sábado, novembro 23, 2024
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Adriano Imperador abre o jogo sobre bebida, drama na Itália e sossego na favela

Adriano Imperador fez história na Europa, marcou seu nome com a camisa da Seleção Brasileira e virou ídolo do Flamengo. Mas sua vida fora dos gramados também esteve constantemente nos holofotes e em muito casos, chamava mais a atenção do que sua genialidade com a bola.

Em uma carta aberta publicada pelo The Players Tribune, baseado no livro sobre suas memórias, Adriano faz fortes revelações acerca de sua vida antes e durante a carreira no futebol.

Relação com bebida alcoólica, saudade do pai “Mirinho”, peladas na várzea e refúgio encontrado na Vila Cruzeiro, comunidade carioca onde cresceu, são alguns temas abordados por Adriano de forma sincera.

Você sabe o que é ser uma promessa?

Eu sei.

Inclusive uma promessa não cumprida.

O maior desperdício do futebol: Eu.

Gosto dessa palavra, desperdício.

Não só por ser musical, mas porque me amarro em desperdiçar a vida. Estou bem assim, em desperdício frenético. Curto essa pecha.

Mas nunca amarrei uma mulher a uma árvore, como dizem.

Não uso drogas, como tentam provar.

Não sou do crime, mas, claro, poderia ter sido.

Não curto baladas.

Vou sempre ao mesmo lugar, o quiosque do Naná, se quiser me encontrar, dá uma passada lá.

Eu bebo todos os dias sim, e os dias não muitas vezes também.

Por que uma pessoa como eu chega ao ponto de beber quase todos os dias?

Não gosto de dar satisfação para os outros. Mas aqui vai uma.

Porque não é fácil ser uma promessa que ficou em dívida. Ainda mais na minha idade.

Me chamam de Imperador.

Imagina isso.

Um cara que saiu lá da favela para ganhar o apelido de Imperador na Europa. Quem explica, cara? Eu não entendi até hoje. Talvez eu não tenha feito tanta coisa errada assim, não é?

Muita gente não sacou porque abandonei a glória dos gramados pra ficar aqui sentado bebendo em aparente deriva.

Porque em algum momento eu quis, e é o tipo de decisão difícil de voltar atrás.

Mas não quero falar disso agora. Quero que você me acompanhe em um rolé de cria.

Eu moro na Barra da Tijuca há muitos anos. Mas o meu umbigo está enterrado na favela.

Vila Cruzeiro. Complexo da Penha.

Sobe na garupa também. Vamo de moto. É assim que eu me sinto à vontade.

Vou avisar que tamo brotando na área. Hoje tu vai entender o que o Adriano realmente faz quando está com os seus parceiros em um lugar muito especial. Sem folclore ou manchete mentirosa de jornal. A real. À vera.

Anda, cara. Já tá amanhecendo. Daqui a pouco o trânsito vai estar todo parado. Tu não sabia, não? Daqui até a Penha pela Linha Amarela é rápido, poxa vida. Mas só se for nesse horário.

Partiu?

É mermo. Bem na entrada da comunidade. O campo do Ordem e Progresso. Porra, eu joguei mais futebol aqui do que no San Siro. Papo reto, neguinho.

Repara que pra entrar e pra sair da Vila Cruzeiro tem que passar na frente do campo. O futebol se impõe na nossa vida.

Aqui meu pai era feliz de verdade. Almir Leite Ribeiro. Pode chamá-lo de Mirinho, ele era conhecido assim por todo mundo. Um cara de conceito alto. Tô mentindo? Pergunta pra qualquer um.

No sábado ele acordava cedo, preparava a mochilinha dele e já queria descer logo pro campo. “Bora, xará. To te esperando. Vamo que hoje o jogo vai ser pegado”, ele dizia. O nosso time de várzea se chama Hang. Por que esse nome? Sei lá, merda. Quando eu conheci já era assim. Joguei durante muito tempo com a camisa amarela e azul. Pode crer. Igual a do Parma. Mesmo depois de ter ido pra Europa eu não abandonei a várzea.

Claro. Eu vinha de férias da Itália e não fazia outra coisa. Pegava o táxi do aeroporto e já mandava tocar direto aqui pro Cruzeiro. Puta merda. Não passava nem na casa da minha mãe antes.

Descia na entrada do morro, largava as malas e subia gritando. Ia bater na casa do falecido Cachaça, meu grande amigo, e do Hermes, outro parceiro de infância. Chegava esmurrando a janela “acorda, safado! Bora! Bora!”. O Jorginho, meu outro grande amigo de infância, se juntava e aí, esqueça tudo. Essa rapaziada pintava o sete com catorze. Só encontravam a gente dias depois. Rodávamos o complexo todo jogando bola, na resenha, de birosca em birosca. Nem cavalo aguenta!

Um dos grandes clássicos do Hang era contra o Chapa Quente. Jogamos até final de várzea contra eles. Eu já estava no Parma. Meu pai me falava todo dia. “Já te inscrevi no campeonato, xará. Os caras tão se tremendo. Eu tô há um mês avisando eles ‘meu negão tá chegando’. E eles respondem: ‘não vale, não, Mirinho’. Não tô nem aí. Tu vai jogar.”

Joguei mermo.

Com um copinho de Coca-Cola na mão, meu pai anunciou os onze titulares do Hang.

“Hangrismar no gol.

Boldo com Limão, Richard e Cachaça na zaga.”

Porra, Boldo com Limão era um cara amargo. Reclamava de tudo. O Richard tinha um chute que era tão potente — ou mais até — que o meu. Neguinho se tremia todo de ficar na barreira quando ele ia pra cobrança.

“Hermes na volância junto com o Alan.

Crézio na ponta direita e Jorginho na esquerda, nosso camisa sete.

No ataque Frank, Dingo, o dono da camisa 10, e Adriano.”

Dava pra jogar Champions League com esse time aí.

Calorão do Rio, típico de fim de ano. Música alta. Sambão. Cada morena andando pra cima e pra baixo que eu vou te falar… Papai do céu abençoe! Não tem nada melhor no planeta, negão.

Batemos campeões. Rojão na favela toda. Um foguetório bonito à pampa.

Foi nesse campo também que eu aprendi a beber. Meu pai ficava maluco, cara. Ele não gostava de ver ninguém tomando uma, muito menos a molecada.

Me lembro da primeira vez que me pegou com um copo na mão. Eu tinha 14 anos e a favela estava em festa. Era a estreia do refletor no campo do Ordem e Progresso e por isso armaram um futebol com churrasco.

Tinha gente à beça, aquela alegria tomando conta, típica da várzea, tá ligado? Pagode estralando, gente pra lá e pra cá. Eu ainda não era de beber. Mas quando vi a rapaziada toda tomando um negócio, rindo, eu falei: “aaaahhhh”. Não teve como, peguei um copo de plástico e enchi de cerveja. Aquela espuma amarga e ralinha descendo pela primeira vez teve um sabor especial. Um mundo novo de “diversão” se abria à minha frente. Minha mãe estava na festa e viu a cena. Ficou quieta, né? Já o meu pai… Puta que pariu. Quando me viu com o copo na mão, atravessou o campo naquele passo apressado de quem não pode perder o ônibus. “Pode parar”, ele disparou. Curto e grosso, como de costume. Eu falei :“ah, pô”. Minhas tias e minha mãe sacaram logo o movimento e tentaram apaziguar antes que a situação ficasse pior. “Poxa, Mirinho, ele tá com os amiguinhos dele, não vai fazer nada demais, tão ali rindo, brincando, deixa eles, o Adriano também já tá crescendo”, disse a minha mãe.

Não teve conversa.

O velho ficou louco. Arrancou o copo da minha mão e jogou fora na sarjeta mesmo. “Eu não te ensinei isso, xará”, ele disse.

O Mirinho era um líder da Vila Cruzeiro. Todo mundo respeitava. E ele dava o exemplo. Futebol era com ele. Uma das missões do Mirinho era evitar que a molecada se envolvesse com o que não devia. Ele tentava sempre trazer as crianças pra bola. Não queria ninguém de bobeira. Muito menos vacilando na escola. O pai dele bebia muito. Esse, sim, era alcoólatra. Morreu disso, inclusive. Então, toda vez que via a molecada tomando uma, meu pai não tinha dúvida. Lançava copos e garrafas que estavam pela frente no chão. Mas não adiantava, né? Então, a fera mudou de tática. Quando a gente se distraía, ele arrancava a dentadura e colocava no meu copo, ou no dos meninos que estavam comigo. O cara era danado. Que saudades dele…

Todas as lições que aprendi com meu pai foram assim, nos gestos. Não tínhamos conversas profundas. O velho não era de filosofar nem de ficar dando lição de moral, não. A retidão no dia a dia e o respeito que os outros tinham por ele era o que mais me impressionava.

A morte do meu pai mudou a minha vida pra sempre. Até hoje é um assunto que ainda não consegui resolver. E pra tu ver como são as coisas, a merda toda começou aqui, na comunidade que eu considero tanto.

A Vila Cruzeiro não é o melhor lugar do mundo. Muito pelo contrário.

É perigoso pra caramba. A vida é dura. As pessoas sofrem. Muitos amigos precisam seguir outros caminhos. Olha pro lado que tu percebe. Se eu for parar pra contar todos os conhecidos que já se foram, a gente vai ficar aqui falando por dias e dias… Que papai do céu os abençoe. Pode perguntar pra qualquer um aqui. Quem tem a oportunidade acaba indo morar em outro lugar.

Porra, meu pai tomou um tiro na cabeça em uma festa no Cruzeiro. Bala perdida. Ele não tinha nada a ver com a confusão. A bala entrou pela testa e ficou alojada na nuca dele. Os médicos não tinham como remover. Depois disso, a vida da minha família nunca mais foi a mesma. Meu pai passou a ter convulsões frequentes.

Tu já viu uma pessoa sofrendo um ataque epiléptico na tua frente? Ah, então não queira ver, negão.

É assustador.

Eu tinha 10 anos quando meu pai foi baleado. Cresci convivendo com as crises dele. O Mirinho nunca mais conseguiu trabalhar. A responsabilidade de sustentar a casa caiu toda nas costas da minha mãe. E o que ela fez? Se virou. Contou com a ajuda dos vizinhos. A família representou. Aqui todo mundo vive com pouco. Ninguém tem nada sobrando. E mesmo assim, minha mãe não ficou sozinha. Sempre tinha alguém dando uma força pra ela.

Um vizinho apareceu com uma caixa grande de ovos, certo dia, e falou: “Rosilda, vende para levantar um trocado. Assim você consegue comprar um lanche para o Adriano”. Só que ela não tinha dinheiro para pagar o vizinho. “Não se preocupa, irmã. Vende os ovos e depois você me paga.” Era assim, cara. Te juro.

Outro vizinho arrumou um bujão de gás pra ela. “Rosilda, vende esse aqui. Metade é seu, metade é meu.” E lá ia a minha mãe tentar descolar mais um trocado trabalhando duro todo dia. Meu pai ficava em casa. E minha mãe correndo por dois, enquanto minha avó me levava para os treinos.

Uma das minhas tias conseguiu um trampo fichada e que dava tíquete-refeição. Ela entregava os papeizinhos para a minha mãe. “Rosilda, é pouco, mas dá para pelo menos comprar um biscoito pro Adriano.”

Sem essas pessoas eu não seria nada.

Nada.

Porra, essa falação me deu uma sede danada. Bora encostar ali na birosca do meu amigo Hermes. Isso, atrás da quadra. É! Ali no beco.

Minha avó morava aqui. Dona Vanda, que figura. Já te falei né? “Adi-ra-no, meu filho! Vem comer pipoca.” Vovó não consegue falar meu nome direito até hoje.

Eu ficava na casa dela todos os dias quando era criança. Minha mãe, meu pai e eu morávamos na Rua 9, que fica em cima do morro. Tu quer ir lá ver? Complicado. Tem muita atividade acontecendo. Melhor a gente ficar aqui embaixo mesmo. A favela tem certas regras que a gente precisa respeitar.

Quando eu era criança, minha mãe descia para trabalhar e me deixava com a vovó. Ela me levava pra escola e depois para o Flamengo. Minha correria começou cedo, não tem como negar.

Hermes, meu cumpade! Puxa aí o dominó pra gente. Cuidado, ele rouba pra caramba. Não cai pra grupo, não. O Hermes é malandro. Senta aqui, Jorginho. Gabão de sena sai.

A gente tomava banho num poço que tem ali no final do beco. Piscina na favela é assim, cara. Tu não sabia, não? Porra, se faz calor na zona sul, onde moram as pessoas que tem mais condição aqui no Rio, imagina na comunidade da zona norte… A molecada puxa o balde e se refresca como dá. Vou te falar que até hoje eu prefiro isso, sabia? Eu só entro na piscina, no mar, essas coisas, pra tirar onda mesmo. Mas fico feliz de verdade tomando uma chuveirada na laje, ou quando viro um balde d’água na cabeça.

Tu tá vendo o movimento de gente por aqui? E o barulho? Porra, a favela é muito diferente. A gente abre a porta de casa e já encontra a vizinha. Coloca o pé pra fora e tem o dono da vendinha na rua, a tia do pastel com uma sacola na mão, o primo do barbeiro chamando pra jogar futebol. Todo mundo se conhece. Claro, uma casa colada na outra, não é mesmo?

Isso foi uma das coisas que eu mais estranhei quando mudei para a Europa. As ruas são silenciosas. As pessoas não se cumprimentam. Cada um na sua. O primeiro Natal que eu passei em Milão foi pesado pra mim, cara.

O fim de ano é uma época muito importante lá em casa. Junta todo mundo. Sempre foi assim. A Rua 9 ficava lotada porque o Mirinho era o cara, né? A tradição começava ali. Na virada do ano também, era a favela reunida na porta da minha casa.

Quando fui para a Inter senti um baque muito forte no primeiro inverno. Chegou o Natal e eu fiquei no meu apartamento sozinho. Um frio do cacete em Milão. Aquela depressão que bate nos meses gelados no norte da Itália. Todo mundo de roupa escura. As ruas desertas. Os dias são muito curtos. O tempo é molhado. Não dá vontade de fazer nada, cara. Juntou tudo isso com a saudade de casa e eu fiquei mal pra caramba.

O Seedorf ainda foi parceiro demais. Ele e a esposa fizeram uma ceia para os mais chegados e me convidaram. Pô, o negrão tem um baita nível. Imagina a recepção de Natal na casa dele. Uma elegância que só vendo. Estava tudo muito bonito e gostoso, mas a verdade é que eu queria estar no Rio de Janeiro.

Nem fiquei muito com eles. Pedi desculpas, me despedi rápido e voltei para o meu apartamento. Liguei em casa. “Oi, mãe. Feliz Natal”, eu disse. “Meu filho! Que saudade. Feliz Natal. Está todo mundo aqui, só falta você”, ela respondeu.

Dava pra ouvir as risadas de fundo. O som alto com o batidão que as minhas tias colocam pra lembrar do tempo que elas eram garotas. O quê? Aquelas lá dançam como se estivessem no baile até hoje. Minha mãe também é a mesma coisa. Eu via a cena na minha frente só de escutar o barulho pelo telefone. Porra, comecei a chorar na hora.

“Tá tudo bem, meu filho?”, minha mãe perguntou. “Está, sim. Eu acabei de voltar da casa de um amigo”, contei. “Ah, então você já jantou? Aqui a mamãe ainda está arrumando a mesa”, ela falou, “vai ter até pastel hoje”. Porra, aí era golpe baixo. O pastel da vovó é o melhor do mundo. Chorei mermo. À pampa.

Eu estava mal. Peguei uma garrafa de vodka. Sem exagero. Tomei aquela porra inteira sozinho. Enchi o cu de vodka. Chorei a noite toda. Apaguei no sofá de tanto que eu bebi e chorei. Mas era isso, né, cara. O que eu poderia fazer? Eu estava em Milão por um motivo. Era o que eu tinha sonhado a vida inteira. Deus tinha me dado a oportunidade de virar jogador de futebol na Europa. A vida da minha família melhorou muito graças ao meu suor e tudo que Ele fez por mim. E que eles também fizeram. Aquele era um preço pequeno até que eu tinha que pagar, comparado ao que estava acontecendo e que ainda iria acontecer. Eu tinha essa noção. Mas nem por isso deixei de ficar triste.

Bora subir na laje do Tota? Lá é o meu refúgio. Vou chamar as motos. A gente leva o nosso danone e eu mostro a vista do complexo todo. Anda, cara!

Deixa eu ligar o tutufi. Tutufi, porra. Tu não tá entendendo, não? Pra conectar o celular na caixa de som, merda. Ah, eu não sei falar essas palavras em inglês, não, poxa vida. Eu só estudei até a sétima série, caramba. Na favela a gente tem que colocar no volume alto, cara. Aqui só se ouve música assim.

Ali é a Grota, lá é a Chatuba, aqui é o Cruzeiro. É tudo a mesma coisa, na verdade. Uma colada na outra. Mas são comunidades diferentes do complexo da Penha. E aquela ali é a Igreja da Penha, bem no alto, abençoando todos nós. Isso, eu ando com a igreja pendurada no meu pescoço nesse medalhão aqui. Curtiu? Coloca então pra tirar onda. Estou te batizando na nossa comunidade. Que moral, hein?

Quando eu “fugi” da Inter e abandonei a Itália, eu vim me esconder aqui. Rodei o complexo inteiro por três dias. Ninguém me encontrou. Não tem como. Lei número um da favela. Bico calado. Tu acha que alguém iria me xisnovar? A imprensa italiana ficou maluca. A polícia do Rio fez até operação para me “resgatar”. Falaram que eu tinha sido sequestrado. Tá de sacanagem, né? Imagina que alguém vai fazer mal pra mim aqui, logo eu que sou cria da favela. Nego me recriminou pra caramba.

Querendo ou não, era a independência que eu precisava. Não aguentava mais sair na Itália e ter que ficar olhando pra um lado e pro outro pra saber onde estavam as câmeras, quem se aproximava, se era repórter, pilantra, golpista ou a puta que o pariu.

Na minha comunidade não tem isso. Quando eu tô aqui, ninguém de fora sabe o que eu tô fazendo. Esse foi o problema deles. Não entendiam o porquê eu fui pra favela. Não foi por causa de bebida, nem de mulher, muito menos por droga. Foi por liberdade. Foi porque eu queria paz. Eu queria viver. Eu queria ser humano de novo. Só um cadinho. Porra, essa é verdade. E aí?

Tentei fazer o que eles queriam. Barganhei com o Roberto Mancini. Me esforcei com o José Mourinho. Chorei no ombro do Moratti. Mas não consegui fazer o que eles pediam. Eu ficava algumas semanas bem, evitava o danone, treinava feito um cavalo, mas sempre rolava uma recaída. E todo mundo me detonava. Eu não aguentava mais.

Nego falou merda pra caralho porque é tudo constrangido. “Pô, o Adriano parou de ganhar sete milhões de euros. Ele largou tudo por causa dessa merda?”, foi o que eu mais ouvi. Mas nego não sabe porque eu fiz isso. Porque eu não estava bem. Eu precisava do meu espaço, fazer o que eu quisesse fazer.

Tu tá vendo agora. Tem algo demais acontecendo no nosso rolé? Não. Desculpa decepcionar quem quer que seja. Mas a única coisa que eu busco na Vila Cruzeiro é sossego. Aqui eu ando descalço e sem camisa, só de bermudão. Jogo dominó, sento no meio-fio, lembro minhas histórias da infância, ouço música, danço com os meus amigos, durmo no chão. Vejo o meu pai em cada uma dessas vielas.

O que mais eu vou querer?

Nem mulher eu trago pra cá. Muito menos mexo com as garotas que são da comunidade. Porque eu só quero ficar tranquilo e lembrar da minha essência.

Nada além disso.

Eu faço o que eu quero.

Quer vir, vem.

É por isso que eu volto sempre.

Aqui sou respeitado de verdade.

Aqui está a minha história.

Aqui eu aprendi o que é comunidade.

A Vila Cruzeiro não é o melhor lugar do mundo.

A Vila Cruzeiro é o meu lugar.

Via CNN

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