Nos últimos meses, diversas lojas surgiram em São Paulo com oferecimento de um serviço peculiar: um pagamento em criptomoedas, em média R$ 600, para aqueles que permitem o escaneamento de suas íris. Muitos aderiram à oferta, embora poucos compreendam plenamente a proposta.
Ao entrar em uma loja, os participantes baixam um aplicativo e assistem a um vídeo explicativo. Há cerca de 50 estações de escaneamento em toda a cidade de São Paulo. A empresa afirma que busca garantir que a identidade digital pertença a um humano real.
Para isso, a íris e o rosto dos usuários são escaneados, incluindo imagens em infravermelho, e um mapa 3D do rosto é criado. O projeto WorldID é coordenado pela Tools for Humanity.
O chefe da empresa é Sam Altman, CEO da OpenAI, administradora do ChatGPT. A Tools for Humanity alega que as íris são convertidas em códigos desvinculados das informações pessoais dos usuários e que os dados são apagados posteriormente.
Venda de íris gera preocupações sobre privacidade e segurança
O termo de serviço gera dúvidas ao afirmar que o código da íris não é mais uma informação pessoal e que há risco de vazamento dos dados biométricos em caso de ataques cibernéticos, mesmo com tentativas de prevenção.
Waldemar Gonçalves Ourtunho Junior, diretor-presidente da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), ordenou a interrupção dos pagamentos.
“É uma operação que eu não vou voltar, não tenho como me arrepender”, explicou. “‘Olha, não quero, apaga a coleta’. A coleta fica parte na empresa e parte no celular. Então, acho que esses pontos ainda têm que ser esclarecidos para uma posição definitiva. Eu não sei se o Brasil vai para uma decisão de suspender o serviço. Mas, no momento, a gente está só querendo garantir que o consentimento seja sem contrapartida.”
Luiz Augusto Filizzola D’Urso, advogado especializado em Direito Digital, questiona: “Despejam-se milhões de reais para 500 mil usuários no Brasil pagando em torno de R$ 600 e não terá lucro nenhum? Em alguma hora esse lucro chegará.”
O que diz a empresa
Em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, o vice-presidente de Privacidade da Tools for Humanity, Damien Kieran, afirmou que a empresa não está comprando imagens de íris, mas, sim, recompensando a participação no projeto.
Depois do escaneamento, os participantes recebem a criptomoeda WorldCoin em 24 horas, utilizáveis na rede. A utilidade prática do projeto ainda é limitada.
A empresa planeja lucrar futuramente com as informações acumuladas, vendendo câmeras de escaneamento e desenvolvendo de aplicativos baseados na tecnologia.
Apesar das dúvidas e dos questionamentos, mais de 50 pontos de coleta de dados seguem em operação, pagando usuários com criptomoedas.
A continuidade do projeto depende de mais esclarecimentos sobre o uso dos dados e a conformidade com regulamentos de privacidade e segurança.