A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) determinou a suspensão de todas as operações de transporte aéreo dos Correios a partir de 4 de junho, depois de identificar falhas reiteradas no cumprimento das normas que regulam o envio de produtos perigosos por via aérea.
A medida atinge diretamente as empresas Sideral Linhas Aéreas e Total Linhas Aéreas, únicas cargueiras contratadas atualmente pela estatal para esse tipo de serviço, de acordo com apuração do portal UOL.
A decisão foi motivada por episódios recentes com o transporte inadequado de baterias de íon de lítio — material altamente inflamável e sujeito a rigoroso controle regulatório. Um dos casos mais graves ocorreu em novembro do ano passado, quando uma aeronave da Total, em operação contratada pelos Correios, transportava esse tipo de carga sem autorização da Anac.
O voo precisou fazer um pouso de emergência no aeroporto de Guarulhos (SP) depois de registrar um incêndio interno. O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) ainda apura oficialmente o incidente, mas os indícios sugerem ignição provocada pelas baterias.
Desde 2016, a Anac possui normas específicas sobre o transporte de produtos perigosos, como baterias de lítio e outros materiais inflamáveis. No entanto, segundo apuração da agência, sucessivas gestões da estatal descumprem os procedimentos exigidos.
A situação se agravou depois do acidente, quando vieram à tona denúncias de que a diretoria dos Correios teria emitido um ofício que autorizava o transporte aéreo desse tipo de material, em contrariedade aos regulamentos vigentes — que determinam, em muitos casos, o uso de transporte terrestre.
O modelo atual de envio da chamada “mala postal” limita o controle sobre o conteúdo da carga. Os Correios entregam os volumes prontos para o embarque: embalados, fechados e paletizados, sem qualquer possibilidade de inspeção pelas empresas contratadas. Segundo as regras da Anac, cabe exclusivamente aos Correios declarar a presença de materiais perigosos na carga.
A responsabilidade de informar recai sobre a estatal, que deve comunicar às companhias aéreas o tipo, a quantidade e as características dos produtos. Apenas com essas informações, transportadoras como Sideral e Total — ambas certificadas para o transporte de produtos perigosos — podem aplicar os procedimentos específicos de segurança e excluir os materiais proibidos.
Falta de transparência no envio da mala postal pelos Correios
Na prática, esse fluxo não tem sido respeitado. Segundo apuração da agência, o que ocorre é que as companhias aéreas recebem a carga já lacrada e a embarcam sem conhecimento pleno do conteúdo.
Embora os pilotos tenham autoridade para exigir a descrição da carga e vetar o embarque de artigos inadequados, essa prerrogativa tem sido esvaziada, pois a comunicação entre as partes não tem garantido transparência sobre o material transportado.
Depois do acidente de novembro, a Anac tentou evitar a suspensão imediata das operações. Em dezembro, impôs uma série de medidas cautelares para garantir a adequação das práticas adotadas, sem afetar de forma prejudicial a companhia.
No entanto, segundo avaliação da agência, essas determinações foram apenas parcialmente cumpridas por parte dos Correios e das empresas contratadas. Diante da persistência dos riscos, a suspensão se tornou inevitável. A retomada das operações dependerá da total conformidade com as normas de segurança.
Em resposta, os Correios afirmaram que estão “comprometidos com o cumprimento integral da legislação vigente”. Em nota, a estatal alegou que “o problema decorre de práticas herdadas de gestões anteriores e representa mais um desafio que a atual administração está enfrentando para garantir a regularização completa do serviço”.
Ainda segundo a empresa, “está sendo adotado todo o esforço necessário para solucionar a situação no prazo estipulado, reafirmando o compromisso com a segurança das operações e o atendimento à população”.
Procurada pela redação do UOL, a Total Linhas Aéreas declarou que “ainda não foi comunicada de nenhuma decisão da Anac sobre a suspensão das operações decorrente sobre suposta falha no cumprimento de normas”. Já a Sideral Linhas Aéreas foi contatada, mas ainda não se posicionou.
A suspensão de todos os voos de carga postal afeta diretamente a logística dos Correios, sobretudo no transporte interestadual e em regiões onde a distribuição depende de malhas aéreas. A agência reguladora não comentou publicamente a decisão.