Um dia depois de o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) apresentar uma portaria para regular o uso de câmeras por policiais, deputados protocolaram na Câmara três projetos para sustar a norma.
Os projetos de decreto legislativo (PDLs) foram apresentados na quarta-feira 29 por Ubiratan Sanderson (PL-RS), Coronel Ulysses (União-AC) e Alberto Fraga (PL-DF). Coronel Ulysses também protocolou um requerimento de convocação direcionado ao ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, para que ele preste esclarecimentos sobre a portaria.
No PDL protocolado por Sanderson, o deputado argumenta que algumas situações em que a portaria exige o uso das câmeras podem prejudicar a ação policial. Ele também afirma que, embora as unidades federativas não sejam obrigadas a usar as câmeras, o oferecimento de recursos federais como incentivo pelo MJSP a quem segui-las interfere na autonomia dos Estados.
“Não obstante os estados não sejam obrigados a seguir as diretrizes propostas pelo Ministério da Justiça, determina a referida portaria que os Estados que o fizerem receberão recursos federais como forma de incentivo, fato que notoriamente afronta tanto a separação dos poderes ao intervir em outro ente federativo, quanto exorbita o poder regulamentar conferido pelo Congresso Nacional ao Poder Executivo.”, diz o projeto.
O documento redigido por Alberto Fraga afirma que o Poder Executivo não pode fazer esse tipo de regulação por meio de uma portaria, pois há limites legais para impor normas gerais a policiais civis e militares. Para a Polícia Militar, por exemplo, as regras sobre o uso de câmeras corporais devem ser estabelecidas por uma lei federal.
O parlamentar ressaltou a autonomia dos Estados e classificou a portaria como “mera carta de intenções, sem força normativa, servindo mais para propaganda governamental”.
“Não se entende que a Lei nº 13.675, de 11 de junho de 2018, que disciplina o sistema de segurança pública, autorize o tratamento da forma apresentada, ou seja, por meio de portaria”, argumentou Fraga, no PDL. “Com efeito, os Estados detêm total autonomia para adoção ou não de programa de câmeras corporais, com ou sem recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública. Nesse sentido, a Portaria mostra-se mera carta de intenções, sem força normativa, servindo mais para propaganda governamental, sem qualquer viabilidade normativa, exceto no que tange às suas próprias polícias (União).”
Além disso, na análise de Fraga, o Fundo Nacional de Segurança Pública atualmente não está apto a financiar esse tipo de programa, seja devido à limitação de recursos ou à burocracia estatal na execução.
O deputado Coronel Ulysses afirma que a portaria vai além do permitido pela Lei nº 13.756/2018, o que prejudica o acesso dos Estados e do Distrito Federal aos recursos do FNSP.
No documento referente à convocação de Lewandowski, ele argumenta que é necessário que o ministério explique o motivo das diretrizes terem cruzado os limites da legislação.
A regulação de câmeras corporais
De acordo com o governo Lula, as medidas visam padronizar o uso de equipamentos, tornando as ações policiais “mais transparentes”. A íntegra do texto assinado por Lewandowski será publicado no Diário Oficial da União em breve.
As diretrizes serão obrigatórias para órgãos federais de segurança, como a Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Força Nacional de Segurança Pública e Força Nacional Penitenciária. Nos Estados, no Distrito Federal e nos municípios, seguir as normas será opcional.
“Os dois fundos financiam vários tipos de projetos, alguns deles muito bons, muito úteis, e que se integram na Política Nacional de Segurança Pública”, disse o ministro, à imprensa. “Então, o que estamos condicionando é só a aplicação de verbas para [o uso das] câmeras corporais. Não podemos impedir um estado de receber verbas federais se ele apresentar um projeto [sobre outras iniciativas] que se adeque às diretrizes do Plano Nacional de Segurança Pública.”
No entanto, para incentivar a adesão, o ministério determinou que recursos do FNSP e do Penitenciário Nacional serão disponibilizados para projetos de implementação ou expansão do uso de câmeras pelos órgãos de segurança.
A portaria ministerial define 16 situações específicas em que os equipamentos devem ser ligados. Isso inclui situações como o cumprimento de mandados judiciais, operações de busca e salvamento, intervenções em rebeliões em presídios e possíveis confrontos.
O ministério alega que as diretrizes são baseadas em evidências científicas que mostram que em países onde as câmeras corporais foram adotadas, houve uma redução de 25% a 61% no uso indevido da força policial e nas reclamações sobre a conduta dos agentes de segurança.
No Brasil, os Estados da Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina já utilizam câmeras corporais. Minas Gerais, Rondônia e Roraima estão em processo de implementação.