Um artigo publicado na terça-feira (13) na revista Frontiers in Ecology and Evolution revela que chimpanzés na floresta de Budongo, em Uganda, não apenas tratam seus próprios ferimentos, como também cuidam dos machucados de outros membros do grupo. Essa descoberta pode ajudar a entender como os primeiros humanos começaram a desenvolver práticas de cuidado com a saúde.
Embora já tenham sido observados comportamentos parecidos em outras regiões, o estudo mostra que esse tipo de cuidado é mais comum e repetido em Budongo. Isso sugere que os chimpanzés, mesmo sem laços familiares próximos, podem demonstrar empatia e oferecer ajuda a outros indivíduos do grupo.
Segundo a pesquisadora Elodie Freymann, da Universidade de Oxford, na Inglaterra, a primeira autora do estudo, o trabalho ajuda a revelar as raízes evolutivas da medicina humana. Em um comunicado, ela explicou que observar como esses primatas cuidam de si mesmos e dos outros oferece pistas sobre os comportamentos sociais e cognitivos ligados ao cuidado com a saúde.
Equipe analisou duas comunidades de chimpanzés
A equipe liderada por Freymann acompanhou duas comunidades de chimpanzés: Sonso e Waibira. Assim como outros grupos da espécie, esses animais vivem em meio a riscos como brigas internas, quedas e armadilhas ilegais colocadas por humanos na floresta. Em Sonso, por exemplo, cerca de 40% dos chimpanzés apresentavam ferimentos causados por laços.
Durante quatro meses, os pesquisadores observaram os animais diretamente. Também analisaram vídeos de um banco de dados, registros de campo e relatos de outros pesquisadores para complementar as informações. Além disso, identificaram as plantas usadas pelos chimpanzés para tratar ferimentos.
Algumas dessas plantas mostraram ter substâncias com propriedades medicinais, semelhantes às usadas na medicina tradicional humana. Isso indica que os chimpanzés podem ter uma noção do efeito dessas plantas, escolhendo aquelas que realmente ajudam na recuperação.
No total, foram observados 41 casos de cuidados com a saúde: 34 em que os chimpanzés trataram seus próprios ferimentos e sete em que cuidaram de outros membros do grupo. Os comportamentos incluíram lamber a ferida diretamente, pressioná-la com os dedos, aplicar folhas ou usar materiais vegetais mastigados.
Essas ações ajudam a limpar os ferimentos, evitar infecções e acelerar a cicatrização. Todos os chimpanzés observados apresentaram sinais de melhora depois de aplicar esses cuidados. Os pesquisadores também notaram hábitos de higiene, como a limpeza dos órgãos genitais e do ânus com folhas, após o acasalamento ou a defecação.
Análise aponta sentimento de empatia pela dor alheia
Entre os sete casos de cuidado com outros indivíduos, quatro envolveram tratamento de feridas, dois foram de ajuda para remover armadilhas e um se referia à higiene. O mais interessante é que o cuidado não foi restrito a parentes ou a um sexo específico – houve ajuda entre chimpanzés sem relação genética.
Isso reforça a ideia de que esses animais são capazes de reconhecer o sofrimento do outro e agir para aliviar a dor, mesmo sem receber algo em troca. Os pesquisadores sugerem que o risco constante de ferimentos, especialmente por armadilhas humanas, pode aumentar a necessidade e a frequência desse tipo de cuidado.
Apesar das descobertas, os cientistas destacam limitações no estudo. A comunidade Sonso, por ser mais acostumada à presença de pesquisadores, foi mais fácil de observar. Isso pode ter gerado um desequilíbrio nas comparações com Waibira.
Além disso, ainda é preciso analisar mais profundamente as plantas usadas para confirmar seu real efeito medicinal. Os casos de ajuda entre chimpanzés também são raros, o que dificulta estabelecer padrões. Mesmo assim, o estudo abre novos caminhos para entender as origens do cuidado e da empatia na evolução humana.