O bilionário canadense Robert G. Miller, acusado de abuso sexual de menores, teve dois de seus imóveis apreendidos pela Justiça do país nesta terça-feira, 19. O caso guarda muitas semelhanças com as acusações contra Jeffrey Epstein, magnata norte-americano suspeito por tráfico sexual.
A ação resulta de um pedido de quatro mulheres, que entraram com um pedido de US$ 30 milhões em indenizações, sob a alegação de que ele as abusou quando eram menores. A polícia canadense também prendeu Teresita Fuentes, de 67 anos, acusada de colaborar com o bilionário no aliciamento de menores para fins sexuais.
O juiz Serge Gaudet, da Corte Superior de Quebec, autorizou o pedido de apreensão antes do seu julgamento, pois acredita na possibilidade de que o magnata do setor de eletrônicos, de 81 anos, tente ocultar seus bens. Gaudet considerou “preocupante” que o bilionário não possua uma única conta bancária em seu nome e que administre bens registrados em nomes de terceiros.
As quatro mulheres alegam que foram recrutadas, ainda no ensino médio, para ter relações sexuais com ele em troca de dinheiro e presentes. Elas disseram ter recebido milhares de dólares em dinheiro, além de roupas, bolsas e sapatos de grife. Também alegaram que Miller oferecia gorjetas caso recrutassem suas amigas.
Elas acreditam que não se trata de casos isolados, mas de uma rede de abuso sexual de meninas e jovens. Miller foi preso em maio deste ano, alvo de 21 acusações relacionadas a crimes sexuais que envolvem dez denunciantes. Muitas delas eram menores de idade na época dos supostos abusos — uma menor de 14 anos. Isso ocorreu entre os anos de 1994 e 2016. No entanto, Miller foi solto pela idade avançada e saúde fragilizada.
Ele também enfrenta uma ação coletiva que o acusa de fornecer dinheiro e presentes a dezenas de menores em troca de sexo. Ao todo, a ação contempla cerca de 50 possíveis vítimas, algumas com 11 e 12 anos na época dos crimes. A Corte de Quebec estima que todo o julgamento leve cerca de cinco semanas para ser concluído, dada a gravidade do caso e a quantidade de vítimas.
Miller emitiu uma declaração na qual afirma ser inocente e alega que “a motivação clara por trás deste caso, que remonta a 30 anos, é um ganho financeiro fácil” à sua custa. Ao todo, Miller é acusado de agressão sexual, indução à prostituição, exploração sexual e relações sexuais com menores em troca de remuneração.
Segundo seus advogados, sua condição de saúde é “extremamente frágil”. Acamado desde 2022 com Doença de Parkinson, da qual sofre há quase 30 anos, ele depende de nebulização com oxigênio e é incapaz de se alimentar ou se banhar sozinho. Eles argumentaram que sua presença no tribunal poderia colocar sua vida em risco e violaria seu direito a um julgamento justo, já que ele não pode se defender.
Por isso, a Justiça canadense decidiu que Miller pode ser interrogado por escrito. “O tribunal considera que realizar um depoimento oral em um ritmo minimamente sustentado e com respostas significativas colocaria a vida de Miller em risco”, escreveu o juiz Christian Immer, que considera que o interrogatório escrito “dá a Miller tempo suficiente para formular uma resposta inteligível”.
A polícia abriu uma investigação sobre as acusações contra o bilionário em 2009, mas, naquela época, a promotoria decidiu não prosseguir com as denúncias. Vítimas e testemunhas acreditam que isso se deve, em parte, ao fato de muitas jovens não saberem a verdadeira identidade do empresário.
Leia mais:
Apesar de ser um dos homens mais ricos do Canadá, Miller era reservado, raramente participava de eventos sociais e nunca era fotografado. Jovens que o conheciam afirmaram que ele dizia ser um executivo de rádio norte-americano, chamado Bob Adams.
A segunda investigação ocorreu recentemente, depois de reportagens da rede estatal canadense CBC em fevereiro de 2023. Presidente e fundador da Future Electronics, terceira maior distribuidora de eletrônicos do mundo, Miller renunciou ao cargo horas depois da denúncia, sob a alegação de que se concentraria em proteger sua reputação.
Métodos são semelhantes aos de Jeffrey Epstein
O modus operandi de Robert Miller é similar ao do magnata norte-americano Jeffrey Epstein. Ele foi acusado de liderar, junto de sua ex-namorada Ghislaine Maxwell, uma rede de exploração e abuso sexual que incluía mulheres jovens e menores de idade. Preso em julho de 2019, ele foi encontrado morto na prisão em agosto do mesmo ano, em circunstâncias que indicavam suicídio.
O bilionário era conhecido por organizar e participar de eventos exclusivos com personalidades, como políticos e figuras públicas internacionais, como Bill Clinton e o príncipe Andrew. As primeiras acusações contra Epstein surgiram em 2005, quando os pais de uma menina de 14 anos o denunciaram por estupro. A jovem alegou ter sido abusada sexualmente pelo bilionário em sua mansão em Palm Beach, na Flórida.
A menina contou o ocorrido e identificou outras duas menores que estavam na casa naquele mesmo dia, que por sua vez identificaram outras meninas. Epstein negou as acusações, alegou que o relacionamento era consensual e que não sabia a idade das garotas.
Uma investigação do FBI identificou outras 36 mulheres, muitas delas menores de idade, que afirmaram ter sido abusadas sexualmente por Epstein. As investigações revelaram um padrão de comportamento: Epstein atraía jovens vulneráveis e as oferecia dinheiro, presentes e promessas de uma vida melhor em troca de “massagens”, para depois abusar delas sexualmente.
Em 2008, para evitar um julgamento, Epstein fechou um acordo com os promotores. Ele se declarou culpado de duas acusações por solicitar prostituição de menores e cumpriu apenas 18 meses de prisão, em regime semiaberto. Assim, escapou de uma possível sentença de prisão perpétua. Enquanto preso, podia sair para trabalhar seis dias por semana.
Uma década depois, em 2019, Epstein foi preso novamente, desta vez sob acusações de tráfico sexual e conspiração para cometer tráfico sexual de menores. Estes últimos recebiam dinheiro para recrutar suas amigas, tal qual Miller é acusado de fazer. As autoridades alegaram que ele havia operado uma vasta rede de tráfico sexual: mais de 150 nomes foram citados em um único processo.
As investigações também revelaram o papel de Ghislaine Maxwell, ex-namorada de Epstein, na rede de abusos. Assim como Fuentes é investigada, ela era responsável por recrutar jovens para Epstein e por oferecer empregos e oportunidades a elas. Várias vítimas de Epstein afirmaram que a socialite também participava dos abusos. Em 2022, ela foi condenada a 20 anos de prisão.