sexta-feira, novembro 22, 2024
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Duas visões sobre a jurisdição do STF


No 12º Congresso de Direito Constitucional da Faculdade de Direito de Santo André (Fadisa) realizado em 18 de outubro, palestramos, os desembargadores Valdir Florindo, do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, Reis Friede, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, e eu. A temática do evento foi “Ética e Liberdade, Liberdade com Ética”. O ministro Barroso e eu fomos os últimos a falar.

Embora o ministro tenha abordado aspectos das oportunidades e riscos da evolução da inteligência artificial na Justiça e no mundo e, eu, de meu lado, os fundamentos permanentes da ética, moral e liberdade, mais voltados ao direito natural, com sua evolução na História a partir da filosofia, ambos apresentamos nossa interpretação da temática que, embora convergente em sua percepção é divergente em sua aplicação na realidade brasileira.

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O eminente presidente da Suprema Corte entende que, apesar da aplicação do Direito por todo magistrado exigir permanente reflexão, como nem todas as situações judicializadas têm legislação pertinente regulatória, o juiz deve lastrear-se em princípios fundamentais albergados na Lei Suprema para dar solução adequada. Em sua avaliação, isso não é invadir as funções do Poder Legislativo, mas implementar, para a hipótese, o que está na Constituição. Assim, se o STF entender que, mesmo havendo legislação, aquela produção normativa do Congresso a respeito do princípio constitucional não é a mais adequada, a Corte pode atuar para oferecer a melhor exegese, por ser a instância máxima da interpretação jurídica.

Expus posição diversa. Por entender que, na Lei Suprema, há expressa disposição para que o Congresso zele por sua competência normativa (artigo 49, inciso XI) e que nem mesmo em ações diretas de inconstitucionalidade por omissão do Parlamento julgadas procedentes pode o Pretório Excelso legislar (artigo 103, §2º), em nenhuma hipótese caberia ao STF dar uma solução legislativa à luz de princípios gerais.

Leia também: Por que o STF não deve legislar, reportagem publicada na Edição 178 da Revista Oeste

É que os princípios gerais quando mais genéricos, permitem múltiplas interpretações, até mesmo conflitantes, como por exemplo o da “dignidade humana”, no qual tanto os defensores do aborto como os do direito do nascituro de ter a vida preservada desde a concepção lastreiam-se, gerando, assim, a defesa de teses absolutamente opostas.

A Constituição portuguesa, para tais princípios de múltiplas acepções, expressamente admite que apenas prevalece a interpretação em lei dos representantes do povo, entendendo eu que tal princípio é implícito na Constituição brasileira, muitas vezes o silêncio parlamentar representando a vontade popular de que aquela matéria não seja naquele momento legislada.

Palácio do Congresso Nacional, onde fica a Câmara dos Deputados brasileira. Lá, deputados votam o projeto de anistia aos presos do 8 de janeiro
Para Barroso, STF pode interpretar leis e modificá-las para uma adequação aos princípios constitucionais; Ives Gandra acha que deve haver contenção da Corte | Foto: Rodolfo Stuckert/Acervo da Câmara dos Deputados

À evidência, em palestra de quase uma hora de cada um de nós dois, diversos argumentos foram utilizados em hospedagem de nossas posições, sempre pelo prisma da ética e da liberdade. Ao final, os dois fomos aplaudidos em pé pela plateia, elogiando os organizadores como podíamos na divergência manter elevado nível, segundo eles, de elegância e respeito, ao que disseram ser um verdadeiro confronto democrático de ideias.

Tenho pelo ministro Luís Roberto Barroso particular admiração, desde que trabalhamos juntos na “Comissão de Notáveis” criada pelo presidente do Senado, José Sarney, para repensar o pacto federativo. Ofereci-lhe, ao final, meu livro “Uma Breve Teoria do Poder”, colocando a seguinte dedicatória: “Ao querido amigo e mestre Ministro Luís Roberto Barroso com afeto e admiração ofereço”. Ele, por sua vez, dedicou-me seu livro “Inteligência Artificial, Plataformas digitais e democracia”, com as seguintes palavras: “Para o estimado Professor Ives Gandra com a admiração de sempre e o renovador apreço“.


Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região, professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia), doutor honoris causa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS, catedrático da Universidade do Minho (Portugal), presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio -SP, ex-presidente da Academia Paulista de Letras (APL) e do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

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Via Revista Oeste
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