem cósmica causou uma era glacial, as evidências são intrigantes. Este evento pode ter sido apenas um dos muitos fatores que influenciam o clima, como erupções vulcânicas, placas tectônicas, ciclos solares e variações na órbita terrestre. O próximo passo da equipe é rastrear o caminho do Sol ainda mais longe no tempo.