A combinação entre forte crescimento da atividade econômica, alta do dólar e ocorrência de fatores climáticos explica o descumprimento da meta de inflação de 2024. Ao menos é o que consta na carta aberta enviada pelo novo presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
“A inflação de 2024 ficou acima do intervalo de tolerância em decorrência do ritmo forte de crescimento da atividade econômica”, começou Galípolo, no texto publicado pelo BC na noite desta sexta-feira, 10. “Da depreciação cambial e de fatores climáticos, em contexto de expectativas de inflação desancoradas e inércia da inflação do ano passado.”
Pela manhã, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística divulgou que o IPCA, índice oficial de preços, ficou em 4,83% no ano passado — acima do teto da meta, de 4,5%, e acelerando frente a 2023 (4,62%). O centro do alvo era de 3%.
Alta do dólar e piora da percepção fiscal
A alta de 24,5% do dólar frente ao real em 2024 foi o fator que mais contribuiu para que a inflação superasse o teto da meta no ano passado, segundo o presidente do BC.
Comparando-se as médias da taxa de câmbio no último trimestre de 2023 e 2024, de R$ 4,95 e R$ 5,84, respectivamente, o dólar subiu 18% frente ao real. Isso responde por 1,21 ponto porcentual do desvio da inflação frente à meta, segundo o BC.
Na carta, Galípolo afirma que a depreciação cambial ocorreu principalmente de fatores domésticos, complementada pela apreciação global do dólar norte-americano. O presidente do Banco Central cita que esse processo de deterioração começou em abril de 2024 e se intensificou ao longo do ano. Nesse sentido, menciona a piora da percepção sobre o cenário fiscal do país.
“O fato de o real ter sido a moeda de maior depreciação em 2024, considerando seus pares ao nível internacional e os países avançados, sugere que fatores domésticos e específicos do Brasil tiveram papel expressivo nesse movimento cambial”, escreveu Galípolo. “No âmbito doméstico, a percepção dos agentes econômicos sobre o cenário fiscal afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio.”
O dólar escalou no final do ano passado depois do anúncio do pacote de contenção de gastos do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Tais ações foram consideradas pelos analistas como insuficiente para o reequilíbrio das contas públicas.
A parcela dos efeitos diretos e indiretos do repasse cambial, segundo Galípolo, ainda deve se efetivar em 2025.
Na carta, Galípolo pondera, no entanto, que a queda no preço internacional do petróleo amorteceu o impacto da depreciação cambial. O preço do petróleo, depois de crescer até abril, entrou em trajetória de queda. “Essa redução refletiu evolução menor que a esperada da demanda global e crescimento maior que o esperado da oferta.”
Presidente do Banco Central fala em crescimento mais forte
Já o crescimento da atividade econômica, que surpreendeu para cima ao longo do ano, foi forte e também contribuiu para a inflação acima do intervalo de tolerância, na avaliação de Galípolo. Esse desempenho, disse, foi bem acima das expectativas do BC e dos analistas.
Na carta, ele destaca o significativo crescimento da demanda doméstica, em especial do consumo das famílias e da Formação Bruta de Capital Fixo, os investimentos, que atingiram crescimento de 5,1% e 6,6%, respectivamente, no acumulado até o terceiro trimestre do ano.
Compromisso de convergência à meta
Galípolo afirmou que a magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação. Além disso, ele falou em respeito aos limites estabelecidos e dependência da evolução da dinâmica da inflação.
“Vários riscos se materializaram, tornando o cenário mais adverso, mas menos incerto, permitindo maior visibilidade para que o comitê oferecesse uma indicação de como antevia as próximas decisões”, escreve o presidente do Banco Central na carta. “A magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerá da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.”
Atualmente, a Selic, que é a taxa básica de juros do Brasil, está em 11,25% ao ano. Nesse sentido, o Comitê de Política Monetária do Banco Central já sinalizou mais duas altas de um ponto porcentual nas próximas reuniões. Na carta desta sexta-feira, Galípolo também ressaltou que a autoridade monetária tem definido a taxa Selic para assegurar a convergência da inflação aos limites estabelecidos. Além disso, garantiu que o BC tem tomado providências para que o IPCA atinja a meta contínua.
No documento, Galípolo cita ainda que, de acordo com as projeções do cenário de referência do relatório de inflação de dezembro, a inflação ficará acima do limite do intervalo de tolerância até o terceiro trimestre de 2025. De acordo com ele, depois disso haverá trajetória de declínio, mas ainda permanecendo acima da meta.
O presidente do BC citou que, de acordo com a pesquisa Focus do dia 3 de janeiro de 2025, a taxa de juros real alcançará pico de 9,8% no segundo trimestre de 2025. Depois, por fim, entrará em trajetória de queda, alcançando 6,4% no final do horizonte considerado, referente ao segundo trimestre de 2027.
Revista Oeste, com informações da Agência Estado