quinta-feira, setembro 19, 2024
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A ‘Vaza Toga’ e o espelho venezuelano — Andre Marsiglia

Por Andre Marsiglia

Faz uns bons anos que, com angústia e insistência, venho denunciando as mazelas do Judiciário brasileiro. Aos poucos, fomos nos tornando aquilo que mais tememos e nos propusemos a combater: um país autoritário e permeado por censura e abusos por toda parte.

No entanto, nada do que eu disse ou disser será tão potente quanto o exemplo proporcionado pela Venezuela de Nicolás Maduro. Uma ditadura escancarada que tem nos constrangido pela semelhança de condutas e posturas. Lá como cá, nos dizem que as redes sociais são um perigo por serem habitadas por fascismo e ódio, dois conceitos subjetivos o bastante para poderem significar qualquer coisa, inclusive, perseguição a opositores.

Lá como cá, as eleições são tratadas como um tema sagrado, que não se discute, não se questiona. Na semana passada, uma ministra da Suprema Corte venezuelana afirmou que as decisões dela sobre as eleições seriam inapeláveis, soberanas, impositivas.

Lá como cá, Elon Musk se tornou um inimigo do Estado, com a diferença de que na Venezuela ele está sendo chamado por Maduro para brigar de tapa na rua. Aqui ele está sendo investigado nos inquéritos eternos do Supremo Tribunal Federal (STF). Somos mais sutis, mais elegantes, mais cordiais, mas não menos lamentáveis.

A “Vaza Toga” e mais do exemplo da Venezuela

A oposição na Venezuela, no entanto, afirma que o candidato Edmundo González venceu com 67% dos votos — contra 30% de Maduro | Foto: Reprodução/Twitter/X
A oposição na Venezuela, no entanto, afirma que o candidato Edmundo González venceu com 67% dos votos — contra 30% de Maduro | Foto: Reprodução/Twitter/X

Lá como cá, escândalos do Judiciário, como a recentíssima “Vaza Toga”, denunciada nesta semana pelo jornal Folha de S.Paulo sobre o gabinete do ministro Moraes direcionar investigações à la carte contra a direita e críticos do STF, são revelados ao povo e escondidos pelo poder.

[Maduro expõe] nossa muito feia democracia”

Andre Marsiglia

Caetano Veloso, em sua famosa canção “Sampa”, diz que Narciso acha feio o que não é espelho. Um verso ingênuo, que pressupõe que todo narcisismo é dedicado ao belo. No Brasil, os narcísicos do poder se regozijam das coisas ruins. Aqui, Narciso acha feio justamente o espelho, que expõe diante de sua face o abuso.

Maduro nunca fez nada pelo Brasil, nem fará. Mas tem servido de forma mais eficiente do que eu ou qualquer crítico dos abusos de nossas Cortes, pois se comporta com seus desmandos como um desconfortável e incômodo espelho, expondo nossa muito feia democracia, cada dia mais próxima de um dos regimes mais nefastos da América Latina.


Andre Marsiglia é advogado constitucionalista especialista em liberdade de expressão. Professor de Direito Constitucional e doutorando pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Especialista do Instituto Millenium

Via Revista Oeste

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