Estudos do Instituto Mamirauá em Tefé, no Amazonas, evidenciaram uma realidade preocupante: as águas de todos os lagos da Amazônia vêm esquentando nas últimas décadas em escalas sem precedentes. Os mais afetados são os mamíferos aquáticos, como botos: foram mais de 200 animais mortos em apenas um mês.
O pico aconteceu no ano passado, com o próprio lago Tefé ultrapassando os 40°C.
Água da Amazônia vem esquentando em ritmo preocupante
- O Instituto Mamirauá analisou dados da temperatura da água de lagos da Amazônia obtidos por satélites;
- O estudo está na revisão por pares e teve os resultados preliminares apresentados na 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que aconteceu no dia 11 de julho em Belém (Pará);
- Os pesquisadores constataram a tendência de aumento de 0,6ºC por década desde 1990 em 25 lagos da Amazônia central;
- De acordo com Ayan Fleischmann, coordenador do estudo, o aquecimento é generalizado, expressivo e aconteceu em todos os lagos da Amazônia.
Pico de calor na Amazônia está matando botos
A temperatura é sem precedentes e teve um pico em 2023, durante uma seca extrema na Amazônia. Na ocasião, o lago Tefé superou os 40ºC a dois metros de profundidade. Os pesquisadores atribuem o aquecimento acelerado às mudanças climáticas.
O aumento na temperatura, por sua vez, causou a morte de 209 botos em um mês. A maioria deles eram botos-cor-de-rosa (alguns eram tucuxi). Na época, o Olhar Digital noticiou o caso aqui.
Segundo Fleischmann (que integrou uma força-tarefa para identificar a morte dos animais), especialistas em mamíferos aquáticos já ficam em alerta quando encontram três carcaças de botos em algumas semanas. Em setembro do ano passado, quando a água atingiu 40ºC, foram 70 botos mortos em um único dia, algo nunca visto.
Daí surgiu a Operação Emergência Botos Tefé.
A conclusão foi que a culpada era a hipertemia, uma condição no qual o corpo fica com uma temperatura mais elevada do que o normal. Em setembro do ano passado, o aquecimento das águas se uniu a um período de seca e ausência de nuvens, que deixou os lagos desprotegidos. A água estava turva, o que facilitou o aquecimento.
Conforme o pesquisador à Agência FAPESP, a amplitude extrema de temperatura e a falta de refúgio do calor levou os botos a óbito.
Risco para águas da Amazônia, botos e outros animais continua
Depois da operação, os pesquisadores continuaram monitorando as águas da Amazônia. Em outras ocasiões depois da seca, os lagos voltaram a medir temperaturas extremas, como 37ºC.
Fleischmann alertou que o aquecimento generalizado arrisca os ecossistemas aquáticos, os animais que vivem por lá e as comunidades ribeirinhas que dependem dos lagos para viver.
Ele alertou para a necessidade de programas de acesso à água, como construção de cisternas para captação de água da chuva, de poços mais profundos e da ampliação do tratamento de água.
As pessoas não tinham água da chuva para beber durante a seca porque não tinham capacidade de armazenar. Elas tiveram de tomar água direto do rio, que estava extremamente barrenta e imprópria para o consumo. Não é porque estamos na beira do maior rio do mundo que o acesso à água de qualidade para o consumo é garantido
Ayan Fleischmann