sexta-feira, novembro 15, 2024
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além de mamutes, outras espécies podem voltar

No mês passado, o Olhar Digital informou que cientistas querem trazer de volta à vida, ainda nesta década, os mamutes, que estão extintos há dez mil anos. Ficção científica? Nem tanto, talvez. No que já está sendo chamado de “desextinção”, outros pesquisadores estão empolgados com a hipótese de reviver animais que não existem há eras. Além disso, a empresa estadunidense de biotecnologia quer trazer de volta outras espécies por meio da engenharia genética.

O g1 até compara a situação com a saga “Jurassic Park”, até porque o enredo da situação é similar. A diferença é que eles não querem criar um local exclusivo para estes animais habitarem.

Além do mamute-lanoso, outras espécies que estão sendo estudadas para serem recriadas são o lobo-da-tasmânia, o pombo-passageiro e o saudoso dodô. Os que defendem a desextinção entender ser grande avanço científico, uma vez que a humanidade poderia, caso tenha sucesso nessas experiências, evitar a exitinção de animais que estão sob ameaça ou prestes a entrar na lista de riscos.

Ao g1, Ben Novak, cientista-chefe da Revive & Restore, uma das principais empresas da área, “os benefícios que a biotecnologia pode trazer para espécies ameaçadas e ecossistemas não serão nada comuns — serão transformadores”.

Vale ressaltar, contudo, que reviver animais que pisaram na Terra há milhões de anos também suas questões ecológicas e éticas. Um argumento comum utilizado pelos que rechaçam a ideia de desextinção é o fato de a técnica poder demonstrar ineficiência quanto ao uso de recursos de conservação, uma vez que eles poderiam ser utilizados com as espécies que ainda existem e que correm risco de desaparecer.

Um dos que pensa assim é Luís Fábio Silveira, vice-diretor do Museu de Zoologia da USP. “Gastar centenas de milhões de dólares para trazer de volta um mamute híbrido com alguma coisa para soltar na conservada Sibéria é contraproducente quando estamos, de fato, lidando com a sexta extinção em massa em meio a uma crise climática sem precedentes.”

No meio-termo, há um consenso: o de que desenvolver novas técnicas de biotecnologia nessa área estão avançando. Contudo, seguem distantes da realidade (mesmo que muitos já sonham e transformar isso em algo real daqui a apenas quatro anos).

Saudoso dodô também pode ser “desextinto” (Imagem: Colossal Geosciences)

Quem quer praticar a desextinção e quais espécies extintas estão sob estudo?

  • Hoje, ao menos duas grandes companhias estão de olho nessa área: a Revive & Restore e a Colossal Biosciences. Além disso, existem, ao menos, dois projetos relacionados: o Tauros e o Quagga;
  • Com 12 anos de existência, a Revive & Restore estava estudando a desextinção do mamute-lanoso, última espécie de mamute que se adaptou às regiões setentrionais terrestres, mas, agora, está nas mãos da Colossal;
  • Agora, a Revive trabalha com espécies extintas e ameaçadas. Em sua lista, estão o pombo-passageiro (que já viveu em grandes áreas da América do Norte) e a doninha-de-patas-pretas (a qual deve ser clonada para restaurar sua diversidade genética);
  • Por sua vez, Tauros e Quagga querem “ressuscitar” animais extintos via reprodução seletiva, diferente das propostas de Revive e Colossal, que analisam uma desextinção via engenharia genética;
  • O Tauros quer recriar o auroque, parente do gado atual. Já o Quagga quer trazer de volta justamente a quagga, subespécie da zebra que foi extinta no fim da década de 1870.

No passado, ao menos por um tempo, a técnica até que funcionou. Foi em 2003, quando cientistas tentaram trazer de volta o íbex-dos-Pirenéus (Capra pyrenaica pyrenaic), uma espécie de cabra-selvagem.

Eles obtiveram sucesso na clonagem do animal a partir de uma amostra de DNA preservada. Mas Isabella, como foi chamada, resistiu somente alguns minutos após ter nascido.

Esta tentativa foi importante para tornar a desextinção algo real, contudo, ainda faltam alguns passos para que a recriação completa de uma espécie seja conquistada (como bem disse o ex-astronauta Neil Armstrong, “um pequeno passo para o homem, um grande salto para a humanidade”).

A seguir, elencamos quais espécies cada empresa visa tirar da extinção e seus respectivos prazos.

Desenho de dois pombos-passageiros
Pombo-passageiro viveu na América do Norte (Imagem: Revive & Restore)

Revive & Restore: doninhas e pombos

Novak avalia que será possível recriar os pombos-passageiros (já) entre 2029 e 2032 e que, para tanto, serão desenvolvidas células-tronco de aves e aprimoradas técnicas de edição genética.

Ou seja, pombos que estão vivos terão seus DNAs modificados para se parecerem com os extintos. O cientista-chefe da organização afirma que, para chegar a tal resultado, será preciso estudar o DNA dos animais expostos em museus, pois, assim, será mais fácil identificar quais as características que faziam com que a espécie formasse enormes bandos e influenciasse seus habitats.

Durante a década de 2030, nosso cronograma é produzir as primeiras gerações de novos pombos-passageiros e trabalhar com proprietários de terras para criar um número suficiente de aves para liberá-las na natureza entre 2040 e 2050.

Ben Novak, cientista-chefe da Revive & Restore, em entrevista ao g1

Contudo, os avanços obtidos pela empresa não foram tão significativos (ao menos por enquanto): eles sequenciaram o genoma do pombo-torcaz, importante para compreender quais características genéticas são restauráveis no pombo-passageiro e para investigações sobre o impacto ecológico do animal nas florestas atuais.

Durante a década de 2030, nosso cronograma prevê a produção das primeiras gerações de novos pombos-passageiros e o envolvimento de proprietários de terras na criação de número suficiente de aves para podermos liberá-las na natureza entre as décadas de 2040 e 2050. No entanto, é provável que leve um século até que esses bandos alcancem tamanho suficiente para ter impacto significativo nos ecossistemas florestais.

Ben Novak, cientista-chefe da Revive & Restore, em entrevista ao g1

Já no projeto das doninhas-de-patas-pretas, o avanço foi bem maior. Três clones já nasceram com sucesso: Elizabeth Ann, em 2020, e as gêmeas Noreen e Antonia, nascidas há pouco.

Elas são geneticamente idênticas a Willa, uma das últimas doninhas presentes na natureza. Ela possui três vezes mais variações genéticas do que as que vivem atualmente. Isso pode ajudar bastante para que a espécie sobreviva.

Mas nem tudo são flores. Primeiro que a diversidade genética das doninhas é limitada, pois as que estão vivas descendem de sete indivíduos somente. Dessa forma, elas são vulneráveis a doenças e possuem menos condições de adaptabilidade a condições ambientais distintas.

Outro ponto tem a ver com os clones. A mais velha não conseguiu se reproduzir por ter um problema de saúde que veio com sua clonagem, enquanto as recém-nascidas só podem reproduzir ao atingirem a maturidade.

Colossal Biosciences: dodô, mamute e lobo-da-tasmânia

Por sua vez, a Colossal tem planos similares aos da Revive, mas também tem incertezas quanto ao comportamento dos animais em um mundo totalmente diferente de quando eles o habitavam (os mamutes, por exemplo, jamais viram um ser humano na vida; ao menos, não o Homo sapiens).

O dodô, por exemplo, pertencia à família dos pombos e foi muito caçada no século XVII (não à toa, vivam isolados e tinham medo de nós). A Colossal já sequenciou o DNA da espécie a partir de informações genéticas colhidas de um crânio de um espécime pertencente ao Museu de História Natural da Dinamarca.

Agora, a empresa analisa como usar galinhas como “hospedeiras” de embriões com o DNA do dodô. Ou seja, espera-se que as galinhas gerem filhotes similares ao dodô, portanto, seria uma espécie híbrida. Contudo, as pretensões da Colossal são maiores, querendo, no futuro, efetivamente desextinguir o dodô original.

Não foi dado um prazo para isso, apesar de a companhia planejar comparar o DNA do animal com seus parentes, tais como o pombo Nicobar, que mora perto de onde o dodô vivia, em pequenas ilhas do Oceano Índico. Isso será feito para identificar as características que precisam ser recuperadas do dodô. Ao menos, é o que a Colossal garante.

Um ótimo avanço que ela já fez para além dos dodôs, tem a ver com os mamutes. Duas células-tronco de elefante foram produzidas. Elas podem ser modificada para incluir genes do animal extinto.

O próximo passo é modificar, geneticamente, tais células e acrescentá-las a um óvulo de elefante, mais essa será uma tarefa espinhosa, pois não se sabe se os genes alterados serão aceitos pelas células de elefante, causando um desenvolvimento malfeito do embrião.

Já o lobo-da-tasmânia deverá ter ajuda de um parente: o dunnart de cauda gorda, visando realizar as modificações que sejam necessárias no material genético do animal.

A equipe já fez 300 modificações no DNA do dunnart, de modo que suas células viraram células de seu primo extinto. Recentemente, eles também conseguiram extrair RNA de uma cabeça de lobo-da-tasmânia preservada há 110 anos. O último espécime deles vivia em cativeiro e morreu em 1936.

Doninha clonada recém-nascida nas mãos de um cientista
Esta é uma das doninham clonadas recém-nascidas; ela só poderá reproduzir quando chegar à maturidade (Imagem: Revive & Restore)

Projeto Tauros: auroques

Como falamos mais acima, os projetos têm ideias um pouco distintas de Revival e Colossal, pois o método a ser utilizado é o da reprodução seletiva. No caso do Tauros, eles querem reintroduzir o auroque, bovino selvagem que vivia na Europa, Ásia e norte da África.

Para tanto, o método a ser utilizado é o “back-breeding”, no qual eles cruzam vacas com traços físicos e comportamentais parecidos com os dos auroques, de modo a criar um animal similar ao original.

Eles já estão tendo resultados, no mínimo, interessantes: várias gerações de acas estão sendo criadas e já estão se aproximando das características originais do auroque.

Projeto Quagga: zebras menos listradas

O projeto Quagga trabalha na África do Sul com o mesmo método de reprodução seletiva do Tauros, mas o alvo é o quagga, uma espécie de zebra que parou de habitar a Terra há mais de cem anos.

Para isso, eles querem usar a zebra-da-planície, equídeo da zona africana. A equipe selecionará animais com o mesmo padrão de listras característico do quagga, que tinha manchas marrons apenas na cabeça e pescoço.

Será que os objetivos de desextinção serão alcançados?

A bióloga e paleontóloga Taíssa Rodrigues entende que, no caso da desextinção tentada por meio de engenharia genética, um dos principais percalços é a falta de um genoma completo dos extintos.

Já com relação à técnica de reprodução seletiva, a especialista entende que só seria possívelcriar híbridos, como entre o elefante e o mamute-lanoso, por meio de melhorias em iniciativas que impactem a conservação das espécies vivas hoje em dia.

A própria empresa aponta é que não é possível ‘reviver’ ou ‘desextinguir’ o mamute-lanoso. Necessariamente, seria um híbrido. E, para isso, eles teriam que desenvolver novas técnicas que precisam passar pela reprodução de elefantes por inseminação artificial, por exemplo, algo que hoje ainda não é viável.

Taíssa Rodrigues, bióloga e paleontóloga, em entrevista ao g1

Além disso, Rodrigues afirma que, mesmo que a reprodução assistida dê resultado, a caça de elefoantes, principal problema para preservá-los, não estaria sendo abordado.

Estimativas da Organização Não Governamental (ONG) WWF apontam que, nos últimos anos, cerca de 20 mil elefantes são assassinados anualmente na África para roubo de suas presas, feitas de marfim, material muito cobiçado. Sem contar que eles perderam 30% de seu habitat.

“Já o prazo de 2028 me parece inviável. As técnicas necessárias para isso precisam antes ser demonstradas em elefantes”, destaca a especialista.

Última quagga viva
Última quagga do mundo morreu há mais de cem anos (Imagem: Domínio público)

Joe Benett, professor no Departamento de Biologia da Universidade Carleton (Canadá) tem fala parecida e considera que, no escopo da viabilidade, uma espécie que voltasse da desextinção até poderia, supostamente, ajudar a restaurar seu ambiente original, porém, isso é muito improvável.

Afinal, a mudança provocada por humanos nos habitats onde essas espécies viviam é irreversível, bem como as ameaças que os extinguiram seguem existindo. Ele usa como exemplo os mamutes. O aquecimento do Ártico deixa a adptação dessa espécie à sua vida antiga mais difícil ainda.

[Caso essas pesquisas deem certo,] a maioria das espécies ‘ressuscitadas’ terá DNA predominantemente de espécies existentes devido à falta de material genético completo e à necessidade de um pai substituto.

No caso do mamute-lanoso, é irreal esperar que um animal que se assemelhe a ele, mas que seja principalmente um elefante asiático, consiga prosperar no Ártico. Na verdade, essa criatura pode estar mais adaptada à selva asiática, já que a tundra e a floresta tropical são ambientes extremamente diferentes.

Joe Benett, professor no Departamento de Biologia da Universidade Carleton (Canadá), em entrevista ao g1

Via Olhar Digital

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