11 de outubro de 2024 — há exatamente uma semana, São Paulo teve uma sexta-feira que não terminou. Por volta das 20h30 daquele dia, fortes áreas de instabilidade se formaram sobre áreas do Estado e provocaram um temporal com alto potencial destrutivo, que culminou em um apagão.
A chuva veio acompanhada de muitos raios e de uma ventania não vista na capital paulista em pelo menos 30 anos, com rajadas de 106,7km/h. Como saldo, o temporal deixou sete pessoas mortas e 3,1 milhões sem energia elétrica.
Apagão em SP: de quem é a culpa?
O apagão em São Paulo aconteceu em meio aos primeiros debates para o segundo turno da eleição municipal.
No mesmo dia do temporal, o incidente se transformou em munição para o candidato Guilherme Boulos (Psol) contra o atual prefeito da cidade e candidato à reeleição, Ricardo Nunes (MDB).
Minutos depois do fim da tempestade, Boulos publicou um vídeo nas redes sociais em que atribui responsabilidade dos danos na capital paulista à gestão do emedebista.
“Essa é a situação que está São Paulo: semáforo apagado […] e a cidade um caos por uma chuva que durou menos que uma hora, uma ventania na cidade e é isso que vira”, afirmou Boulos.
“Árvore caindo, porque não tem pode adequada da prefeitura”, acrescentou. “Quem liga para o 156 sabe muito bem disso, que não tem poda. A cidade de São Paulo parece que não tem prefeito.”
Nunes, por outro lado, culpa a concessionária Enel e o governo federal pelo ocorrido. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), afirmou que a empresa deveria deixar o país.
Do outro lado, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, criticou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) por falhas na fiscalização da concessionária.
Mas, afinal, de quem é a responsabilidade pelo apagão?
A Enel é a concessionária responsável pela distribuição de energia em São Paulo e opera sob concessão do governo federal.
O atual contrato expira em 2028 e pode ser prorrogado, porém, o pedido de extensão só pode ser feito a partir de 2026, conforme indicado pelo ministro de Minas e Energia.
Tanto a Enel quanto a Prefeitura de São Paulo têm responsabilidades em ações preventivas, como a poda de árvores. A distribuidora de energia é encarregada de realizar a poda quando há riscos de descargas elétricas.
Em abril, a empresa privada, em convênio com a prefeitura, dobrou o número de ações preventivas previstas em contrato, e se comprometeu a realizar 600 mil podas anuais na área de concessão.
“De janeiro a setembro, foram 433 mil podas, o que representa 72% da meta anual de 600 mil intervenções nos 24 municípios onde a companhia opera, incluindo a capital”, disse a Enel. “Esse total é o dobro do número de podas realizado em 2023.”
Mas as informações parecem desencontradas.
Segundo dados obtidos pela TV Globo, a concessionária Enel cumpriu menos de 1% das podas de árvores que se comprometeu ao longo do ano de 2024 na capital paulista.
Os números são de um acordo firmado entre a empresa e a Prefeitura de São Paulo, em junho de 2022, onde a companhia se comprometeu a fazer a poda das árvores na cidade que estão em contato com a fiação elétrica.
E quem fiscaliza a Enel?
A fiscalização é realizada pela Aneel, ligada ao governo federal. Desde 2018, a Aneel impôs cerca de R$ 320 milhões em multas à concessionária Enel, considerando apagões anteriores em São Paulo, incluindo um em março deste ano e outro em novembro passado.
No entanto, depois de uma liminar da Justiça Federal do Distrito Federal, a Enel não pagou a multa referente ao apagão de novembro, que era de R$ 165,8 milhões.
A decisão, proferida em março pelo juiz federal Mateus Benato Pontalti, argumentou que o devido processo legal não foi respeitado, e também impediu a Aneel de incluir a Enel no cadastro de empresas em débito com o governo federal.
Há ainda outra multa de R$ 95,8 milhões pendente, aplicada devido à má qualidade do fornecimento de energia em São Paulo, segundo a agência.
Em entrevista à Oeste, o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Pedro Rodrigues, avalia que a discussão da responsabilidade está politizada. “No final, não tem um culpado, assim como não tem um certo”, afirma. “Todos têm alguma razão e, ao mesmo tempo, todos têm alguma culpa.”
O especialista acredita que uma das grandes dificuldades, no caso da Aneel, é a de fiscalizar de perto o cumprimento dos serviços das concessionárias. “Me parece um pouco fantasioso querer que a Aneel, lá em Brasília, fiscalize a poda de árvore Paraisópolis, em São Paulo, ou numa rua que ninguém conhece no Rio de Janeiro, ou em outros estados brasileiros.”
“Nós temos agências em São Paulo que têm convênios com Aneel, como a Arsesp”, acrescenta. “Poderíamos ter um tipo de convênio melhor, um poder de multa e de fiscalização maior. E isso não acontece, apesar do convênio.”
Outra solução, segundo Rodrigues, seria o aterramento dos fios. No entanto, o especialista pontua que o custo e a dificuldade dessa operação tornam o projeto praticamente inviável.
“Você não consegue isso para amanhã”, diz. “O prazo é de um, dois, três, quatro, cinco [anos] para enterrar a rede da cidade de São Paulo inteira. Isso não é possível. Mas existem outras saídas, como, por exemplo, a Prefeitura e a Enel terem um empenho maior na poda de árvores.”