Passar pela Avenida 23 de Maio, rumo ao centro, e olhar à direita, tornou-se uma espécie de ritual para os paulistanos que deparam com o Colégio Bandeirantes. Desde 1934, quando foi fundado, ainda com o nome de Ginásio Bandeirantes, o local se inseriu na vida da cidade como um símbolo de excelência.
A escola, que desde aquela época se manteve entre as melhores do país, agora é alvo de linchamento. O motivo: houve o suicídio de um aluno do 9º ano, fora das dependências do colégio, vítima de bullying por ser bolsista e homossexual.
Manifestações presenciais, durante reuniões escolares e na frente do colégio, e até mesmo pelas redes sociais, têm ocorrido no calor da tragédia. Alguns culpam o colégio, rotulando-o de elitista e exigindo da diretoria mais atenção à saúde mental dos bolsistas.
No dia 23 de agosto, 11 dias depois da morte do jovem, a direção do colégio publicou uma nota em que o diretor-geral, Eduardo Tambor Junior, promete lidar com a situação de maneira criteriosa.
Tal preocupação leva em conta o cuidado com a dor dos familiares e a preservação do jovem e da própria instituição, na qual se incluem alunos, funcionários e colaboradores. Para a diretoria, a maneira com a qual as notícias têm sido veiculadas na mídia são prejudiciais, por agravarem a ansiedade de todos.
“Estamos cientes do tom e conteúdo de tais notícias e reafirmamos que há muitas inverdades”, relata a diretoria, no texto. “O tema não foi apurado com responsabilidade pelos veículos divulgadores. Ademais, o tom sensacionalista é extremamente irresponsável e impacta negativamente a saúde mental de nossos alunos e colaboradores.”
Caráter pedagógico
Uma das características que marcaram a trajetória da escola, de acordo com seu histórico, foi a necessidade de acompanhar as transformações de cada época.
Dessa maneira, o aspecto multidisciplinar esteve sempre presente na busca “da excelência acadêmica, da formação integral e do protagonismo do aluno”, conforme o Bandeirantes. A ideia de inclusão dos estudantes, nesse caso, é prioridade.
Na carta de esclarecimentos, a escola deixa claro que tem evitado vir a público para conter uma atmosfera de sensacionalismo. “Continuamos, portanto, priorizando o apoio aos nossos alunos e a cautela na divulgação do tema, a fim de evitar o efeito de contágio — para que outros casos semelhantes não sejam incentivados.”
Toda a fúria que se voltou contra o colégio, na visão da diretoria, não pode ser rebatida sem o caráter pedagógico que sempre foi o lema desta instituição.
“É nossa obrigação e missão, como instituição de ensino, proteger não apenas a identidade e a imagem desse aluno, mas seus demais dados pessoais e informações escolares”, diz o texto. “Do mesmo modo, também temos o dever de proteger informações relativas aos nossos demais estudantes, não importa em que contexto tenham interagido com o aluno que veio a falecer. Reputamos todas essas informações como sigilosas e, no que depender de nós, assim permanecerão.”
Recentemente, o Bandeirantes se tornou o principal parceiro da ONG Instituto Social para Motivar, Apoiar e Reconhecer Talentos (Ismart) na capital paulista. Como resultado, houve a concessão de 110 bolsas destinadas aos alunos da escola.
Formação de educadores e dos alunos
Na nota, a diretoria do colégio menciona um de seus projetos — que trata justamente da importância do combate ao bullying. O programa, chamado Convivência Positiva, visa a fortalecer a harmonia entre os estudantes.
“Nossa proposta educativa integra o conhecimento acadêmico ao desenvolvimento de competências socioemocionais e sociomorais, considerando a convivência positiva não apenas como uma condição para a qualidade da aprendizagem, mas como um objetivo educativo em si”, diz a nota.
A formação dos educadores é voltada para temas específicos, como comunicação não violenta, mediação de conflitos, racismo, bullying, cyberbullying e sexualidade, entre outros, com o permanente acesso para espaços de fala. Aqui, alunos e professores têm a liberdade de expor conflitos pessoais, interpessoais e dilemas.
O enfrentamento do bullying é realizado de maneira minuciosa. Há várias estratégias para prevenção e detecção deste tipo de ocorrência, em que, na visão do colégio, há uma desigualdade de poder entre o autor e o alvo, que fica em posição de fragilidade.
“Além disso, o bullying ocorre de forma velada, sendo de difícil identificação por pais e educadores”, diz a nota. “Por essa razão, nossos educadores têm formação para observar alguns sinais que podem servir de alerta para uma possível situação de bullying: isolamento social, queda de rendimento acadêmico, mudança de humor, absenteísmo e frequência elevada ao ambulatório do colégio.”
Constatados os sinais, a equipe de orientação educacional dá início ao protocolo antibullying. Este protocolo consiste no levantamento de informações sobre sobre autor, alvo, espectadores, locais em que ocorre e qual o tipo de agressão.
“Havendo confirmação, iniciamos os encontros individuais e formativos com os alunos envolvidos”, explica o Colégio Bandeirantes.
Bolsas de estudo
Uma das premissas da escola é o desenvolvimento pessoal dos alunos ao lado do aprendizado do conteúdo. Mas a formação ética não depende apenas do ambiente escola. “Para ser efetiva, a educação deve ser vista como um esforço coletivo e compartilhado, no qual a escola é apenas uma peça de um quebra-cabeça maior”, acrescenta a diretoria.
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Sobre a parceria com ONGs, o Bandeirantes informa que investe R$ 7 milhões por ano para incluir e apoiar alunos bolsistas. A relação mais antiga é com a ONG Ismart, iniciada em 2007, mas a escola recentemente firmou acordos com as ONGs Alcance e o Instituto Sol.
“O Band tem o compromisso de proporcionar uma educação de excelência e inclusiva. Para atingir esse objetivo, há mais de 17 anos, temos parcerias com ONGs que oferecem oportunidades para alunos talentosos de baixa renda”, observa a diretoria. “Ao longo dos anos, mais de 400 jovens já foram beneficiados e a grande maioria obteve sucesso acadêmico em diferentes universidades no Brasil e no exterior.”
Neste momento de dor, a escola convida todas as famílias para encontros presenciais, em grupos organizados, a fim de fortalecer o vínculo entre todas as partes. “Desejamos que esse seja um momento de verdadeiro diálogo entre nós, no qual possamos escutar, acolher e conversar”, conclui.