Nos últimos anos, políticos, jornalistas e ativistas estrangeiros têm se unido aos brasileiros na luta pela liberdade de expressão e contra decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). A deputada norte-americana María Elvira Salazar chegou a exibir uma foto do ministro Alexandre de Moraes, durante uma audiência na Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, sobre as violações de liberdades no Brasil, em dezembro do ano passado.
A ativista alemã Naomi Seibt, por sua vez, frequentemente publica vídeos nas redes sociais com críticas à esquerda brasileira. Para alguns, no entanto, essas críticas quase custaram caro. É o caso, por exemplo, do jornalista português Sergio Tavares. Em fevereiro de 2024, a Polícia Federal (PF) o deteve no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP).
À época, ele veio participar da manifestação pela liberdade, na Avenida Paulista, na cidade de São Paulo. Em setembro do mesmo ano foi a vez da jornalista alemã Vicky Richter. Ela conta que a PF reteve seu passaporte no Aeroporto Internacional de Brasília, depois de ela tentar entrevistar Moraes.
Vicky, contudo, afirma estar impressionada com o patriotismo dos brasileiros, mas assustada com algumas decisões da Suprema Corte. Com o objetivo de mostrar ao mundo a luta de parlamentares de oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a jornalista alemã decidiu produzir o documentário Fora Moraes — A Luta do Brasil pela Liberdade, que deve ser lançado em março deste ano. Ela afirma que “o mundo precisa ver o que está acontecendo no país”.
“O mundo, quando pensa no Brasil, imagina pessoas felizes”, afirma Vicky. “Pensa em Copacabana, samba, futebol, sol, praia. Mas a verdade é que os brasileiros sofrem com um ditador que pensa que pode colocá-los na prisão, que pode executar e fazer leis.”
A Oeste, Vicky falou sobre o documentário que está produzindo e sobre sua atuação no jornalismo independente.
Confira os principais trechos da entrevista.
Por que você decidiu fazer um documentário sobre o Brasil e, especialmente, sobre Alexandre de Moraes?
Em 2021, fui convidada para entrevistar o ex-presidente Jair Bolsonaro. Fui uma das primeiras jornalistas internacionais a mostrar ao mundo como ele realmente é. As mídias sociais o pintam como uma pessoa maligna. Viajei ao Brasil com um colega para ver qual era a situação real. Meu trabalho como jornalista não é criar uma ideia sobre uma pessoa antes de conhecê-la. Estive na manifestação do dia 7 de setembro de 2021, na Avenida Paulista. Nunca vi nada igual. Sou alemã e patriota e gostaria de ver isso em meu país. Isso fez eu adorar os brasileiros. Depois, em 2024, quando veio à tona o caso dos Twitter Files, tive a oportunidade de conhecer vários jornalistas exilados do Brasil, por meio de meu trabalho nos Estados Unidos. Li o artigo do jornalista Michael Shellenberger sobre o Brasil e pensei: “Por que ninguém está falando disso na Europa?”. Então, fui uma das primeiras pessoas a escrever um artigo em alemão sobre a censura no Brasil. Em 7 de setembro de 2024, voltei ao Brasil para outra manifestação, em São Paulo. Depois, deputados brasileiros me convidaram para ir a Brasília. Consegui fazer algumas entrevistas. Conheci o Congresso brasileiro. Falei com os deputados federais Marcel van Hattem (Novo-RS), Bia Kicis (PL-DF) e Nikolas Ferreira (PL-MG). Decidi publicar essas entrevistas. Mas, depois, pensei: “Não, os brasileiros merecem mais”. Então decidi fazer o documentário. O que ocorre no Brasil merece um roteiro chamado Ideologia Socialista e Comunista.
Quando seu interesse de cobrir o Brasil começou?
Começou em 2021, quando fui convidada pela administração de Bolsonaro para viajar ao Brasil. O problema que o ex-presidente brasileiro enfrentou é o mesmo de Donald Trump. A imprensa internacional afirma que eles são pessoas más. No entanto, ele é uma pessoa muito humilde. Sinto-me muito honrada de conhecê-lo. Ele me recebeu muito bem. Nunca me esquecerei disso.
Você poderia falar sobre sua atuação no jornalismo?
Denuncio o tráfico de sexo infantil nos EUA, no México e na fronteira entre esses dois países. Tento mostrar ao mundo esses crimes. Procuro saber por que isso está aumentando e por que ninguém está falando disso. A mídia não está cobrindo esses casos porque há muitos poderosos envolvidos. Luto para denunciar a cirurgia de mudança de sexo em crianças. Trabalho com o jornal independente Urban Scoop, do Reino Unido. Damos às pessoas uma voz. Buscamos a verdade. Então, quem desejar conferir, por favor, é urbanscoop.news.
Poderia falar um pouco sobre o que aconteceu no Aeroporto de Brasília?
Como mencionei, em setembro de 2024, entrevistei vários parlamentares. Também tentei falar com políticos de esquerda. Pensei em conversar com o ministro Alexandre de Moraes. Queria saber por que ele pensa que tem o direito de punir e censurar as pessoas. Pensei em fazê-lo porque esse é o meu trabalho como jornalista. Quando eu estava no escritório do deputado Gustavo Gayer (PL-GO), usei o telefone para ligar para Moraes. No entanto, parece que o gabinete dele bloqueou o número de Gayer. Isso é estranho, porque você deveria ter a oportunidade, quando você é um membro do Congresso, de falar com um juiz da Suprema Corte. É o que penso. Talvez não seja o que Moraes pensa. Pegamos outro telefone e tentamos ligar, e a chamada entrou. Era uma assistente do ministro. Solicitamos a entrevista e ela disse para enviar um e-mail. Escrevi, mas negaram a entrevista. Quando tive de voltar aos Estados Unidos, uma senhora pegou meu passaporte no Aeroporto de Brasília e disse: “Temos um problema”. Disseram-me que eu havia entrado no Brasil ilegalmente. Eles chegaram a conversar pelo telefone com alguém. Depois de alguns minutos, devolveram meu passaporte. Não acredito em coincidências. É estranho quando você liga para o gabinete de um juiz da Suprema Corte e, de repente, seu passaporte é retido. Acredito ser uma forma de eles silenciarem os jornalistas estrangeiros, pois não foi a primeira vez que isso ocorreu.
Você sofreu ataques da imprensa brasileira?
Cerca de 40 minutos depois de eu tentar entrar em contato com Moraes, recebi uma mensagem no Instagram de um jornalista da Revista Fórum. Ele me perguntou se estava fazendo um documentário sobre o Brasil. A princípio, achei estranho. Apenas respondi que sim. Logo, ele me perguntou se penso que não há liberdade de expressão no Brasil. Não respondi. Minutos depois, ele escreveu um artigo no qual me chamou de “extremista de direita”, “bolsonarista” e de que eu era uma pessoa muito ruim. Isso é engraçado, porque não posso ser “bolsonarista”. Não voto em Bolsonaro. Não sou uma cidadã brasileira.
Quando o documentário será lançado?
Talvez seja lançado no mês de março, porque ainda estou traduzindo as entrevistas. A maioria delas está em português e quero mostrá-las ao mundo. Vai ser publicado no Twitter/X e no YouTube. Farei o possível para que os brasileiros tenham acesso ao material.
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