Mais de 30 anos depois da novela original ser transmitida, Bruno Luperi, 35, se tornou o responsável pela adaptação do remake de “Renascer”. Neto de Benedito Ruy Barbosa, o autor original, Luperi tomou a liberdade de realizar algumas alterações no roteiro, trazendo um ar de contemporaneidade para a história.
Em entrevista à CNN, o autor opinou sobre quais limites podem ser explorados no remake de uma história. “Eu acho que não tem muito limite, na verdade, são várias maneiras de fazer uma adaptação”. “Eu tento olhar para aquela história que aconteceu 30 anos atrás, ver o resultado que ela teve e qual espaço afetivo ela ocupa na vida das pessoas”, explicou Bruno Luperi.
Em 2022, o autor também foi responsável pela adaptação de “Pantanal”, novela de seu avô que originalmente foi ao ar em 1990. No entanto, diferente de “Renascer”, o remake foi o mais fiel possível ao clássico da TV Manchete.
De acordo com Luperi, a pesquisa é um dos pontos cruciais para uma adaptação. Quando estava no processo criativo do remake de “Pantanal”, o autor percebeu pouquíssimas mudanças na região desde a novela de Benedito.
“O Pantanal vive um pouco sobre este mesmo espírito feudal que vivia há 30 anos. A sua terra está aqui, dali a 50 porteiras tem a do seu vizinho, mas vocês não se cruzam nunca porque não tem uma estrada que liga. A dinâmica se preservou muito”, explica.
“Em ‘Renascer’ é diferente. A trama está inserida em um contexto que se transformou muito ao longo dos anos”, ainda pontua o autor, ressaltando que, se anos atrás a vassoura de bruxa era o grande temor dos produtores, hoje existem novas formas de lidar com a praga, que já não ameaça mais as plantações.
Tal mudança reflete também na personalidade dos personagens. “O [Antonio] Fagundes vai para um José Inocêncio mítico, um Deus, uma figura que troveja suas ordens. Enquanto o [Marcos] Palmeira vai para um cara que tende a ser humano perante o contexto para conseguir existir”.
Outro fator que possibilitou maior liberdade no roteiro de “Renascer” foi a novela ser uma obra “meio aberta”, nas palavras de Luperi. Por ter entregue cerca de 100 capítulos antes da estreia, os primeiros quatro meses de trama se inspiraram muito no roteiro original.
Porém, a partir do momento que o autor teve contato com a repercussão, pôde enxergar o que deu e o que não deu certo, ele aproveitou para realizar mudanças e explorar caminhos alternativos nos capítulos que escreveu enquanto a novela já estava no ar.
Em “Pantanal”, isso não foi possível, já que a trama foi exibida em um período pós-pandêmico e o autor teve de entregar todos os capítulos escritos antes das gravações se iniciarem.
Por que Buba se tornou uma mulher trans no remake?
Com base no avanço dos tempos e nas mudanças da sociedade, Bruno Luperi alterou logo de cara algumas tramas, como a de Buba (Gabriela Medeiros), que se tornou uma mulher trans no remake.
“Na primeira versão, a Buba ser intersexo foi um passo específico para aquela história e eu acho que foi muito inovadora para aquele tempo. Ao trazer para hoje, essa pauta evoluiu muito, tanto em termos de consciência, quanto de urgência de se discutir algumas coisas que antigamente eram pouco abordadas”, afirma Luperi.
Essa ideia de gênero e identidade era muito menos discutida. De lá pra cá, isso se tornou muito mais profundo, se distinguiu, se a pessoa é cis ou trans, se ela é homossexual, heterossexual ou se ela é bi. Então, temos muito mais componentes, mais ferramentas, para esmiuçar esse tema
Bruno Luperi
Segundo Bruno Luperi, ao se deparar com a personagem Buba, ele percebeu uma brecha para explorar de forma mais ampla essa questão. “Durante oito meses, a gente pode amplificar a discussão de gênero no Brasil. Podemos trazer a questão da transexualidade, do intersexo, tudo isso como pano de fundo para discutir o patriarcado, o machismo, o coronelismo, como uma forma também de se reinventar”
Ainda assim, Bruno Luperi garante que tem planos de incluir a intersexualidade no remake. “Vamos abordar em um dado momento da história, mas de outra maneira”, afirma.
Mesmo diante das alterações, Luperi diz que tentou deixar a menor cicatriz possível, para permitir que a novela de seu avô falasse por si só. “Eu não tenho a vaidade de querer ser o autor da adaptação de ‘Renascer’. Eu quero que seja uma história que toque as pessoas, que as coloque para pensar, assim como foi na primeira versão. É uma missão grande, mas eu acho que é feita com muito respeito”.
“Eu podia trabalhar de maneira mais fácil, dormir mais cedo, ficar mais tempo em casa, mas eu opto por fazer meu trabalho com uma relevância social maior. É isso que me move”, ainda complementa o autor, que costuma escrever cerca de 20 capítulos por dia, iniciando às 7h e finalizando somente de madrugada.