Convencer o marido, Mark, a se aposentar mais cedo e deixar para trás a vida em San Diego, na Califórnia, nos Estados Unidos, para viajar pelo mundo em 2018 não foi uma tarefa fácil para Kimberly Walker.
Kimberly, que já trabalhou como paisagista, conta que Mark, então empregado de uma empresa de nutrição e emagrecimento, resistiu à ideia no início. Mas, com o tempo, ele cedeu.
“É uma daquelas decisões que mudam a vida,” Kimberly contou ao CNN Travel. “Depois que você larga o emprego e se aposenta, não tem como voltar atrás, se for um erro.
“Ele estava nervoso, e eu disse: ‘Olha, aconteça o que acontecer, vamos desejar ter começado antes. Não há outra forma de enxergar isso’. E fico tão feliz que ele me ouviu e que viajamos pelo mundo”.
Um momento que mudou tudo
Casados desde 1997, o casal viveu como nômades por quatro anos, visitando países como Polônia, Montenegro e Austrália, antes de se estabelecerem em Portugal, em março de 2021.
Mark, um entusiasta do ciclismo, se apaixonou pelo clima agradável do país e rapidamente se adaptou à vida em terras lusitanas. Kimberly acreditava que teriam muitos anos pela frente para aproveitar essa nova rotina, mas tudo mudou abruptamente oito meses atrás, quando Mark faleceu de repente.
Agora, Kimberly enfrenta a difícil tarefa de seguir em frente sem o companheiro, no local que escolheram juntos para recomeçar.
“Mesmo que a gente pense na possibilidade de ficar viúva um dia, não é algo que imaginamos para agora,” ela reflete. “Estávamos vivendo o auge, realizando nossos sonhos.”
Kimberly explica que o objetivo principal ao deixar os EUA era explorar o mundo juntos.
“Muita gente foge dos EUA, mas esse não era o nosso caso,” ela diz. “Queríamos viajar. Gostávamos da Europa, e o sul da Califórnia é tão longe daqui… Eu queria vir e ficar.”
A mudança definitiva
Quando decidiram partir, venderam quase todos os bens, mantiveram a casa em San Diego e organizaram novas famílias para seus dois cachorros. Amigos e vizinhos se reuniram para uma despedida animada, muitos duvidando que o casal duraria mais de seis meses fora.
Mas eles se adaptaram ao estilo de vida nômade, viajando por destinos como Amsterdã, Dinamarca, Bruxelas, França, Espanha e Reino Unido, muitas vezes como cuidadores de casas.
Durante a pandemia de covid-19, ficaram “presos” na Nova Zelândia por 18 meses e, ao final desse período, decidiram ser a hora de encontrar uma casa.
Portugal, um lugar que já haviam considerado anteriormente, se mostrou perfeito. Conseguiram o visto e alugaram uma casa em Vilamoura, no Algarve, onde começaram a construir uma nova vida.
Apesar das diferenças culturais, Kimberly se adaptou ao estilo descontraído do país, enquanto Mark fazia amizades no ciclismo. Eles estavam felizes.
Reviravolta trágica
Apesar dos desafios de se adaptar a uma nova vida em outro país, Kimberly e Mark estavam felizes e encontrando seu caminho. “Estávamos sólidos,” ela relembra. “Muito bem. Sempre juntos, há 37 anos.”
Em março, enquanto visitavam um amigo na Espanha, Mark sofreu um ataque cardíaco e faleceu. “Foi terrível,” desabafa Kimberly. “Não deveria ter acontecido… Mas aconteceu. Ainda não consegui aceitar. Já se passaram oito meses, mas parece que foram oito dias.”
Embora tenha pensado brevemente em retornar aos Estados Unidos, ela decidiu permanecer em Portugal.
“Muita gente achou que eu voltaria para casa,” diz ela. “Mas aqui é meu lar agora. Acho que já estou fora tempo suficiente para não sentir que lá ainda é meu lugar.”
Após resolver a burocracia e fazer os arranjos necessários, Kimberly retornou sozinha para Portugal. Ela temia “aquela viagem de quatro horas e meia com a bicicleta dele no teto do carro para um apartamento vazio,” e, como esperado, foi uma jornada difícil.
De volta a Vilamoura, Kimberly se viu sozinha, sem saber o que fazer. Decidiu adotar uma cadela, chamada Honey, para lhe fazer companhia, enquanto enfrentava a papelada decorrente da perda do marido.
Kimberly ficou comovida com o apoio que recebeu da comunidade local, que se uniu para ajudá-la. “Descobri que tinha mais amigos aqui do que imaginava,” conta ela. “E você precisa disso nessas horas.”
Embora ainda não saiba por quanto tempo permanecerá em Vilamoura, ela não planeja fazer grandes mudanças no momento.
“Não quero recomeçar,” afirma. “Ainda não estou pronta para mexer nas coisas de Mark. Ficarei no mesmo apartamento por mais um ano para poder resolver tudo com calma.”
Processo do luto
Segundo Kimberly, sua família nos Estados Unidos tem sido muito solidária, embora ninguém tenha conseguido visitá-la em Portugal.
“Tenho duas irmãs, e ambas falaram sobre pegar um avião para me ver,” ela diz. “Mas são típicas americanas, nenhuma delas tem passaporte.”
Apesar de ser difícil ficar sozinha, Kimberly acredita que seria ainda mais doloroso voltar aos Estados Unidos.
“Nem tudo que faço aqui é uma memória sem meu marido,” explica. “Já em San Diego, tudo machuca.”
No entanto, mesmo em Portugal, onde há menos lembranças compartilhadas com Mark, o luto é algo inevitável.
“Estou enfrentando uma perda difícil de aceitar,” admite. “Mas metade de todos os casais casados passa por isso em algum momento… Não sou tão única assim.”
E completa: “Foi mais cedo do que eu esperava, rápido e abrupto.”
Determinada a honrar seus planos, Kimberly viajou sozinha à Noruega em julho, um passeio que o casal planejou antes da morte de Mark.
“A viagem foi fantástica,” ela conta. “Havia muitas pessoas solteiras, e todos foram muito acolhedores. Eu sei viajar sozinha, já fiz isso antes. Mas viajar sem Mark foi um desafio grande demais.”
Kimberly espera continuar explorando o mundo, mas prefere ter companhia em futuras aventuras. “Se conhecer alguém que queira viajar, me avise,” brinca ela.
Em agosto, Kimberly voltou aos Estados Unidos para visitar a família pela primeira vez desde a morte de Mark. Decidiu fazer a viagem antes do casamento de sua sobrinha, para não ofuscar o evento com sua tristeza.
“Sabia que o casamento estava chegando,” explica. “Então, quis resolver minha primeira viagem para casa antes, para a noiva ter seu momento de alegria.”
Recentemente, ela esteve na Califórnia para o casamento, que achou bonito. “Casamentos serão difíceis para mim,” diz ela. “Foi bom já ter superado uma parte dessa experiência.”
Focada no futuro
Este ano, Kimberly enfrenta o primeiro Dia de Ação de Graças e Natal sem o marido. Enquanto planeja um dia tranquilo para o primeiro feriado, passará o Natal no Reino Unido com amigos que conheceu em suas viagens.
“É só um dia,” reflete. “Não é algo impossível de lidar.”
Quanto ao futuro, ela mantém a mente aberta. “Posso acabar voltando para os EUA,” considera.
“Mas, por enquanto, acho que estou bem aqui. Este é o melhor lugar para seguir nesse processo.”
Kimberly está renovando sua autorização de residência temporária e considera solicitar a cidadania portuguesa no futuro.
Embora não esperasse entrar nesta nova fase da vida sozinha, ela está determinada a continuar.
“Sinto-me sortuda por ter vivido tantas aventuras incríveis ao lado de Mark e quero ter muitas outras, quando for o momento certo.”
“Há uma pessoa feliz dentro de mim tentando sair de vez em quando,” conclui. “Eu vou reencontrá-la. Quero honrar meu marido, e estar triste faz parte disso. Por mais que doa, é importante viver esse processo.”