O ex-procurador da República e ex-deputado federal Deltan Dallagnol publicou uma análise, em nove tópicos, sobre os arquivos divulgados na quarta-feira 17 pelo Congresso dos Estados Unidos. Na véspera, parlamentares norte-americanos tornaram públicas as ordens de censura impostas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a perfis brasileiros no Twitter/X.
O ex-deputado classificou a revelação dos arquivos norte-americanos como “gravíssimas”, e as decisões de Moraes, “abusivas”.
De acordo com o documento, Alexandre de Moraes teria censurado ao menos 300 pessoas, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ).
As decisões de Alexandre de Moraes em 9 tópicos, por Deltan Dallagnol
O ex-deputado federal resumiu os arquivos do comitê norte-americano em nove pontos. Ele mostrou que várias decisões de Alexandre de Moraes parecem ter ocorrido depois de uma “provocação” da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação, criada pelo TSE (AEED/TSE).
Segundo Dallagnol, a AAEED é um “órgão obscuro criado em 2019”, com a justificativa de “combate da desinformação”.
Conforme avaliação do ex-deputado, o órgão aparentemente monitorou a internet e as redes sociais para identificar qualquer postagem crítica ao TSE, aos seus ministros e ao processo eleitoral. Na sequência, a AAEED teria criado petições diretas ao ministro, e Alexandre de Moraes expedia decisões de ofício.
De acordo com Deltan Dallagnol, o órgão atuou de modo indevido, porque substituiu a Procuradoria-Geral da República (PGR) — responsável a peticionar perante o STF em matéria penal. O ex-deputado pôs em xeque a legitimidade legal da AEED/TSE para supostamente realizar tarefas que são da PGR.
O caso Monark
Deltan Dallagnol mencionou também o podcaster Monark, que teve seus perfis bloqueados por Alexandre de Moraes, em razão de um suposto “discurso de ódio”. O ex-deputado explicou que o ministro inseriu um ofício sobre o caso do Monark no Inquérito nº 4.923/DF, depois de “provocação da AEED/TSE”.
O ex-procurador pôs em dúvida a legitimidade da AEED para criar petições frente ao Supremo. “Ela não foi criada para combater desinformação apenas no processo eleitoral?”, perguntou Deltan Dallagnol.
Em sua publicação, Deltan Dallagnol também faz várias perguntas a respeito do órgão criado pelo TSE. “Qual é exatamente o regramento legal que autorizou a criação desse órgão? Quais são os critérios utilizados na busca e identificação de contas e postagens? Quem são os servidores públicos responsáveis por essa atividade?”
Conforme o documento, Alexandre de Moraes enviava ofícios com a ordem de derrubada de contas, sem as respectivas decisões judiciais fundamentadas.
“Alexandre de Moraes enviava apenas o ofício ao Twitter/X ou também a decisão na íntegra?”, perguntou Deltan Dallagnol. “O Twitter/X não era parte dos processos, mas, como terceiro interessado, tinha direito a recorrer caso acreditasse que as ordens eram ilegais.”
O Marco Civil da Internet
Em seguida, Deltan Dallagnol menciona o Marco Civil da Internet. De acordo com ele, os ofícios que ordenavam a derrubada total de contas em diversas redes sociais parecem apresentar uma “ilegalidade flagrante” perante o artigo 19 do Marco Civil.
“O artigo 19 prevê que as decisões judiciais só podem derrubar o conteúdo considerado ilegal, não havendo previsão para derrubada da conta inteira”, alegou Deltan Dallagnol. “O que obviamente viola o direito fundamental à liberdade de expressão e caracteriza censura, o que está, inclusive, claramente expresso na redação do artigo.”
Segue trecho do artigo:
Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.”
Por fim, Deltan Dallagnol mencionou o Congresso Nacional e o Senado. “O Congresso Nacional, em especial os nossos senadores, vão continuar calados, submissos e servis, abaixando a cabeça contra quem têm o dever de fiscalizar e de controlar no exercício do poder?”, interpelou o ex-deputado.
Para o ex-procurador da Lava Jato, os brasileiros sofreram “grave regime de censura prévia e violação aberta e declarada de direitos fundamentais, em nome da ‘defesa da democracia’”. Ele acrescentou que a democracia “serviu a um só lado, enquanto demonizou, perseguiu e esmagou outro”.