Um levantamento do Instituto Paraná Pesquisas sobre liberdade de expressão indicou, no início de maio, que 61% dos brasileiros temem punição por falar ou escrever o que pensam. A avaliação reforça o relatório de 541 páginas do Comitê Judiciário da Câmara de Representantes dos Estados Unidos, que em abril tornou públicas ordens de censura impostas no Brasil pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo o documento norte-americano, pelo menos 300 perfis de brasileiros no Twitter/X, incluindo o do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), sofreram perseguição.
Apesar da repercussão internacional das medidas do Judiciário contra cidadãos comuns, jornalistas, políticos e até mesmo o dono do Twitter, Elon Musk — que comprou uma briga com Moraes contra a censura —, a ONG Artigo 19, com sede na Inglaterra, afirma que o Brasil está mais livre agora.
De acordo com a pesquisa Global Expression Report 2024, divulgada pela organização no início desta semana, no governo Lula (PT) o país “avançou” no quesito liberdade de expressão.
Segundo o grupo, a nação alcançou a 35ª posição no ranking global de liberdade, com 81 pontos. O relatório abrange dados de 2023 de 161 países, categorizados em cinco níveis: aberto, menos restrito, restrito, altamente restrito ou em crise. O Brasil teria deixado o status “restrito” para “aberto”.
Conforme o Global Expression Report 2024, o Brasil pós-Bolsonaro, agora lulopetista, alcançou “o maior progresso global em liberdade de expressão”. A troca de governo teria promovido ainda uma “normalização institucional significativa”.
A ONG garante que depois do término do mandato de Bolsonaro e a entrada de Lula houve melhorias em diversas áreas, como direitos digitais e liberdade de mídia.
Áreas de ‘melhoria’ no Brasil, segundo ONG
Em 2023, primeiro ano do terceiro mandato de Lula, o Brasil melhorou, segundo a Artigo 19, em 17 dos 25 indicadores, comparado a 2022, último ano de Bolsonaro. As áreas levadas em consideração incluem:
- leis e sua aplicação;
- direitos digitais;
- liberdade de mídia;
- participação política;
- participação cívica; e
- liberdades políticas e privadas.
O país teria progredido ainda em aspectos como participação de organizações civis, liberdade de publicação de conteúdo político, monitoramento governamental da internet, transparência das leis e sua aplicação, violência política, liberdades acadêmica e religiosa.
Esse último ítem da avaliação contraria a pesquisa do Instituto Paraná, a qual diz que, considerando-se a religião, os evangélicos têm maior percepção de falta de liberdade de expressão no país: 64,5% acham que podem ser punidos por falar ou escrever o que se pensam. Entre os católicos, o porcentual é de 61%.
O que diz a Câmara de Representantes dos Estados Unidos
Ao longo de 541 páginas, os parlamentares norte-americanos mostraram no relatório como a escalada da censura avançou no Brasil desde 2019, quando o ministro Dias Toffoli emitiu uma ordem que concedeu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a autoridade para abrir investigações. Tal medida contraria a Constituição, segundo juristas.
“Com este novo e extraordinário poder, Alexandre de Moraes atacou impunemente os críticos da direita e da esquerda”, resumiu o Comitê da Câmara dos EUA. “O ministro supostamente ordenou que as plataformas de mídia social removessem postagens e contas mesmo quando muito do conteúdo não violava as regras das empresas e muitas vezes sem dar uma razão.”
Os parlamentares citam, entre outras decisões do ministro, a ordem de busca e apreensão nas casas de oito empresários brasileiros, em julho de 2019, além do congelamento de suas contas bancárias e o bloqueio de seus perfis nas redes sociais. Mencionam ainda a decisão que censurou uma reportagem da Revista Crusoé sobre Toffoli.
Para reforçar sua indignação com tais mandados, o Comitê da Câmara dos EUA resgatou uma declaração do ministro aposentado Marco Aurélio Mello. “Estou na Corte há 28 anos e nunca vi uma decisão como esta, de retirar um artigo”, afirmou o magistrado. “Isso é retrocesso.”