O Brasil completou um mês sem acesso à rede social Twitter/X. A plataforma, de propriedade de Elon Musk, está suspensa desde 31 de agosto por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A decisão gerou debates sobre o uso da rede, que abrigava tanto usuários de direita quanto de esquerda, incluindo membros do governo Lula. De acordo com um levantamento do portal Poder360, o bloqueio priva o acesso de brasileiros a informações importantes divulgadas por figuras influentes no Twitter/X.
Kamala Harris, vice-presidente dos Estados Unidos, e o aiatolá Ali Khamenei, líder supremo do Irã, são exemplos de personalidades que usam a plataforma para comunicar decisões significativas.
Com o bloqueio da plataforma, brasileiros migraram para o Threads, da Meta, e o Bluesky, criado por Jack Dorsey, ex-CEO do Twitter/X. Porém, há um “isolamento” do restante do mundo, sem acesso às informações de governos internacionais.
A jornalista e pesquisadora Luciana Moherdaui, do IEA-USP, destacou o valor do Twitter/X como fonte de informação. Ela afirmou que o bloqueio prejudica a imprensa, dificulta o acesso a fontes cruciais e impede o debate público. Com a suspensão, Luciana perdeu 16 anos de curadoria de conteúdo.
Entre 16 líderes de 15 países, apenas o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, usa o Bluesky. No Threads, Kamala Harris, Gabriel Boric, Giorgia Meloni, Antony Blinken, Nicolás Maduro e López Obrador são os únicos que usam a plataforma com frequência ou publicam ocasionalmente.
Anúncios que foram feitos através do Twitter/X
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, do Partido Democrata, anunciou no dia 21 que não buscará a reeleição. A publicação foi feita primeiro no Twitter/X, e sua declaração pública foi feita três dias depois.
Depois do bloqueio, a plataforma foi utilizada para divulgar outras informações urgentes.
- Hezbollah – a morte do líder do Hezbollah, Hasan Nasrallah, em Beirute (Líbano), depois de um ataque israelense, foi divulgada em primeira mão por um oficial do Exército de Israel na plataforma. Com o Twitter/X bloqueado, a mídia brasileira publicou a notícia depois de veículos jornalísticos de outros países;
- Líbano – o início da operação militar terrestre israelense no sul do Líbano foi anunciado na segunda-feira 30 pelo Exército de Israel no Twitter/X. As Forças de Defesa de Israel (FDI) também usam o Telegram para divulgar informações, mas o canal tem só 142.000 inscritos no total.
- Exílio de González – a ida de Edmundo González, opositor do ditador Nicolás Maduro, foi anunciada pelo ministro das Relações Exteriores espanhol, José Manuel Alvarez, também no Twitter/X. A chegada de González à Espanha, em 8 de setembro, foi divulgada pela líder opositora María Corina na mesma rede social.
A oposição na Venezuela tem usado o Twitter/X para criticar Nicolás Maduro depois das eleições de 28 de julho, nas quais ele “garantiu” mais um mandato de seis anos, gerando críticas internacionais.
Em 15 de setembro, houve um segundo atentado contra Donald Trump, que foi alvo de tiros perto de seu campo de golfe na Flórida. O Serviço Secreto usou o Twitter/X para informar que está investigando o caso junto com a polícia de Palm Beach. Kamala Harris também expressou solidariedade a Trump pelo X.
Segundo o Poder360, embora o Twitter/X nem sempre seja a principal fonte de notícias, ele ajuda a destacar temas que poderiam passar despercebidos. No Brasil, muitos lamentaram que assuntos importantes tenham perdido visibilidade por causa do bloqueio da plataforma.
Esquerda defende bloqueio
Em 17 de setembro, mais de 50 intelectuais de esquerda assinaram uma carta apoiando o bloqueio do X. Eles afirmaram que “todos que defendem valores democráticos devem apoiar o Brasil em sua busca por soberania digital.” No entanto, não mencionaram que pelo menos 30 deles continuavam usando seus perfis na plataforma.
Entre os signatários estão nomes como Gabriel Zucman, Thomas Piketty, e os brasileiros José Graziano, Helena Martins, Marcos Dantas e Sergio Amadeu da Silveira.
O sociólogo Muniz Sodré argumentou em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo no sábado, 28, que o bloqueio mostrou que a rede não é indispensável quanto diz ser e que só haveria “censura” à liberdade de expressão se veículos de mídia ou jornalistas fossem suspensos. Sodré, no entanto, não mencionou a lista de informações que, nos últimos 30 dias, foram publicadas primeiro no Twitter/X e o impacto disso para brasileiros sem acesso à rede.
As redes alternativas ao Twitter/X têm poucos usuários no Brasil. Eis o total de cada uma das redes e do Twitter/X no país:
- Twitter/X – 21 milhões;
- Bluesky – 4 milhões;
- Threads – 3,3 milhões.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi uma das primeiras autoridades a se cadastrar no Threads, junto com ministros e deputados. O número de seguidores é bem menor em comparação ao que ele tem no Twitter/X, o que também acontece com outros políticos.
Em entrevista realizada na segunda-feira 30, no programa Roda Viva, da TV Cultura, a presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, também defendeu a decisão de suspender o Twitter/X no Brasil.
“Em um Estado soberano, todos nós, cidadãos, e todas as empresas que atuam aqui, incluindo as plataformas, que também são empresas, precisam cumprir a lei do país. É assim em qualquer lugar”, declarou. “O Brasil não é menor, o Brasil não é o quintal de ninguém.”
A ministra disse não poder avaliar se houve redução da disseminação de fake news desde o início do bloqueio do X. “Não tenho dado sobre isso. O que eu sei é que, há 6 meses, 8 meses, todo o discurso, inclusive da imprensa, e presto muita atenção ao que a imprensa fala, porque sei que ela me ajuda a melhorar, era que esta eleição seria uma eleição em que o grande problema seria esse. Não foi”, acrescentou.
Ela afirmou, ainda, avaliar que não houve impacto para a liberdade de expressão com o bloqueio do Twitter/X. “Não tenho critério para medir o impacto, mas também não acredito que tenha tido. E isso mostra sempre que somos capazes de tocar a vida com outras alternativas”, concluiu.
E mais: “Suprema ignorância digital”, de Rachel Díaz