Entidades de transparência pública manifestam preocupação com possíveis retrocessos depois do acordo entre os chefes dos Três Poderes, firmado em um almoço na sede do Supremo Tribunal Federal (STF), na terça-feira 20.
Representantes da Transparência Internacional no Brasil e da Transparência Brasil alertaram em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo que o compromisso entre os dirigentes do Executivo, Judiciário e Legislativo não deve significar o abandono das recentes decisões de Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), para as emendas parlamentares.
O encontro na sede do STF contou com a presença dos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), além dos ministros Rui Costa (Casa Civil) e Jorge Messias (AGU), dos 11 ministros do STF e do procurador-geral da República, Paulo Gonet.
Depois da reunião, os representantes dos órgãos divulgaram uma nota conjunta com novos critérios para a liberação das emendas parlamentares, cuja execução está suspensa por decisões recentes de Dino.
A nota aborda as emendas individuais, de bancada e de comissão, mas omite várias medidas determinadas por Dino, ratificadas pelo plenário do STF na última sexta-feira, 16. As decisões anteriores de Dino permanecem em vigor até que ele as reavalie frente ao novo acordo.
Declarações de representantes das entidades de transparência
A Transparência Brasil e a Transparência Internacional participaram da audiência de conciliação promovida por Dino, em 1º de agosto, com representantes do Executivo e do Legislativo, para pôr fim à prática do Orçamento Secreto.
As instituições denunciaram a continuidade do Orçamento Secreto mesmo depois da decisão do STF, de dezembro de 2022, que declarou a prática inconstitucional. O Orçamento Secreto continuou em operação no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“O principal é entender que, nos últimos 20 dias, as decisões do ministro Dino sinalizaram de forma muito clara e específica quais seriam as obrigações de todos os poderes envolvidos na formulação e execução das emendas”, afirmou o advogado Guilherme France, da Transparência Internacional, ao Estadão. “O que vamos acompanhar agora é se, na implementação deste acordo feito entre os chefes de Poderes, haverá algum retrocesso com relação às decisões (anteriores) do ministro Dino”.
A diretora da Transparência Brasil, Marina Atoji, destaca que a nota conjunta não esclarece se a decisão irá se sobrepor ou não às decisões de Dino.
“De qualquer forma, é um pouco estranho que haja um acordo em relação a isso, pois temos ações (judiciais) correndo (no STF)”, disse ela. “Esse tipo de diálogo deveria ser feito nos autos dos processos, como aconteceu na audiência de conciliação (do dia 1º de agosto)”.
Segundo Marina, a nota conjunta não traz novidades em relação ao que já estava determinado pelo ministro Dino. “Não se menciona uma série de requisitos presentes nas decisões dele; menciona-se só o objeto do gasto, que é uma coisa que já está na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024; que era uma condicionante para o repasse, e não foi cumprida”, lembra Marina Atoji.
As emendas parlamentares que entidades de transparência discutem
Ainda na nota, os chefes dos três Poderes mantêm a obrigatoriedade das emendas individuais e de comissão, mas com algumas novas regras. No caso das “emendas Pix”, há a obrigação de “identificação antecipada do objeto” (ou seja, no que será usado o dinheiro); de prioridade para obras inacabadas e de prestação de contas ao Tribunal de Contas da União (TCU).
Para as emendas de bancada, há a obrigação de que sejam “destinadas a projetos estruturantes (…), vedada a individualização” – uma obrigação que já existe hoje, na resolução do Congresso que trata do assunto.
Já as emendas de comissão devem ser “destinadas a projetos de interesse nacional ou regional, definidos de comum acordo entre Legislativo e Executivo”.
Os procedimentos mencionados pelo comunicado oficial deixam de fora pontos que foram determinados por Dino. Um desses pontos é a proibição dos parlamentares mandarem recursos para fora dos Estados em que foram eleitos. Também não há menção na nota à determinação de Dino de que haja “transparência e rastreabilidade” para as emendas de comissão, e para os restos a pagar das antigas emendas de relator (RP-9).
O ministro também obrigou as ONGs que recebem recursos de emendas a seguir “procedimentos objetivos de contratação” e dar transparência aos recursos recebidos.